O Estado de São Paulo, n. 46015, 12/10/2019. Economia, p. B4

 

BNDES deve focar crédito à exportação a áreas estratégicas

Lorenna Rodrigues

12/10/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Avaliação do governo, segundo fontes, é que há espaço para que os bancos privados assumam os demais segmentos da economia

Entre abrir a caixa-preta e reduzir o tamanho do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o governo quer também redefinir o papel do banco no financiamento às exportações. Essencial para a venda de bens manufaturados, como máquinas e equipamentos, e de serviços ao exterior, esses empréstimos vêm sendo reduzidos nos últimos anos, o que tem levado industriais e exportadores a reclamarem das dificuldades de acessar os recursos.

A intenção do governo e do banco, segundo o Estadão/Broadcast apurou, é que o BNDES foque o apoio na produção de itens para a exportação em áreas consideradas estratégicas, como Defesa, inovação e alta tecnologia. A avaliação é que, como em outros setores da economia, há espaço para que os bancos privados assumam o financiamento de outros produtos e, com os recursos escassos, o banco deve se concentrar nas questões de interesse do governo.

O modelo que vem sendo estudado é o adotado em outros países, como os Estados Unidos, de um “Eximbank”, uma espécie de agência de fomentos e garantias para produtos de alto valor agregado ou desenvolvidos especificamente para mercados que o governo deseje acessar. Para a produção dos demais itens exportados, as empresas teriam de buscar financiamento privado, segundo as fontes.

Apesar das sinalizações do governo, os empresários reclamam da falta de definição de política clara de financiamento. “Estamos falando da produção de máquinas de alta tecnologia, de caminhões especiais. Quanto mais valor agregado, mais necessário o financiamento”, afirma o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. “Se não temos políticas de financiamento, não temos exportações de manufaturados. Vamos exportar só commodities.”

O encolhimento do financiamento público é visível em uma das linhas do BNDES para financiar bens e serviços para exportação, a chamada Exim Pré-Embarque. Se em 2016 o montante desembolsado em 302 operações chegou a R$ 8,4 bilhões, esse valor soma R$ 165 milhões até agosto deste ano, com apenas quatro operações contratadas.

Já a linha que financia a exportação de serviços de engenharia não tem nenhuma operação contratada desde 2015, logo após a Lava Jato atingir em cheio as construtoras brasileiras. “O BNDES praticamente abandonou a exportação. A atuação que ele teve no passado não existe mais e hoje o banco está voltado para o mercado interno”, afirma.

Processo. No setor de manufaturados, os empréstimos geralmente são feitos antes da produção. É o que acontece no caso de uma turbina, por exemplo: primeiro o industrial fecha o contrato de financiamento, depois o de venda do produto, que é entregue, e pago, em um prazo de dois anos ou mais. “Há uma forte competição dos produtos manufaturados brasileiros com países no mundo com instrumentos de exportação bem definidos. Não dá para fazer uma equação ou o setor privado ou o governo, é uma área onde os dois têm de trabalhar, senão o setor manufaturado não tem como concorrer com outros países”, afirmou a Gerente de Política Comercial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Constanza Negri.

Com o enxugamento dos empréstimos de bancos públicos, Constanza disse ter recebido relatos de empresários que tiveram de cancelar contratos porque não conseguiram fechar os empréstimos a tempo. Castro contou ter empresas que não estão conseguindo fabricar nem para vender para as próprias matrizes por falta de recursos.

Além de demora na liberação de recursos, as entidades apontam outras incertezas, como a falta de definição do orçamento do Proex Equalização, que subsidia linhas de financiamento à exportação. As contratações do programa são feitas em um ano com base no orçamento do próximo, quando os desembolsos efetivamente acontecem.

Em 2019, foram reservados R$ 2,2 bilhões. Para 2020, o orçamento tem R$ 800 milhões autorizados e outros R$ 800 milhões condicionados à aprovação de crédito extra pelo Congresso. Segundo a CNI, isso pode significar a interrupção das contratações enquanto o crédito não for aprovado. Outra preocupação é a inclusão da Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores (ABGF) na lista de privatizações, o que, segundo os industriais, aumenta a indefinição sobre as garantias às exportações.

Oficialmente, o BNDES afirmou que não houve mudança na política de financiamento às exportações. Segundo o banco, o custo da linha ficou “mais próximo” às taxas de mercado com a mudança na taxa cobrada.

- Crítica

“Se não temos políticas de financiamento, não temos exportações de manufaturados. Vamos exportar só commodities.”

José Augusto de Castro

PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BRASIL (AEB)

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Atrito entre diretoria e técnicos causa baixa no BNDES

Vinicius Neder

Aline Bronzati

12/10/2019

 

 

André Laloni, diretor de Participações, pediu licença por motivos pessoais após conflito sobre venda de ações

O diretor de Participações, Mercado de Capitais e Crédito Indireto do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), André Laloni, pediu licença do cargo ontem. Oficialmente, o BNDES informou que a licença foi pedida “por motivos pessoais”, mas a relação entre a diretoria do BNDES e técnicos da área responsável pela gestão da carteira de participações acionárias estava marcada por tensões e divergências em torno da melhor forma de acelerar as vendas de ações.

Laloni, que fez carreira no mercado financeiro e foi diretor financeiro da Caixa no primeiro semestre, foi indicado para a diretoria do BNDES em julho e assumiu os trabalhos no fim de agosto, com a missão de acelerar as vendas da carteira de participações societárias, uma das metas colocadas ainda para este ano pelo presidente Gustavo Montezano.

O presidente do banco foi comunicado do pedido de licença de Laloni na noite de quinta-feira, disseram fontes ouvidas pelo Estadão/Broadcast. Teria pesado na decisão do diretor uma suposta falta de apoio dos demais colegas de diretoria num embate em torno da mudança de normativos internos, materializado na tentativa do BNDES de aderir à oferta pública de ações do Banco do Brasil (BB) de posse do Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS), feita pela Caixa Econômica Federal.

Confirmada na quinta-feira da semana passada, a oferta deverá movimentar R$ 5,7 bilhões, incluindo a venda papéis em posse do próprio BB – a diretoria do BNDES queria incluir na operação cerca de R$ 1 bilhão em ações do BB de posse da União, que estão com o banco de fomento para serem vendidas.

A tensão se elevou com a destituição de Luciana Tito do cargo de superintendente responsável pelas atividades operacionais na área jurídica na quintafeira da semana passada, como revelou o Estado.

A AFBNDES, associação que representa os funcionários do banco, organizou um ato na segunda-feira, para cobrar publicamente explicações da diretoria. De lá para cá, a situação ficou insustentável. Segundo uma fonte que pediu para não se identificar, o resultado foi uma paralisia nas vendas das ações.

Tito foi destituída em meio à tentativa de aderir à oferta de ações do BB. Segundo um parecer jurídico interno, a tentativa de adesão à oferta foi decidida em cima da hora e sem seguir as normas do BNDES.

As tensões estão inseridas num contexto de divergências em torno da melhor forma de acelerar as vendas da carteira de participações, que passa pela opção entre fazer ofertas públicas, como a de ações do BB feita pela Caixa, ou usar a “mesa de operações”, como tradicionalmente faz a instituição de fomento – e pelo cumprimento dos normativos que balizam essas decisões.

Nos corredores do BNDES, circulam comentários sobre receios, entre os técnicos da área, de vender as ações baratas demais. Os técnicos do BNDES temem ser questionados pelos órgãos de controle, no futuro, sobre a fixação dos preços e sobre os procedimentos para aprovar as vendas.

Impasse

As tensões estão inseridas num contexto de divergências em torno da melhor forma de acelerar a venda da carteira de participações, que passa pela opção entre fazer ofertas públicas, como a de ações do BB feita pela Caixa, ou usar a mesa de operações