O Estado de São Paulo, n. 46005, 02/10/2019. Metrópole, p. A20

 

Para Bolsonaro, Vale 'abocanhou' o direito mineral em todo o Brasil

Julia Lindner

02/10/2019

 

 

Presidente voltou a criticar as motivações de outros países ao falar da Amazônia: ‘O interesse é no minério’

Ao conversar com um grupo de garimpeiros da região de Serra Pelada, no Pará, o presidente Jair Bolsonaro criticou ontem a Vale por ter, na visão dele, “abocanhado” o direito mineral no Brasil no governo do expresidente Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2003). O presidente também voltou a criticar o interesse de outros países na Floresta Amazônica.

“Esse é um país que é roubado há 500 anos. A gente conhece o potencial mineral do Brasil. Eu sei como a Vale do Rio Doce abocanhou, no governo FHC, o direito mineral no Brasil. Um crime o que aconteceu”, disse Bolsonaro a representantes da Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (Coomigasp).

Os garimpeiros acusam a empresa de invadir a sua propriedade para extrair minério e vender para fora. Representantes da Coomigasp pediram a Bolsonaro intervenção das Forças Armadas no local. “Esta área pertence aos garimpeiros. A companhia Vale do Rio Doce recebeu US$ 70 milhões para sair de lá. Só que ela saiu, mas está bem do lado, fazendo um buraco que se chama Projeto Serra Leste, está mandando para fora do Brasil falando que é ferro. Está levando ouro e não está sendo prestado conta”, disse o líder da Coomigasp, Jonas Andrade.

Bolsonaro prometeu que, se houver amparo legal, vai enviar as Forças Armadas para atuar na região. O presidente também disse que é uma “covardia” o que fazem com garimpeiros no Brasil e insinuou que há pessoas que pagam propina para encobrir ilegalidades. O presidente disse ter pedido ao ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, para buscar “alternativas” que ajudem os garimpeiros.

Bolsonaro ainda voltou a criticar o interesse de outros países na Floresta Amazônica, bioma no foco das preocupações ambientais por causa das queimadas. “O interesse na Amazônia não é no índio e nem na p. da árvore, é no minério”, afirmou o presidente.

Mais tarde, o porta-voz da Presidência, general Otávio do Rêgo Barros, disse que o governo não tem interesse “concreto” em colocar gestão militar na região de Serra Pelada.

Resposta. Sobre as denúncias de garimpeiros, a Vale informou que não tem atividades minerárias em Serra Pelada nem operação de mineração subterrânea no Pará. Segundo a Vale, foi cedida a área de jazida à Coomigasp em março de 2007 e a empresa mantém em Curionópolis apenas a unidade Serra Leste, de exploração de minério de ferro.

Em relação às críticas do presidente Bolsonaro, a Vale informou que não vai se pronunciar.

Sínodo da Amazônia

O bispo do Marajó (PA), d. Evaristo Spengler, integrante da comitiva brasileira que viajará ao Vaticano, fez ontem um apelo contrário à mineração e a grandes obras na região amazônica.

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Queimadas dobram na área do Cerrado

Giovana Girardi

02/10/2019

 

 

Parques como a Chapada dos Veadeiros tiveram focos de fogo intensos; foram 22,9 mil no bioma em setembro

O número de focos de incêndio no Cerrado dobrou no último mês, na comparação com setembro do ano passado. De 1.º a 30 de setembro deste ano, foram 22.989 focos, ante 11.467 no mesmo período do ano passado, alta de 100,4%. As queimadas seguiram uma tendência de alta que vinha desde agosto, quando o bioma sofreu com 12.906 focos de fogo, ante 7.992 em agosto de 2018 – aumento de 61,4%.

Parques importantes do bioma, como a Chapada dos Veadeiros e a Chapada dos Guimarães, tiveram queimadas intensas. A Área de Proteção Ambiental (APA) do Planalto Central, que atinge 65% da área do Distrito Federal, teve o dobro do número de focos de fogo em setembro, na comparação com o mesmo mês do ano passado.

“Há combinação de dois fatores: a estação seca e um aumento das queimadas pelas pessoas. Há um senso comum de que o fogo é natural do Cerrado, mas é natural quando tem chuva. Caem os raios e queimam a vegetação. Na seca não tem fogo natural, é alguém que bota. O ser humano mudou drasticamente o regime de fogo no Cerrado”, diz Fernando Tatagiba, chefe da APA do Planalto Central.

A maior alta no Cerrado ocorre ao mesmo tempo que as queimadas começaram a diminuir na Amazônia, em parte por causa das ações das Forças Armadas, mas também porque choveu acima da média em especial em Mato Grosso, Estado que liderava em incêndios. De 1.º a 30 de setembro, o bioma amazônico teve 19.925 focos, ante 24.803 em setembro de 2018 – redução de 19,6%. Em agosto, haviam sido 30.901 focos, ante 10.421 – alta de 196%.

Causas. Técnicos do Ibama que atuam na região ponderam que as queimadas muito acima da média histórica em agosto – que era de 25.853 – de certo modo diminuíram o material que poderia ser queimado em setembro. Historicamente, os focos de incêndio na floresta costumam atingir pico em setembro, de modo que havia o temor de que a situação neste mês seria ainda pior. Mas a combinação de fatores colaborou com a queda.