Título: Embaraço republicano
Autor: Luna, Thais de
Fonte: Correio Braziliense, 25/10/2012, Mundo, p. 25

Declarações de correligionários sobre aborto e estupro complicam a campanha de Mitt Romney

Dois temas que dividem a opinião pública dos Estados Unidos, aborto e estupro, voltaram a ocupar espaço nobre nas discussões a duas semanas de uma eleição que se apresenta como disputa voto a voto entre o presidente Barack Obama e o desafiante republicano, Mitt Romney. Desta vez, o estopim foi uma declaração do candidato republicano ao Senado pelo estado de Indiana, Richard Mourdock: segundo ele, uma gravidez resultante de violência sexual seria resultado da “vontade de Deus”. Mourdock fez a afirmação na noite de terça-feira, durante debate com o adversário democrata, ao ser questionado sobre eventuais condições nas quais o aborto poderia ser legal. “A vida é um presente de Deus. Acho que, mesmo quando a vida se inicia em uma situação tão horrível como o estupro, é algo que Deus quis que acontecesse”, afirmou o republicano.

Romney viu-se obrigado a abordar uma questão que o coloca no dilema entre tranquilizar o eleitorado centrista, fundamental para suas pretensões, e desagradar a base republicana mais conservadora. “Ele discorda dos comentários de Richard Mourdock, que não refletem sua visão”, assinalou Andrea Saul, porta-voz do candidato presidencial. Obama, por meio da porta-voz Jennifer Psaki, aproveitou para retratar novamente o partido adversário como extremista ao tratar do direito feminino. “O presidente acredita que essas declarações são chocantes e insultantes para as mulheres. Isso nos lembra que um Congresso republicano que trabalhe com um presidente republicano vai considerar que as mulheres não podem tomar as próprias decisões sobre sua saúde”, ressaltou a porta-voz.

Essa foi a segunda vez que um republicano faz comentários polêmicos sobre aborto e embaraça Romney. Em agosto, o deputado Todd Akin, candidato ao Senado pelo Missouri, afirmou que uma gravidez resultante de estupro seria um fato “muito raro”, porque “o corpo da mulher tenta por todos os meios bloquear isso”.

Especialistas divergem quanto ao impacto eleitoral de declarações desse tipo. A cientista política Janine Parry, da Universidade de Arkansas, considera que a polêmica não ajuda Romney a conquistar o eleitorado feminino, segmento no qual vinha tendo relativo sucesso no esforço de reduzir a desvantagem para Obama. Por sua vez, Michael Munger, diretor do programa de política e economia da Universidade Duke, na Carolina do Norte, pondera que comentários como esses são bastante comuns e lembra que quem discorda dessas ideias não vota nos republicanos. “O ponto a considerar é que essa resposta do candidato a senador, de que a gravidez é ‘vontade de Deus’, é apenas uma resposta boba pela frustração de sempre ouvir a mesma pergunta”, analisou.

Maratona

Obama começou ontem uma turnê na qual percorrerá oito estados em 40 horas, no esforço de consolidar uma posição até aqui favorável na composição do Colégio Eleitoral que escolhe o presidente. De manhã, o presidente fez comício em Davenport (Iowa), onde voltou a acusar o adversário de sofrer de “Romnésia” e comentou as novas propostas para melhorar a economia do país, apresentadas na véspera. Obama seguiu de Iowa para o Colorado e, de lá, iria para Nevada. Hoje, a programação prevê passagens pela Flórida, pela Virgínia e por Ohio — os três mais importantes entre os chamados “swing states”.

Romney, também em sua arrancada final, fez comício de manhã em Nevada, deslocou-se para Iowa e retornou a Nevada. No primeiro discurso, o republicano falou da crise econômica e de questões militares. O candidato disse estar confiante de que Nevada vai ajudá-lo a chegar à Casa Branca. Hoje, a agenda de Romney se concentra nas cidades de Cincinnati, Worthington e Defiance — todas em Ohio.

Quanto valem os documentos?

A promessa de uma “revelação bombástica”, um “grande anúncio” relacionado a algum escândalo envolvendo Barack Obama, acabou rendendo uma avalanche de piadas e críticas, na internet, ao multimilionário Donald Trump. Notório entusiasta da oposição republicana e da candidatura de Mitt Romney, ele insinuara mais cedo que teria “documentos” capazes de abalar a campanha do democrata à reeleição, e anunciou que faria a publicação em sua conta no microblog Twitter. Por fim, Trump apenas retomou o antigo questionamento ao local de nascimento do presidente — oficialmente, o Havaí, embora adversários especulem que a certidão seria falsificada. O magnata desafiou Obama a divulgar, até o próximo dia 31, seu histórico escolar, seus diplomas e o formulário de pedido de passaporte. Em troca, Trump prometeu doar US$ 5 milhões “à instituição de caridade que ele escolher”. E aproveitou para reforçar o questionamento à condição de americano nato, exigida para ocupar a Casa Branca: “Se Obama apresentar esses documentos, acabará com as perguntas e com a raiva de muitos americanos”.