Correio braziliense, n. 20502, 09/07/2019. Política, p. 2

 

Governo aposta na aprovação ainda hoje

Hamilton Ferrari

Bernardo Bittar

Rodolfo Costa

09/07/2019

 

 

Poder » Plano é votar o texto principal da reforma da Previdência no plenário da Câmara e deixar os destaques para amanhã. O segundo turno, segundo os mais otimistas, começaria ainda nesta semana. Segundo o Planalto, há número suficiente de votos

A reforma da Previdência começará a ser votada no plenário da Câmara, segundo cronograma apresentado por integrantes do governo federal. Os líderes trabalham para que a votação do texto-base seja concluída ainda hoje, mas ainda buscam consenso para que os partidos apoiadores não apresentem destaques no texto, que deverão ser votados amanhã na Casa Legislativa. O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse que já há o número suficiente de parlamentares para aprovar as mudanças na legislação.

São necessários, pelo menos, 308 votos favoráveis, em dois turnos. O governo quer cessar a discussão na Câmara até sexta-feira, para que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) vá para o Senado antes do recesso parlamentar, que se inicia no próximo dia 18. “Vai ser uma vitória extraordinária para o nosso país, que vai poder se apresentar para o mundo, se Deus quiser, com a PEC votada no primeiro turno”, afirmou o ministro da Casa Civil.

Ontem, durante a tarde, Onyx Lorenzoni, o ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, e líderes partidários se reuniram com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), para discutir as últimas tratativas em torno da reforma da Previdência. No entender dos líderes das legendas, o PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, é o principal gerador de impasse em torno da proposta. Há um receio dos partidos de que os deputados da sigla governista votem para amenizar as regras de aposentadoria para policiais federais e rodoviários.

Líder do PSL na Câmara, o deputado Delegado Waldir defendeu que o partido não joga contra a reforma e o governo, como se tem dito, e justificou que a sigla não apresentou destaques na comissão especial. Apesar disso, com grande número de parlamentares ligados à segurança pública, é possível que deputados governistas votem com proposições de outras siglas, como a que flexibiliza as regras para aposentadorias desstas categorias.

A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), disse, porém, que ainda não há um consenso. “Havia muita apreensão de que o PSL apresentasse algum destaque. Conversamos com o líder, com o presidente e com a bancada para que o partido do presidente não apresente nenhum destaque, justamente porque os outros partidos se sentirão descompromissados em relação à apresentação de proposições”, disse. “Até 9h (de hoje) haverá esse consenso”, acrescentou a líder. Para não correr riscos de derrota, Rodrigo Maia disse esperar uma presença de mais de 490 deputados, dos 513.

Hasselmann prevê que a reforma da Previdência deve ser aprovada em dois turnos na Câmara até esta quinta-feira ou, no mais tardar, na sexta-feira. A equipe da parlamentar calcula que há “um pouco mais de 340 votos” favoráveis à Proposta de Emenda da Constituição (PEC) nº 6, que trata sobre o tema. A oposição calcula que o número de votos do governo no plenário não passa de 260 apoiadores. Líder da minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ) diz que “os votos foram feitos na ponta do lápis e que o número divulgado pelos governistas está inflado”.

O líder do PP na Câmara, deputado Arthur Lira (AL), partido que apoia a reforma, entende que não há um monitoramento preciso do número de apoiadores, como havia no governo anterior. Lira enfatizou que os acertos em relação ao texto da proposta ainda estão pendentes. “Se os destaques aparecerem no plenário como apareceram na comissão especial, teremos dificuldades”, admitiu.

O deputado José Nelto (GO), líder do Podemos na Câmara, declarou que a avaliação é de cautela. “O governo tem que entrar em campo. Neste momento, há muitas dúvidas e questionamentos de votos, porque o parlamentar vota, e amanhã tem a pressão popular, principalmente na área de segurança pública, da PF, da PRF. Se começar a mexer muito na reforma, desidratar, aí não é reforma. Nós já deixamos de fora estados e municípios, e aí cada um terá sua responsabilidade”, declarou.

Para evitar a quebra de acordo na apresentação de destaques para a reforma da Previdência, Onyx e Hasselmann disseram que, após uma releitura jurídica do relatório do deputado tucano Samuel Moreira (SP), foi verificado que os policiais já foram contemplados com o pleito da categoria, que buscava ter integralidade nas aposentadorias aos que ingressassem nas corporações até 2013.

De acordo com Hasselmann, o artigo nº 5 do texto remete à Lei Complementar nº 51, de 1985, o que mais do que atende os objetivos das categorias. “Na verdade, o que aconteceu foi que com esse estudo profundo houve um entendimento jurídica que a integralidade ficará até a promulgação da PEC. E eles estavam pedindo que fosse até 2013. Então, foi além do pedido. Então o texto atende mais do que foi pedido”, alegou.

“O presidente gostaria de ratificar o trabalho que atribui aos órgãos de segurança pública e entende as suas peculiaridades. Mas ele, também, entende que o Congresso tem, neste momento, condão para decidir o que é melhor para a Casa para que a Nova Previdência seja o mais rápido possível aprovada”, destacou o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros. “O senhor presidente considera que o Congresso tem plena capacidade de avaliar a possibilidade de mudanças.”

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Corrida contra o recesso

Luiz Carlos Azedo

09/07/2019

 

 

Tem razão o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ): a aprovação da reforma da Previdência será uma construção do Congresso. Aprovada pela comissão especial, a proposta de iniciativa do ministro da Economia, Paulo Guedes, foi mitigada pelos parlamentares, para formar uma maioria que vai garantir um montante de economia para os cofres do governo em torno dos R$ 900 bilhões. Em alguns momentos, porém, o governo atrapalhou mais do que ajudou, como na semana passada, quando o presidente Jair Bolsonaro quis fazer duas emendas ao substitutivo do deputado Samuel Moreira (PDSDB-SP) para beneficiar setores de sua base eleitoral.

“Acho que a construção desse texto se deve à capacidade de diálogo, ao equilíbrio do Parlamento brasileiro. Todos participaram. Aqueles que defendem a proposta e aqueles que não defendem a proposta. Então, é importante que a gente entre nesta semana com essa clareza, que a construção do texto foi uma construção parlamentar”, disse Maia, a propósito das discussões realizadas até agora. O presidente da Câmara fez várias reuniões para tentar garantir a aprovação da reforma em primeira votação ainda nesta semana, concluindo-a na próxima, se não conseguir votar tudo até sexta-feira. É uma corrida contra o tempo, ou melhor, contra o recesso parlamentar. Não aprovar a reforma sinalizaria dificuldades políticas que podem até aumentar no segundo semestre.

Maia estima que a proposta da comissão especial tenha maioria em plenário. Para aprovar uma emenda à Constituição, são necessários os votos de 308 dos 513 deputados (3/5 da Câmara) em dois turnos de votação. As turbulências são previsíveis, a oposição espera ter até 150 votos contra a reforma e fará tudo para obstruir a votação; Bolsonaro provavelmente orientará aliados para aprovar as emendas que favorecem o pessoal da segurança pública, cujos representantes eleitos hoje têm certo protagonismo na Câmara, a começar pelo líder do governo, deputado major Vitor Hugo. Mas isso é pedra cantada, porque se formou um certo alinhamento de astros entre o mercado financeiro e parte da opinião pública a favor da reforma, que pode resultar em 340 votos em plenário a favor do projeto.

Ao que tudo indica, o governo jogou a toalha quanto à inclusão de estados e municípios na nova Previdência, proposta rejeitada pelo relator e pela comissão especial. A líder do governo no Congresso Nacional, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), passou recibo. Segundo ela, “não é grande” a chance de inclusão de servidores estaduais e municipais na reforma da Previdência durante discussão e votação no plenário da Câmara. A estratégia do governo é voltar à carga no Senado, supostamente mais suscetível a aceitar a emenda, porque os senadores, eleitos pelo voto majoritário, tem preocupações eleitorais diferentes dos deputados federais, que temem a concorrência de deputados estaduais e prefeitos nas suas bases eleitorais em 2022. Hasselmann trava uma batalha particular na bancada do PSL, que é muito corporativista, para que não sejam apresentadas emendas ao texto.

Popularidade

Pesquisa DataFolha divulgada ontem ajuda a entender a vaia dos torcedores ao presidente Jair Bolsonaro no domingo, durante a final da Copa América, em pleno Maracanã, mesmo acompanhado do ministro da Justiça, Sérgio Moro. Alguém já disse que a torcida no Maracanã vaia até minuto de silêncio, mas isso é apenas uma forma de contemporização. A avaliação do governo Bolsonaro (PSL) não mudou muito de abril para junho: ótimo/bom: 33%; regular: 31%; ruim/péssimo: 33%; Não sabe/não respondeu: 2%. Na margem de erro, a variação registrou alta de 1% na avaliação positiva, mas subiu 3% na negativa: Em abril, quando foi realizada a pesquisa anterior, os índices foram: Ótimo/bom: 32%; Regular: 33%; Ruim/péssimo: 30%; Não sabe/não respondeu: 4%.Após seis meses de mandato, a expectativa de sucesso do governo variou negativamente: 51% esperam que Bolsonaro faça um governo ótimo ou bom; 21%, regular; e 24%, péssimo. Antes da posse, 65% esperavam que Bolsonaro fizesse um governo ótimo ou bom, contra 17% de regular e 12%, ruim ou péssimo. A pesquisa foi realizada nos dias 4 e 5 de julho com 2.086 entrevistados com mais de 16 anos, em 130 cidades do país. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou menos. O nível de confiança da pesquisa é de 95%.

Trocando em miúdos, a estratégia de radicalização política de Bolsonaro, ao estabelecer a Lava-Jato como divisor de águas da opinião pública em relação ao seu governo, estancou a queda de sua avaliação nas pesquisas. A Lava-Jato continua sendo uma linha de força da vida política nacional, bem como o antipetismo. Bolsonaro sabe disso e se instalou nessas duas trincheiras.

De certa forma, com isso, também evitou maiores desgastes com a reforma da Previdência, que foi assumida pelo Congresso. Todas as vezes que apoiou ostensivamente a reforma, o presidente da República criou uma polêmica com a oposição que deslocava o debate desse eixo. A vaia no Maracanã veio da parcela da sociedade que considera seu governo ruim e péssimo.