O Estado de São Paulo, n. 46014, 11/10/2019. Economia, p. B1

 

'Maratona' de leilões de petróleo começa com ágio de 322% e R$ 9 bi para a União

Fernanda Nunes

Denise Luna

11/10/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Concessões. Estrangeiros dominam disputa e Petrobrás vence em apenas um bloco em sociedade com BP; apenas em royalties, licitação vai gerar R$ 100 bilhões aos cofres dos governos, principalmente estaduais, mas dinheiro só deve entrar no caixa em 5 a 7 ano

As petroleiras multinacionais dominaram o leilão de petróleo e gás realizado ontem pelo governo. Ao todo, a União arrecadou R$ 8,915 bilhões, com ágio de 322,74%, na 16.ª Rodada de Licitações. Mesmo com a oferta apenas de blocos fora da cobiçada área do pré-sal, empresas do porte da Chevron, ExxonMobil, Total e Shell tiveram participação agressiva, tanto no valor dos lances como no número de blocos arrematados.

O Brasil foi representado exclusivamente pela Petrobrás, que, ao contrário de outras licitações, teve uma postura tímida. Disputou somente dois blocos e levou um. Partiu da estreante Petronas, da Malásia, o maior bônus pago por uma empresa, de R$ 1,94 bilhão. O ágio de 322,74% foi um recorde em leilões de pós-sal, mesmo tendo sido vendidas apenas um terço das áreas ofertadas.

O maior lance por uma área foi dado pelo consórcio liderado pela empresa francesa Total, de R$ 4,029 bilhões, que tirou a estatal brasileira do páreo, na disputa por uma região da Bacia de Campos.

“O bônus total superou todas as nossas expectativas. Os recursos irão para o Tesouro Nacional e serão aplicados dentro da política pública, inclusive no setor de meio ambiente”, afirmou o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. Nesse modelo de licitação, sai vencedor quem apresentar o maior bônus, uma taxa paga pelas companhias na assinatura dos contratos de concessão, o que acontece tradicionalmente no fim do ano.

O diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), Décio Oddone, contou que chegou a pensar em desistir da 16.ª Rodada, temendo que fosse um fracasso frente aos dois leilões que vêm pela frente, de áreas do pré-sal. “Mas mantê-la se mostrou acertado”, disse.

Apenas em royalties e participação especial, que incide sobre os campos de grande dimensão, a licitação vai gerar cerca de R$ 100 bilhões aos cofres dos governos, principalmente, do Estado do Rio de Janeiro e municípios do Norte Fluminense.

Esse dinheiro só vai entrar nos caixas no prazo de cinco a sete anos, quando vão começar a ser extraídos os primeiros óleos dessa leva de áreas arrematadas. Dos 11 blocos licitados na bacia de Santos, na região de São Paulo, apenas dois saíram, enquanto nenhum dos campos do Nordeste foi vendido.

Atração. O litoral fluminense continua a atrair investimento, ainda que muito dos seus campos estejam em fase de declínio. “A Total tem o prazer de ampliar sua presença na Bacia de Campos ao lado de dois parceiros estratégicos (Petronas, da Malásia, e QPI, do Quatar). Isso se encaixa em nossa estratégia de desenvolver a operação em águas profundas no Brasil”, disse o presidente da petroleira francesa, Patrick Pouyanné, acrescentando que a empresa vai participar do megaleilão do pré-sal marcado para o dia 6 de novembro.

A anglo-holandesa Shell disse que as atividades de exploração e desenvolvimento no Brasil têm se mostrado promissoras. E a norte-americana Chevron disse que o pré-sal e o póssal no País “são dois recursos de classe mundial”. A empresa se destacou por ter levado o maior número de áreas no leilão, cinco das 36 ofertadas, todas em parceria. Mas ficou em sétima posição num ranking das que pagaram os bônus mais altos, num total de 10 companhias vencedoras. A soma dos lances da petroleira norte-americana foi de R$ 480 milhões.

O destaque em desembolso foi da Petronas, que chegou a levar duas áreas sozinha. “A entrada de novos atores, como a Petronas, demonstra que o ambiente no Brasil está atrativo”, avaliou Antônio Guimarães, secretário executivo de Petróleo e Gás do IBP, representante das grandes petroleiras.

Petrobrás A Petrobrás apostou alto num único bloco na Bacia de Campos, R$ 1,43 bilhão. Junto com a sócia BP, apresentou oferta de R$ 2,045 bilhões pela área. “Os blocos exploratórios desta região da Bacia de Campos têm sido objeto de interesse e elevada disputa nas rodadas de licitação da ANP realizadas em 2017 e 2018”, informou a estatal em fato relevante.

“A Petrobrás tem capacidade limitada de investimento e já deixou claro que vai se reerguer no pré-sal”, disse o sócio da área de óleo e gás do escritório de advocacia Vieira Rezende, Carlos Maurício Ribeiro.

Cifras

R$ 4,029 bi

foi o maior lance dado entre as áreas ofertas dentro do leilão, em área que foi arrematada em consórcio liderado pela francesa Total

R$ 1,94 bi

foi o valor do maior bônus pago dentro do evento, pela estreante Petronas, da Malásia

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Área perto de Abrolhos fica sem oferta

Denise Luna

Fernanda Nunes

11/10/2019

 

 

A falta de oferta para os blocos que estavam sob o crivo da Justiça na 16.ª Rodada de Licitações de Concessões de Petróleo e Gás Natural (ANP) mostrou que as empresas não querem se arriscar a investir em áreas nas quais as licenças ambientais são uma incógnita. Ontem, após a Justiça colocar sub judice sete blocos nas bacias de CamamuAlmada e Jacuípe, próximas ao Parque Nacional Marinho de Abrolhos, no Sul da Bahia, todos ficaram sem ofertas.

“Enquanto a questão do risco ambiental não for resolvida, as empresas não vão apostar nas áreas mais sensíveis. Essa é uma mensagem que já foi captada”, afirmou Helder Queiroz, ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e professor do Instituto de Economia da UFRJ.

Mais do que preocupações ecológicas, a ameaça é para o bolso, dizem os especialistas. Para o advogado Julian Chediak, sócio do escritório Chediak Advogados e presidente da AmCham Rio, o volume de recursos envolvidos na compra de um bloco de petróleo é alto demais para o risco de não conseguir se levar o projeto adiante.

Segundo a ANP, hoje há cinco blocos com contratos suspensos na bacia Camamu-Almada por falta de licença ambiental. “É evidente que questionamentos, em especial de natureza ambiental, afastam potenciais interessados, já que ninguém comprometerá recursos sem a convicção de que poderá iniciar logo a exploração”, disse Chediak.

Para reduzir o risco do negócio e atrair compradores, o secretário executivo de Exploração e Produção do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), Antonio Guimarães, disse que um estudo prévio das áreas mais sensíveis feita pelo governo daria maior segurança ao investidor. “O governo poderia fazer algum tipo de análise pré-licenciamento. O grande problema é que o investidor não sabe o que vai ser pedido para obter a licença depois. É mais trabalhoso para o poder público, mas quem compra vai saber o que está levando”, afirma.

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Maratona de leilões de petróleo: os maiores volumes do mundo

David Zylbersztajn

Fernanda Delgado

11/10/2019

 

 

Todas as atenções do mercado nacional e internacional de petróleo estão voltadas para o Brasil a partir dessa semana com a reabertura da temporada de leilões de áreas de exploração, incluído o tão esperado megacertame dos excedentes da cessão onerosa. São três leilões em sequência até novembro: uma rodada de licitações sob o regime de concessão e outras duas do pré-sal. O leilão sob o regime de concessões, 16.ª rodada de licitações, recém-ocorrido nesta última quinta-feira, foi um sucesso em termos de arrecadação (R$ 8,9 bilhões), apesar de um número de blocos arrematados (12) aquém do esperado em relação aos blocos ofertados (36).

As rodadas de pré-sal, por sua vez, são feitas pelo regime de partilha, onde o valor de arrecadação inicial é fixado pela União. Vence a disputa a empresa ou consórcio que oferecer o maior porcentual de petróleo a ser repassado para a União. Os leilões de partilha, incluindo o de cessão onerosa, planejado para o dia seis de novembro, oferecem potenciais de áreas com mais petróleo do que todas as reservas comprovadas no México ou da Angola, o que atraiu o interesse de alguns dos maiores produtores do mundo. O leilão será o maior já realizado no setor em volume de óleo e valores de bônus de assinatura. Se todas as áreas forem arrematadas, a arrecadação chegará a R$ 106,6 bilhões. Muitos ativos sendo ofertados, com diferentes potenciais, regimes e valores de bônus, possibilitam um leque grande de oportunidades para empresas de vários perfis.

O sucesso das próximas rodadas sinalizará para a economia o reaquecimento do setor petrolífero, através de empregos, encomendas de equipamentos e serviços, arrecadação governamental futura com royalties e participações especiais, além de todos os impostos concernentes. Ou seja, aquecimento econômico e espraiamento do otimismo (mesmo que cauteloso ainda) nas operações do setor nos Estados produtores e não produtores, também beneficiados pela repartição das chamadas participações governamentais.

Essa apelidada “maratona de leilões”, capitaneada pela ANP e MME, juntamente com os estímulos à maior abertura do mercado de gás natural e a política de desinvestimentos da Petrobrás, dão continuidade ao processo de abertura do setor, iniciado no final dos anos 1990, voltado ao incremento da produção e das reservas nacionais de petróleo.