O globo, n.31373, 30/06/2019. País, p. 08

 

Procuradores criticaram Moro, afirma site

30/06/2019

 

 

Novas mensagens divulgadas apontam avaliações negativas sobre decisão do ministro de aceitar cargo no governo Bolsonaro; Lava-Jato não reconhece autenticidade dos diálogos e cita troca de nomes em reportagem

Novos diálogos divulgados ontem pelo site The Intercept Brasil indicam que procuradores do Ministério Público Federal (MPF), parte deles integrantes da Lava-Jato, criticaram a decisão do ex-juiz federal Sergio Moro de aceitar o convite do presidente Jair Bolsonaro para comandar o Ministério da Justiça. As mensagens foram trocadas em grupos de conversa de procuradores no aplicativo Telegram e mostram preocupação com um possível desgaste da imagem da operação com a ida do juiz para um cargo político. A Lava-Jato e os citados disseram não ser possível atestar a veracidade das mensagens na íntegra.

A nova leva de mensagens mostra procuradores opinando sobre a ida de Moro para o ministério. Em um dos grupos de conversa, chamado “Grupo MPF Gilmar Mendes”, Sérgio Luiz Pinel Dias (integrante da Lava-Jato no Rio) classifica a atitude de Moro como “ruim para o legado” da operação. Dias completa que se tornaria difícil “afastar a imagem de que a Lava-Jato integrou o governo de Bolsonaro”.

A preocupação de que a ida de Moro para o governo reforçasse uma impressão de apoio da Lava-Jato a Bolsonaro é manifestada também pelo procurador Paulo Roberto Galvão, integrante da força-tarefa em Curitiba.

No grupo “Filhos de Januário 3”, ele escreveu: “Pessoal, nós somos procuradores da República. Cumprimos a nossa função no combate à corrupção, e não poderíamos ter feito diferente, ainda que soubéssemos que daí poderia advir um eleito antidemocrático (e sabíamos pois estudamos e conhecíamos o risco Berlusconi)”, em referência ao primeiro ministro italiano eleito após a devassa da Operação Mãos Limpas na política local. Galvão avalia ainda que Moro errou por, em sua visão, “deixar transparecer” uma preferência por Bolsonaro na disputa eleitoral.

“SUPOSTAS FOFOCAS"

Outro diálogo indica que o coordenador da força-tarefa em Curitiba, Deltan Dallagnol, também tinha preocupação com a ida de Moro para o Executivo. A uma procuradora da República da 3ª Região, Janice Ascari, Dallagnol conta que fez uma “ponderação” ao ministro sobre o convite: “Não acredito que tenham fundamento, mas tenho medo do corpo que isso possa tomar na opinião pública.

Na minha perspectiva pessoal, hoje, Moro e LJ (Lava-jato) estão intimamente vinculados no imaginário social, então defender o Moro é defender a LJ e vice-versa. Ainda que eu tenha alguma ponderação pessoal sobre a saída dele, que fiz diretamente a ele, é algo que seria importante — se Vc concordar — defender…”, diz Dallagnol. Moro usou o Twitter ontem para se manifestar sobre a reportagem.

O ministro escreveu que“se fosse verdadeira,(a matéria) não passaria de supostas fofocas de procuradores, a maioria de fora da LavaJato” e apontou que “houve trocas de nomes e datas pelo próprio site que as publicou”. A força-tarefa da Lava-Jato afirmou, em nota, que “reconhece como ilegítimo o material publicado, salientando novamente sua origem criminosa, alertando haver fortes indícios de edição de nomes de interlocutores e datas nas supostas mensagens”.

Além de reafirmarem que a operação se baseia em provas robustas e denúncias consistentes, os procuradores disseram que a divulgação dos diálogos “"não traz qualquer interesse público subjacente, mas apenas visa constranger as autoridades públicas mencionadas”.

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) criticou um erro do Intercept Brasil na divulgação dos diálogos. Na primeira versão publicada pelo site, um dos procuradores estava identificado como Angelo Goulart Vilella, afastado do MPF em 2017. Em seguida, o site corrigiu e atribuiu os diálogos ao procurador Ângelo Augusto Costa. A ANPR viu nas mensagens “indícios de terem sido adulteradas”.