O globo, n.31372, 29/06/2019. Economia, p. 23

 

Mercosul e UE, um acordo histórico

Eliane Oliveira 

Rennan Setti

Bruno Rosa

João Sorima Neto

29/06/2019

 

 

Mercosul e União Europeia assinaram, após 20 anos de negociação, um acordo de livre comércio entre os dois blocos, que representam 25% do PIB mundial. Para o Brasil, significa um avanço em abertura comercial e o potencial de atrair investimentos de US$ 113 bilhões em 15 anos. Hoje, apenas 24% das exportações brasileiras entram no mercado europeu livres de tarifas. Em dez anos, 90% dos produtos do Mercosul ingressarão dessa maneira. O restante, por cota sou com tarifa reduzida. Segundo analistas, há ganhos políticos para todos os governos envolvidos. O acordo prevê a aceitação de compromissos ambientais.
Depois de mais de 20 anos de negociação, a União Europeia (UE) e o Mercosul fecharam ontem um acordo de livre comércio. Juntos, os dois blocos econômicos representam cerca de 25% do PIB mundial e um mercado de 780 milhões de pessoas. O acordo será uma das maiores áreas de livre comércio do mundo. Também é o mais amplo e de maior complexidade já negociado pelo Mercosul, e o maior acordo fechado pelo Brasil, num avanço no processo de abertura comercial. Abre tarifas, serviços, compras governamentais, facilitação de comércio, barreiras técnicas, medidas sanitárias e fitossanitárias e propriedade intelectual.
Hoje, apenas 24% das exportações
brasileiras entram livres de tributos no mercado europeu. Com o acordo, mais de 90% das exportações do Mercosul serão plenamente liberalizadas no mercado europeu dentro de dez anos. O restante, porém, entrará na UE por meio de cotas e reduções parciais de tarifas, como carnes, açúcar, etanol e lácteos.
Mas alguns produtos agrícolas de grande interesse do Brasil terão suas tarifas eliminadas, como suco de laranja, frutas e café solúvel. E as empresas brasileiras serão beneficiadas coma eliminação de tarifas na exportação de 100% dos produtos industriais.
‘VAMOS ABRIR A ECONOMIA’
O Ministério da Economia brasileiro estima que o acordo “representará um incremento do PIB brasileiro de US$ 87,5 bilhões em 15 anos, podendo chegara US $125 bilhões .” As projeções do governo indicam aumento dos investimentos previstos para o Brasil, no mesmo período, de US $113 bilhões. Já as exportações para a UE podem crescer quase US$ 100 bilhões até 2035.
Do Japão, onde se reúne com líderes doG-20,op residente JairBol sonar o celebrou a assina turado acordoe disse que ele vai gerar um efeito dominó, com outros países querendo negociar com o Brasil. Ele não exclui a possibilidade de o Mercosul abrir os EUA e como Japão.
Em uma rede social, Bolsonaro classificou o acordo de “histórico” e parabenizou os ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Paulo Guedes (Economia) e Tereza Cristina (Agricultura) pelo empenho nas negociações. “Esse será um dos acordos comerciais mais importantes de todos os tempos e trará benefícios enormes para nossa economia”. E complementou: “Prometi que faria comércio com todo o mundo, sem viés ideológico. Não foi retórica vazia de campanha, típica da velha política. É pra valer! Estou cumprindo mais essa promessa, que renderá frutos num futuro próximo. Vamos abrir nossa economia e mudar o Brasil pra melhor!” “Momento histórico” foi a expressão escolhida por vários dos envolvidos no acordo: Araújo, Tereza Cristina e o presidente da Comissão Europeia (órgão executivo da UE), JeanClaude Juncker. Ressaltando que era o mais amplo acordo já feito pela UE, Juncker afirmou que, “em meio a tensões no comércio internacional, estamos enviando um forte sinal de que defendemos comércio baseado em regras.” O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, que participou da coletiva em Bruxelas com Araújo e Tereza Cristina, ressaltou que o acordo tem implicações que vão além dos aspectos comerciais. —O Brasil, entre as 15 maiores economias do mundo, tem o menor percentual de seu PIB voltado ao comércio exterior. Esperamos aumento significativo da corrente de comércio exterior —afirmou Troyjo. O secretário acredita também que, ao permitir maior competitividade na economia, o acordo estimula reformas que modernizam o país ejá estão em curso, co moada Previdência e a tributária. Já Tereza Cristina informou que os detalhes do acordo serão divulgados este fim de semana. Ela ressaltou que houve concessões de ambas as parte seque, onde não se avançou em termos de cotas de exportação, houve avanços nas questões tarifárias.
— O acordo amplia comercialmente nossas oportunidades, melhora o ambiente de negócios e torna o mercado brasileiro mais atraente para o investimento estrangeiro direto, já que as empresas vão querer investir aqui para ter acesso ao mercado europeu com condições facilitadas — disse Márcio Sette Fortes, professor de Economia Internacional do Ibmec-RJ e conselheiro da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). O anúncio do acordo foi bem recebido pelos setores exportadores. Caso da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR), com o suco de laranja, e do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), por sua vez, vê potencial para elevar a renda e o volume de exportação.
Já para Eduardo Leão, diretor da Unica, do setor sucroalcooleiro, o acordo poderia ser mais ambicioso. O presidente do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Oscar Ló, teme que os produtores não consigam concorrer com os europeus, fortemente subsidiados: —Já mostramos preocupação ao governo, e ele nos prometeu uma compensação.
VOTAÇÃO NOS PARLAMENTOS
Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e sócio da consultoria BMJ, diz que a UE tema agricultura“mais protecionista do mundo”: —A conquista que o acordo traz para o setor agrícola do Mercosul são as cotas. Embora seja importante, não vai haver liberalização desse setor. Brasil e Argentina fizeram muitas concessões para conseguir fechar esse acordo. Foi o preço que tivemos de pagar. O acordo ainda terá de ser revisado, do ponto de vista jurídico, e submetido aos Parlamentos de todos os membros dos dois blocos, um processo que pode levar mais de um ano. Só depois da aprovação total é que entrará em vigor. Para a coordenadora do curso de Relações Internacionais da PUC de Poços de Caldas (MG), Carolina Pavese, o Brasil pode enfrentar novas exigências na votação nos 28 Parlamentos de cada um dos membros da UE, além do Parlamento Europeu:
— A França já indicou que pode atrasara votação ou rever sua posição. (* Do Valor)

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À espera das iguarias europeias na mesa do brasileiro 

Bruno Rosa 

29/06/2019

 

 

O acordo de livre comércio promete temperar a mesa do brasileiro com produtos típicos —e também os com indicação de origem —europeus com preço bem menos salgado. Na prática, será o encontro entre a cachaça, as carnes e a salada de frutas tropicais

com queijos e vinhos franceses e outras iguarias. Na prática, o advogado Miguel Neto, sócio do Miguel Neto Advogados, explica que o acordo fechado entre o Mercosul e a União Europeia vai representar para os brasileiros um caminho para consumir produtos europeus a um custo mais mais baixo.

Ele lembra que, além da redução tarifária, passa a haver ainda uma menor barreira regulatória, o que diminui as exigências de obtenção de licenças específicas para alimentos e bebidas, como registros nas áreas de agricultura e saúde.

—Isso vai permitir que os produtos lançados na Europa cheguem mais rápido ao Brasil. Haverá um acesso maior, e a um preço menor, a alimentos como álcool, queijos, presuntos e salames —destacou Neto. Isso não quer dizer, no entanto, que essa mesa farta em delícias europeias poderá ser posta de imediato. No caso do vinho, será preciso esperar por mais de uma década. Apesar de não ter detalhado os termos do acordo, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, adiantou, por exemplo, que os vinhos europeus deverão passar por uma transição de até 12 anos até que tenham sua tarifa zerada.