O globo, n.31362, 19/06/2019. País, p. 06

 

MPF elege lista, mas Bolsonaro não se compromete 

Aguirre Talento

Gustavo Maia 

19/06/2019

 

 

Na disputa mais concorrida da História para a Procuradoria-Geral da República, Mário Bonsaglia ficou em primeiro lugar; presidente tem até setembro para fazer indicação para o cargo, que não precisa seguir nomes

Na disputa mais concorrida da História para a troca de comando da Procuradoria-Geral da República (PGR), o subprocurador Mário Bonsaglia ficou em primeiro lugar na lista tríplice da categoria, com 478 votos. Na sequência estão os procuradores Luiza Frischeisen, com 423 votos, e Blal Dalloul, com 422.

O órgão é responsável por investigar políticos, inclusive o presidente da República, e acompanhar o cumprimento das leis. Ainda há dois outros candidatos correndo por fora da lista: a atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que tenta a recondução, e o subprocurador Augusto Aras.

Em evento na manhã de ontem, o presidente Jair Bolsonaro não se comprometeu a indicar um dos integrantes da lista tríplice.

— Todo mundo, todos que estão dentro, fora da lista, tudo é possível. Vou seguir a Constituição — disse ele, que tem até setembro para fazer a indicação.

TRADIÇÃO

A Constituição prevê que a nomeação para o cargo de PGR cabe ao presidente da República e depende de aprovação pelo Senado. Desde 2003, porém, todos os presidentes (Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer) têm respeitado a lista.

A eleição interna é promovida pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) desde 2001. A lista tríplice deve ser entregue ao presidente, junto com um pedido para que ele escolha um dos três nomes.

Mais votado desta vez, Bonsaglia esteve nas listas tríplices de 2015 e 2017, nas posições de segundo e de terceiro colocado, respectivamente. Com forte apoio em São Paulo, seu estado de origem, Bonsaglia está no Ministério Público Federal (MPF) desde 1991 e tem longa experiência na área criminal, além de ter passado por diversos postos dentro da instituição, como procurador regional eleitoral, membro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e integrante do Conselho Superior do MPF.

Em sua plataforma de campanha, Bonsaglia afirmou que vai dar apoio à Lava-Jato. “As diversas forçastarefas da Lava-Jato terão o apoio necessário, assim como outras operações de grande relevo, a exemplo da Greenfield, da Zelotes e outras mais que poderiam ser também citadas”, afirmou no documento, divulgado durante a disputa para a lista tríplice.

Já a subprocuradora Luiza, a segunda da lista, citou como suas prioridades, em sua plataforma de campanha, a reafirmação do papel do MPF na defesa de políticas públicas estabelecidas pela Constituição e pela legislação, incluindo a defesa de grupos vulneráveis e do meio ambiente. Ela prometeu ainda estruturar a área eleitoral do Ministério Público Federal, que agora concentrará, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), boa parte das investigações derivadas da Lava-Jato.

—A lista é uma certeza da nossa independência. É um processo que envolveu mais de 80% dos colegas e é muito importante para nós. A lista representa a vontade do Ministério Público — afirmou Luiza ao GLOBO após a divulgação do resultado.

O procurador regional Blal, terceiro mais votado, disse ao GLOBO, no mês passado, que sua principal missão no cargo seria unir o Ministério Público Federal. Na ocasião, ele disse que pretende priorizar ações que resultem na estruturação da instituição, e na valorização da carreira.

Dez procuradores regionais e subprocuradores-gerais da República buscaram os votos dos colegas. Entres os subprocuradores-gerais que se candidataram, além de Bonsaglia e Luiza, estão Nívio de Freitas Silva Filho, Paulo Eduardo Bueno, Carlos Fonseca e José Bonifácio de Andrada e Silva.

Ao lado de Blal, entraram na disputa também os procuradores regionais Vladimir Aras, Lauro Cardoso e Robalinho Cavalcanti. Há ainda candidatos avulsos, como Dodge e o subprocurador Augusto Aras. Ele se apresenta como interessado no cargo, mas preferiu não participar das eleições internas.

Mário Bonsaglia, o mais votado

O subprocurador representa atualmente a Procuradoria-Geral da República (PGR) em julgamentos criminais de habeas corpus nas Quinta e Sexta Turmas do Superior Tribunal de Justiça. Em sua plataforma de candidatura à PGR, afirmou que vai dar apoio à Lava-Jato e defendeu o combate a práticas criminosas que trazem danos aos cofres públicos.
Luiza Frischeisen, a segunda da lista
A subprocuradora coordena a 2ª Câmara Criminal da PGR, na qual supervisiona investigações da primeira instância. Liderou a elaboração de uma orientação do Ministério Público Federal (MPF) para a celebração dos acordos de colaboração premiada, um dos principais instrumentos da Lava-Jato. Comandou o MPF da 3ª Região (São Paulo e Mato Grosso do Sul).

Blal Dalloul, o terceiro colocado

O procurador regional já comandou a Procuradoria da República do Mato Grosso do Sul, onde acompanhou o combate ao crime organizado na fronteira. É defensor dos acordos de delação premiada para o combate à corrupção. Na gestão do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, foi seu secretário-geral, responsável pela gestão administrativa do Ministério Público.

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Nos bastidores, a busca pela indicação do presidente 

Vinicius Sassine 

19/06/2019

 

 

Correndo por fora da lista tríplice, interessados na cadeira de procurador-geral da República fazem movimentos em direção ao Palácio do Planalto, na tentativa de convencer o presidente Jair Bolsonaro, a quem cabe a indicação, da viabilidade de seus respectivos nomes. O escolhido ainda precisa ser sabatinado e aprovado pelo Senado.

Nessa articulação, um funcionário do Planalto passou a ser considerado decisivo: o subchefe de assuntos jurídicos da Casa Civil, Jorge Antônio de Oliveira. Ex-chefe de gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), ele é muito próximo da família presidencial. Seu gabinete foi transferido para o terceiro andar do Palácio do Planalto, o mesmo do presidente. Oliveira passou a ser procurado por candidatos ao cargo.

A agenda oficial do subchefe da Casa Civil registra um encontro com o subprocurador-geral Augusto Aras, candidato avulso, às 16 horas do último dia 16 de maio, para tratar de “lista tríplice”. Segundo Aras, o encontro foi para entregar seu currículo e apresentar sua candidatura por fora da lista, “na esperança de que ele leve a candidatura ao presidente”.

Aras fez o mesmo com os filhos do presidente. esteve com o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e com Eduardo. Também se reuniu, segundo ele, com o advogado-geral da União, André Mendonça. Nos encontros, defendeu seu nome para a cadeira de procurador-geral e entregou um currículo.

Também fora da lista tríplice, a procuradora geral da República, Raquel Dodge, tem buscado apoio para ser reconduzida ao cargo. Após meses de silêncio e muita movimentação de bastidores, ela entrou abertamente na disputa, há 11 dias, ao se colocar “à disposição da instituição e do país”.

—Eu estou à disposição, tanto da minha instituição quanto do país, para uma eventual recondução, eu não sei se isso vai acontecer —disse, negando, contudo, que esteja articulando com Bolsonaro pela nomeação.

Ao contrário do que fez há dois anos, desta vez Dodge optou por não se candidatar à lista. A procuradora-geral da República foi nomeada para o cargo em 2017 pelo então presidente Michel Temer. Na ocasião, ela foi a segunda mais votada da lista tríplice.

AO LADO DE MORO

Na última segunda-feira, Dodge foi até o Planalto participar da cerimônia pública de assinatura da medida provisória que dá agilidade à venda de bens apreendidos com traficantes de drogas. Ganhou um afago de Bolsonaro. Sentou-se ao lado do ministro da Justiça, Sergio Moro, que vem enfrentando uma crise em razão da divulgação de mensagens trocadas entre ele e o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato em Curitiba.

A recondução de Dodge é defendida pelos presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e por um expressivo número de parlamentares do centrão. Ela também conta com o apoio do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e de outros ministros, entre eles Gilmar Mendes. Toffoli chegou até a falar do assunto com Bolsonaro.

Um dos movimentos da procuradora-geral, que é goiana, é a aproximação com o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), que passou a ser um interlocutor frequente de Bolson aro. Além disso, ela já participou de um jantar, fora de sua agenda oficial, com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), também interlocutor do presidente.

Dodge conta ainda com a ajuda principalmente de seu secretário-geral na Procuradoria Geral da República. O procurador regional Alexandre Camanho tem perfil político e entrada em gabinetes de Brasília. Camanho tem buscado apoios junto a senadores.