O Estado de São Paulo, n. 46012, 09/10/2019. Política, p. A8

 

Ministro do TCU veta campanha do pacote anticrime

Breno Pires

09/10/2019

 

 

Para Vital do Rêgo, propostas podem ser alteradas no Congresso e, por isso, o investimento em propaganda hoje causaria prejuízo

Publicidade. Propaganda do pacote anticrime nos prédios na Esplanada dos Ministérios

O ministro Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União (TCU), suspendeu ontem a veiculação de publicidade sobre o pacote anticrime, que abriga os projetos de lei apresentados ao Congresso pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. Vital do Rêgo argumentou que os projetos do pacote ainda estão tramitando no Congresso e, dessa forma, poderão sofrer “drásticas alterações” – razão pela qual o investimento de recursos neste momento pode provocar desperdício de dinheiro público.

“Não vislumbro como alinhar a divulgação de um projeto de lei que ainda será discutido pelo Parlamento com o objetivo de informar, educar, orientar, mobilizar, prevenir ou alertar a população para a adoção de comportamentos que gerem benefícios individuais e/ou coletivos”, afirmou o ministro em seu despacho. A decisão tem validade até que o plenário do TCU se manifeste sobre o tema, o que deve ocorrer hoje, em sessão plenária.

Com o slogan “A lei tem que estar acima da impunidade”, a campanha foi lançada no dia 3, em cerimônia no Palácio do Planalto. O custo estimado da propaganda é de R$ 10 milhões. As peças publicitárias estão sendo veiculadas em TV, rádio, internet, cinema e até em fachadas de prédios públicos, como na Esplanada dos Ministérios.

Os questionamentos à publicidade partiram de duas frentes. De um lado, o Ministério Público de Contas e, de outro, parlamentares da oposição, entre eles deputados integrantes do grupo de trabalho que discutiu durante meses o projeto na Câmara, como Orlando Silva (PCdoB-SP), Paulo Teixeira (PT-SP) e Marcelo Freixo (PSOL-RJ).

O procurador Lucas Furtado, do Ministério Público de Contas, pediu que a Corte analise o emprego dos recursos na campanha, considerando que a estratégia pode não atender aos “princípios do interesse público e da transparência”, mas, sim, servir “ao favorecimento de interesses pessoais, com ofensa aos princípios da impessoalidade e da supremacia do interesse público”.

Na avaliação dos parlamentares, a publicidade contraria a Constituição e “é lesiva à moralidade e às finanças da União”. Os congressistas destacaram, ainda, que a campanha se caracteriza “única e exclusivamente por seu caráter político e envolve grandes despesas para os cofres da administração pública federal”.

Ao acolher os questionamentos, Vital do Rêgo disse haver “fortes indícios” de que a contratação da campanha não se enquadra na ação orçamentária “Publicidade de Utilidade Pública”. Com isso, justificou a adoção de medida cautelar com vistas a suspender a execução do contrato até que o plenário da Corte se pronuncie.

No sábado, o presidente Jair Bolsonaro já havia comentado sobre a possibilidade de suspensão da publicidade. “Está vindo um processo que está chegando a minha mesa que eu vou ter que suspender com o Sérgio Moro a propaganda da Lei Anticrime. Vamos ver quais são os argumentos, mas, chegando a liminar, imediatamente vai suspender isso aí”, disse ele, ao participar, por videoconferência, do 3.º Simpósio Conservador.

Em nota, o ministro da Justiça disse que, “embora respeite, lamenta a decisão do ministro do Tribunal de Contas da União”. “A campanha publicitária do pacote anticrime é importante para esclarecer à população o alcance das medidas propostas, como foi feito na Previdência”, disse Moro.

Congresso. O pacote anticrime tem sofrido sucessivos reveses no Congresso. O grupo de trabalho criado para analisar as propostas já se posicionou pela supressão de vários itens. Entre eles, foi retirada do texto a prisão de condenados na segunda instância, e foi rejeitada a proposta de ampliar as hipóteses da chamada excludente de ilicitude – a ausência de punição ao policial que mata uma pessoa sob “escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

Para críticos do projeto, as mudanças propostas endurecem as leis, mas não favorecem o combate à criminalidade.

Gasto

R$ 10 mi

é o custo da campanha publicitária criada para promover o pacote anticrime. A campanha foi lançada no início deste mês em evento no Palácio do Planalto.

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Comissão Arsn critica pontos do projeto

Fausto Macedo

Luiz Vassallo

Pedro Prata

09/10/2019

 

 

Uma nota técnica da Comissão Arns critica o pacote anticrime, a principal aposta do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, para o combate à corrupção, violência e crime organizado. O documento, subscrito pelos criminalistas José Carlos Dias e Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, analisa o texto do projeto, ponto a ponto, e afirma que “a sociedade deve ser alertada de que é uma ilusão entender-se que leis mais punitivas, repressão policial de maior intensidade e prisões indiscriminadas são modos e meio de se combater o crime”.

“O crime se combate com o combate às suas causas e não agindo nos seus efeitos”, diz o texto, que será encaminhado à Câmara e ao Senado, onde o projeto é examinado. Os advogados avaliam que quase todos os dispositivos do pacote anticrime são voltados exclusivamente para dificultar o exercício, por parte do acusado, de institutos usados pela defesa.

Eles questionam, por exemplo, a prisão em segundo grau, defendida por Moro. “Ao declarar que a presunção de inocência vige até o trânsito em julgado da decisão condenatória, o constituinte instituiu uma cláusula pétrea. Portanto, tornou impossível, à luz da Constituição, a prisão antes do trânsito em julgado.”

Sobre outro ponto crucial do pacote, a comissão afirma que “a excludente (de ilicitude) ampliada incentivará ainda mais a utilização de armas, já estimulada pelo decreto que as liberou”. Para a comissão, o pacote é “um arcabouço legislativo que, ao contrário de proteger a vida, estimula a sua destruição”.

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Relator da CPI do BNDES sugere indicar Lula e Dilma

Renato Onofre

09/10/2019

 

 

Texto do deputado Altineu Côrtes aponta supostos crimes em empréstimos do banco nas gestões petistas

O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do BNDES na Câmara sugere os indiciamentos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, além de outras 71 pessoas, por supostos crimes cometidos em empréstimos realizados pelo banco de fomento nas gestões petistas. O texto ainda deve ser votado pelos membros da comissão.

A CPI foi criada para investigar empréstimos do BNDES no exterior e reuniu, após 200 dias de funcionamento, informações que apontam falhas do banco no financiamento de obras na Venezuela, em Cuba, em Moçambique e em outros países durante os governos do PT. O banco sempre negou irregularidades nas operações.

Esta é a terceira CPI criada no Congresso nos últimos quatro anos para investigar irregularidades no BNDES nos governos de Lula e Dilma. Nas duas primeiras, as sugestões de indiciamentos foram rejeitadas e as comissões não chegaram a uma conclusão – parlamentares reclamaram da falta de acesso a informações do banco.

O relatório do deputado Altineu Côrtes (PL-RJ) teve como base os documentos entregues pelo Tribunal de Contas da União (TCU), sem oferecer novos elementos de investigação. O texto pede, “considerando os robustos elementos de prova”, a anulação dos acordos de colaboração premiada dos empresários Joesley e Wesley Batista e do ex-diretor da JBS Ricardo Saud, por “omissão” e “falta com a verdade” em seus depoimentos à Justiça.

O relator pede ainda à Procuradoria Geral da República que avalie a “possibilidade de rever ou rescindir” o acordo de leniência firmado em 5 de junho de 2017 com a J&F Investimentos S.A., holding da JBS.

O documento também sugere a criação de uma corregedoria-geral no BNDES; a alteração de seus procedimentos e rotinas internas, de modo que a auditoria independente referente à linha de financiamento à exportação de bens e serviços de engenharia passe a ser contratada pelo próprio BNDES; introdução de índices e ferramentas para medir o impacto das operações de exportação de serviços sobre a geração e manutenção de empregos no País e no exterior, passando a incluir essa informação em seus relatórios, individualizada por operação, a ser divulgada no portal do banco.

Côrtes ainda defende todas as medidas extrajudiciais e judiciais cabíveis para que o BNDES, por meio da BNDESPar, possa pedir o ressarcimento de R$ 25 bilhões da JBS referentes à compra da Bertin. O relatório final só deve ir a votação na semana que vem.

Procurados, as defesas de Lula e Dilma não responderam até a conclusão desta edição.