O globo, n.31368, 25/06/2019. Economia, p. 17

 

Plano para reduzir o preço do gás 

Renata Vieira 

Manoel Ventura 

Ramona Ordoñez 

Bruno Rosa 

25/06/2019

 

 

Guedes prevê queda de 40% no custo do combustível em 2 anos

O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) divulgou ontem um plano estratégico para forçar a concorrência no setor de gás natural e, com isso, reduzir o preço do combustível no país para indústrias, termelétricas e residências. O objetivo é promover o que o ministro da Economia, Paulo Guedes, chama de “choque de energia barata”. De acordo com ele, as medidas podem gerar redução de 40% no preço do gás em dois anos —o que equivale a um incremento de 8,46% no PIB da indústria, nas contas do governo.

Entre as propostas listadas pelo CNPE, composto por nove ministros, está o mapeamento de trechos ociosos de gasodutos que poderão ser operados pela iniciativa privada e a adesão, pelos estados, ao programa do governo. Eles poderão, voluntariamente, optar pela quebra do monopólio que detêm na distribuição do gás encanado, previsto pela Constituição. O governo vai apresentar as medidas ao Congresso, que vai avaliar o que pode ser implementado via projeto de lei. Segundo Guedes, governadores já manifestaram interesse.

—Estamos conversando explicitamente como Estado do Rio, e o (governador) Wilson Witzel quer assinar. Ele quer abrir mão do monopólio de distribuição, quer o gás —disse Guedes, esclarecendo que não haverá contrapartidas financeiras aos estados. —Não tem nenhum “toma lá dá cá”.

Atualmente, a Petrobras é dona da maior parte dos gasodutos do país. Mesmo tendo iniciado a venda de parte de sua malha, mantém o uso exclusivo, por meio de contratos. Na prática, permanece seu monopólio no setor, quebrado em 1997. Sem acesso à infraestrutura, as outras petroleiras acabam vendendo o gás que produzem para a Petrobras.

A indústria brasileira paga pelo gás cerca de US$ 13 pelo metro cúbico, segundo dados do Ministério de Minas e Energia. Nos EUA, o cus toé de pouco mais de US$ 3. Na Europa, cerca de US$ 7. Segundo o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, acada 10% de redução no preço do gás, o PIB industrial do país pode subir 2,1%. Na visão de Guedes, a redução do preço do gás com maior competição promoverá o crescimento da economia como um todo:

—Com energia barata, isso vai reindustrializar o país.

Albuquerque afirmou que os investimentos em infraestrutura previstos até 2032, tendo em vista a abertura do mercado, são da ordem de R$ 34 bilhões. Guedes ressaltou ainda o interesse da mineradora Vale na compra de energia futura para abastecer suas operações —o que garantiria investimentos em produção e escoamento de gás no país.

As medidas dependem também de um acordo entre Petrobras e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A expectativa é que a empresa assine amanhã um termo para se livrar de multas bilionárias por conduta anticompetitiva no mercado de gás e permitir que outras empresas usem os gasodutos que alimentam as redes de distribuição estaduais.

GÁS DE COZINHA

Embora as diretrizes divulgadas pelo governo tenham impacto concentrado sobre grandes consumidores de energia, como indústrias e usinas termelétricas, Guedes prevê um efeito em cadeia, que deve atingir o preço do botijão de gás doméstico.

—Isso vai chegar às famílias mais pobres, que gastam de 30% a 40% da renda em gás de cozinha —disse.

Especialistas divergem sobre o impacto do plano. Para Márcio Balthazar, da NatGas Economics, ainda é prematuro estimar redução no preço do gás. Já Rebecca Maduro, sócia da área de energia do L.O. Baptista Advogados, acredita que a projeção de queda do preço do gás em 40% em dois anos é factível apenas se toda a reserva de gás for produzida com uso ampliado da malha de dutos. Edmar Almeida, professor da UFRJ, concorda, mas aponta a necessidade de reduzir impostos sobre o combustível:

—Se o preço do gás cair, a indústria vai investir mais, pois existe essa demanda. Mas não basta apenas aumentara competição. É preciso resolvera questão tributária.

O diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Décio Oddone, destacou que é a primeira vez que o país define uma política energética para o gás. A Petrobras disse que só se manifestará quanto tiver acesso à resolução do CNPE.

Principais pontos da estratégia

> Maior competição: O governo federal vai incentivar a entrada de mais competidores em toda a cadeia de gás natural, da produção à distribuição, o que contribuirá para a redução do preço do combustível em até 40% em dois anos. Atualmente, a Petrobras tem, na prática, o monopólio do setor.

> Acesso à infraestrutura: A Petrobras terá de definir o quanto de capacidade necessita usar em cada ponto de entrada e saída do sistema de transporte de gás natural e permitir o acesso de outras empresas. A ideia é abrir o acesso não só aos gasodutos, mas a toda a infraestrutura do setor, como dutos de escoamento, unidades de processamento e terminais de gás natural liquefeito (GNL).

> Distribuição: O governo criará incentivos em seus programas de transferências de recursos e de ajuste fiscal, para estimular os estados a modernizarem a regulação dos serviços de gás canalizado, incluindo o fim do monopólio estadual na distribuição, a privatização de companhias locais e a modernização da agências reguladoras.

> Acordo entre Petrobras e Cade: As medidas dependem também de um acordo entre Petrobras e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Amanhã, a petrolífera deve assinar um termo de cessação de conduta (TCC) para se livrar de multas bilionárias por conduta anticompetitiva no mercado de gás e permitir que outras empresas usem seus gasodutos.

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Com royalties, arrecadação é a maior desde 2014

Eliane Oliveira 

25/06/2019

 

 

Receitas somaram R$ 113,3 bi no mês passado, melhor resultado em cinco anos. Equipe econômica deve rever projeção do PIB

Impulsionado pela alta nos royalties da indústria de petróleo e gás, o governo federal teve em maio a maior arrecadação mensal dos últimos cinco anos. No mês passado, as receitas federais somaram R$ 113,3 bilhões, uma alta real (descontada a inflação) de a R$ 637,6 bilhões, 5,68% acima do registrado entre janeiro e maio do ano passado.

A alta da arrecadação em maio foi puxada pela expansão de 19,56% das receitas não administradas pelo Fisco, principalmente royalties do petróleo. Já impostos e contribuições aumentaram 0,58% em relação ao mesmo mês do ano passado. Nesse ponto, destacou-se a alta de 23,47% da arrecadação do Imposto de Renda retido na fonte.

Entre os indicadores levados em conta no cálculo da Receita em maio, a produção industrial sofreu uma queda de 1,05% ante maio de 2018. Já as vendas de bens e serviços subiram 3,1% e 1,7%. A massa salarial aumentou 5,21%, e o valor em dólar das importações, 14,09%. Este último indicador levou a uma expansão de 9,61% no total recolhido com tarifas de importação.

CRESCIMENTO MENOR

O subsecretário de Política Fiscal da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, Marco Cavalcanti, indicou ontem que o governo vai mais uma vez rever para baixo sua estimativa de crescimento do Produto Interno Bruto( PIB) este ano. Em maio, a previsão foi reduzida de 2,2% para 1,6%.

— Vamos rever nossa estimativa em breve, devido a uma deterioração muito rápida das expectativas — disse o técnico, citando a pesquisa semanal Focus, do Banco Central, em que a média das projeções do mercado é de 0,87%.

Segundo Cavalcanti, o número deve ser revelado “muito provavelmente” antes da divulgação do relatório bimestral das contas do governo, marcada para 22 de julho.