Correio braziliense, n. 20504, 11/07/2019. Política, p. 3

 

Regras suaves para policiais

Rodolfo Costa

Ingrid Soares

11/07/2019

 

 

A equipe econômica cedeu, e o governo chancelou o acordo costurado pela Câmara para conceder aposentadoria especial a policiais federais, rodoviários federais, legislativos e civis do DF. A articulação foi feita na madrugada de ontem pelo Podemos, com apoio de DEM, PSD, PSL, entre outros, dando fim a um dos principais impasses para a aprovação da reforma da Previdência no plenário da Casa. O compromisso de líderes é votar hoje favoravelmente a emenda aglutinativa apresentada ontem.

O acordo por meio da emenda prevê a integralidade da aposentadoria policial, ou seja, o último salário recebido. A categoria também terá direito à paridade, de modo que os benefícios serão corrigidos por reajustes iguais aos servidores da ativa. A idade mínima será de 53 anos para homens e 52 para as mulheres, além de pensão integral para a família dos policiais.

O principal obstáculo ao aval era a equipe econômica. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que capitaneia as interlocuções na Casa, deixou claro a líderes que só encamparia articulações por inclusão de categorias retiradas da reforma na Comissão Especial com o “sim” do ministro da Economia, Paulo Guedes. O titular da pasta chegou a fazer críticas ao substitutivo apresentado no colegiado em junho e gerou ruídos na relação com o Congresso.

Ciente do constrangimento causado, Guedes deixou o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, encarregado de dar a resposta final sobre alterações no texto, como modificações às regras de aposentadoria de mulheres e policiais. Com sinal verde do titular da pasta, Marinho deu o aval, ontem, ao líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO), por volta das 11h. O consentimento do articulador governista, o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, havia sido concedido ainda na terça.

Com isso, Nelto se reuniu com deputados oriundos das polícias, como Delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), para apresentar o acerto feito e pôr fim ao impasse. O Executivo foi representado pelo líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), que assinou o acordo. Outros deputados engajados na articulação também marcaram presença, como Luis Miranda (DEM-DF).

Pacificação

O presidente Jair Bolsonaro foi informado da articulação por Vitor Hugo e deu sinal verde para o encaminhamento das conversas. “Esse movimento em prol dos policiais está para ser analisado pela Casa, mas o presidente reforça que o mais importante é a aprovação da nova Previdência dentro de um contexto maior de apoio à sociedade para alavancar economicamente o país”, declarou, ontem, o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros. O governo se comprometeu a orientar a Advocacia-Geral da União (AGU) a apresentar um parecer concordando com a integralidade e a paridade.

A costura foi ampla e articulada com todas as bancadas que orientaram voto favorável à reforma da Previdência. Os contatos começaram ainda na madrugada, entre Nelto, o líder do Podemos no Senado, Alvaro Dias (PR), e outros deputados do partido: Aluísio Mendes (MA), José Medeiros (MT) e Léo Moraes (RO). “Depois que a sessão de terça-feira foi suspensa e adiada para hoje (ontem), ‘varamos’ a noite conversando com os líderes no WhatsApp. Fui dormir às 4h e acordei às 6h para retomar as conversas”, destacou Nelto. O acordo foi comemorado por Miranda. “Não é o que esperávamos, mas foi o possível após muita luta. Vale lembrar que o governo federal foi quem mandou a PEC, esquecendo da segurança pública, e coube ao Parlamento ajudar dentro do possível em plenário”, destacou.

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Vaias, aplausos e spray de pimenta

 

 

 

 

 

Luiz Calcagno

Bernardo Bittar

11/07/2019

 

 

 

O segundo dia de votação da reforma da Previdência, na Câmara, começou com cerca de duas horas de atraso e foi marcado por manifestações dentro e fora do plenário. A oposição, que levou faixas e camisas contra a proposta de emenda à Constituição, se mostrou, no correr do dia, cada vez mais ciente da dificuldade de barrar o texto, mas determinada a amenizá-lo, com a aprovação de destaques. Já os governistas, que no fim da tarde ostentavam bandeirinhas do Brasil, resumiram o discurso ao “nós contra eles” em grande parte das falas no plenário.

Ainda pela manhã, o líder do PSol, deputado Ivan Valente (SP), disse acreditar que, com o debate promovido pela votação dos destaques e emendas aglutinativas, seria possível mudar parte dos votos dos parlamentares. Com o passar das horas, porém, ficou claro que as sugestões de alteração no texto serviriam muito mais para reduzir o que a oposição chamou de crueldade contra os trabalhadores. “A estratégia da oposição será obstruir a pauta e, com essa obstrução, debater o texto. Mostrar ao povo que essa reforma não combate privilégio, esfola os pobres. Os R$ 850 bilhões do R$ 1 trilhão sairão do Regime Geral da Previdência de quem ganha de um a três salários mínimos”, afirmou Valente.

Na primeira parte do dia, os votos se concentraram nos requerimentos pela retirada da PEC da votação. Foram seis pedidos, todos derrubados pelos governistas. Os destaques só entraram na pauta à noite, dando a entender que o debate para a aprovação do texto está longe do fim.

Protestos

Vaias e aplausos eram comuns durante toda a sessão. As bandeiras do Brasil e os cartazes contra a reforma apareceram no fim da tarde, quando o clima estava mais quente, mas sob controle. Do lado de fora, também havia tensão. Cerca de 120 manifestantes, estimativa da Polícia Legislativa, em sua maioria professores, pediam a derrubada do texto. Quando a Polícia Militar chegou e quis que os presentes se afastassem da entrada do prédio, ocorreu um empurra-empurra. Os PMs usaram gás de pimenta para dispersar a multidão.

Um pouco depois, do lado de dentro, a bancada do PSol exibiu no plenário várias listas com centenas de assinaturas contra a PEC. Vice-líder da legenda, o deputado Marcelo Freixo (RJ) afirmou que parte dos nomes foi colhida dos manifestantes do lado de fora da Casa. “São inúmeros abaixo-assinados, colhidos por diversos trabalhadores, de diversas categorias, contra a reforma da Previdência. Categorias de trabalhadores que foram impedidas de entrar hoje (ontem) na Câmara. Isso aqui é chamado de Casa do Povo, quase como uma ironia”, criticou. “Os poucos professores que entraram foi porque ganharam uma ação com o ministro Toffoli (Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal). Porque, lá fora, estão ganhando gás de pimenta. É um retrocesso democrático muito grande.”