O Estado de São Paulo, n. 46014, 11/10/2019. Política, p. A8

 

Presidente vê Datena como opção em SP

Adriana Ferraz

Pedro Venceslau

Vinícius Passarelli

11/10/2019

 

 

Bolsonaro destaca popularidade do apresentador, que é filiado ao DEM e é visto como ‘outsider’, para a disputa da Prefeitura em 2020

 

Adriana Ferraz

Pedro Venceslau

Vinícius Passarelli

 

WERTHER SANTANA/ESTADÃO

Apresentador. Datena é cotado como candidato em SP pelo clã Bolsonaro; presidente diz que pretende conversar pessoalmente com ele

 

Apesar de admitir a importância das disputas municipais do ano que vem para o PSL, Bolsonaro afirmou ontem que não pretende participar intensamente do processo eleitoral. Na conversa com o Estado, ele disse que pediu a seus filhos que “mergulhem” na política e esqueçam eleição. Mas em relação à disputa para a Prefeitura de São Paulo, o presidente destacou a popularidade do apresentador José Luiz Datena. Filiado ao DEM, Datena é considerado uma alternativa pelo clã Bolsonaro. O presidente afirmou que pretende conversar pessoalmente com ele a respeito.

Bolsonaro não citou nem a deputada federal Joice Hasselmann nem o deputado estadual Gil Diniz – ambos já demonstraram interesse em disputar prévias pelo PSL.

Visto como um “outsider” da política com forte potencial eleitoral, Datena coleciona pré-candidaturas que acabaram não se concretizando. Em 2018, após se filiar ao DEM, o apresentador chegou a anunciar que seria candidato ao Senado. Ele também cogitou concorrer à prefeitura paulistana em 2016, quando se filiou ao PP com essa intenção.

Depois de assumir o comando do PSL em São Paulo, em maio, Eduardo Bolsonaro relatou no Twitter uma reunião que tivera com Datena para discutir uma possível candidatura. “Conversamos sobre eventual filiação ao PSL. Está tudo em aberto e torcemos para que uma pessoa reconhecida pela defesa da segurança pública venha e enaltecer os quadros do PSL-SP”, escreveu o filho “03” de Jair Bolsonaro.

As tratativas abertas por Datena com o PSL resultaram em um bate boca nas redes sociais entre os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e Alexandre Frota (SP), que foi expulso do partido e hoje está no PSDB.

Deputada federal mais votada do Brasil, com mais de um milhão de votos, Joice é líder do governo de Jair Bolsonaro no Congresso, mas poderá deixar o partido para se filiar ao DEM (mais informações nesta página), curiosamente a atual legenda de Datena. Em julho, em entrevista ao Estado, ela falou da possibilidade de “disputar” com o apresentador a indicação do PSL. Para ela, houve um “pré-namoro” entre o apresentador e a sigla, mas o passado partidário do apresentador seria um obstáculo. “É um cara legal, gosto dele, mas o Datena tem um histórico de 23 anos de PT. Como você vai lançar como nome da direita um cara que tem um histórico dentro do PT. Mesmo tendo passado pelo DEM não deu para depurar”, afirmou na ocasião.

O Estado não conseguiu contato ontem com Datena.

Na avaliação de Bolsonaro, no entanto, o PSL tem todas as chances de eleger um número grande de prefeitos se souber se organizar para isso. Recurso não será empecilho. Como partido mais votado nas eleições de 2018, o PSL terá, ano que vem, a maior fatia dos fundos públicos usados para financiar candidaturas – cerca de R$ 400 milhões.

 

2020

A um ano das eleições municipais, São Paulo, Rio e BH já têm pelo menos 26 possíveis candidatos.

 

PARA LEMBRAR

Filiações vão do PT ao DEM

O apresentador José Luiz Datena passou grande parte de sua vida partidária no PT, ao qual se filiou em 1992. Em 2015, ingressou no PP para uma possível candidatura à Prefeitura de São Paulo. Em 2017, o PRP anunciou a filiação do apresentador. Já em 2018, Datena entrou no DEM – a filiação tinha como objetivo uma possível candidatura para o Senado, o que acabou não ocorrendo.

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Brasil first?

Eliane Cantanhêde

11/10/2019

 

 

Donald Trump está para Jair Bolsonaro assim como Nicolás Sarkozy esteve para Lula e essas duas situações comprovam a máxima da política externa: amigos, amigos, negócios à parte. Na hora de prometer mundos e fundos, é fácil. Na hora de cumprir o prometido, a história é bem outra. O que vale para Trump é “America first”, assim como o que valia para Sarkozy era “La France avant tout”.

Lula se encantou com Sarkozy, caiu na lábia dele e por pouco não atrelou todo o arsenal brasileiro a uma única fonte: a França. Depois de fechar com os franceses o ambicioso Prosub, programa de submarinos da Marinha, inclusive o submarino de propulsão nuclear, Lula atuou o tempo todo para renovar a frota da FAB com jatos supersônicos do país.

Havia três concorrentes, o Rafale da francesa Dassault, o F-18 da norte-americana Boeing e o Gripen NG da sueca Saab. Depois de se encontrar três vezes com Sarkozy num único ano, coisa rara em relações bilaterais, Lula chegou a criar uma saia-justa ao anunciar a vitória do Rafale antes do fim do relatório técnico da FAB. O então ministro da Defesa, Nelson Jobim, fez um malabarismo para desmentir o presidente.

Concluído o relatório, com milhares de páginas, o Rafale ficou no terceiro e último lugar, atrás do F-18 e do Gripen, que acabou sendo finalmente escolhido – mas só no governo seguinte, de Dilma Rousseff, quando o namoro de Lula com Sarkozy já tinha terminado melancolicamente.

A obsessão de Lula teve dupla motivação: a empatia pessoal com Sarkozy e a crença de que uma tal “aliança estratégica” do Brasil com a França seria decisiva para combater o “mundo unipolar” – algo como “colocar os EUA no seu devido lugar”. A fantasia ruiu quando o Brasil e a Turquia operaram juntos o acordo do Irã, contra o armamento nuclear do país. Um dos pilares da estratégia era o voto da França no Conselho de Segurança, mas, na última hora, Sarkozy tirou o corpo fora, votou com Washington e deixou Brasil e Turquia a ver navios.

Há que se aprender com a história, principalmente quando se trata de dois lados da mesma moeda: a ideologia empurrava Lula para a França contra os EUA; a ideologia trocada de Bolsonaro joga o Brasil no colo dos EUA, contra a França. E onde fica o interesse do Brasil nesses dois casos?

Diplomatas de diferentes gerações estão perplexos com o excesso de reverência, até de encantamento, de Bolsonaro com Donald Trump, que já foi até comparado a Deus num agora famoso artigo do chanceler Ernesto Araújo. Trump passa, mais cedo ou mais tarde, mas os EUA ficam, o mundo fica e nunca se inventou nada melhor em política externa do que o velho e bom pragmatismo. Adotado, aliás, pelos excelentes diplomatas dos governos Geisel e Figueiredo, no fim da ditadura.

Ao receber Bolsonaro no Salão Oval da Casa Branca, em março, Trump disse vagamente que apoia a entrada do Brasil para a OCDE, mas não disse como nem quando. Saltitante, feliz da vida, o presidente brasileiro se precipitou e já saiu pagando a dívida antes de contraí-la. Aceitou, inclusive, abdicar da classificação de país em desenvolvimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), mesmo perdendo condições camaradas de tarifas. Foi temerário, como se vê agora.

Trump apoiou a Argentina (além da Romênia) para a OCDE, mantendo o apoio ao Brasil, mas só depois. Alegou que a Argentina pediu primeiro, sem considerar a grave situação social e econômica e a volta do peronismo.

Após Lula cair como um patinho na tal “aliança estratégica com a França”, Bolsonaro não pode cair no conto da “aliança estratégica com Trump”. Está na hora de parar, pensar e assumir o “Brasil first”.

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Bolsonaro e o PSL: convicção e conveniência

Murillo de Aragão