O Estado de São Paulo, n. 46063, 29/11/2019. Economia, p. B1

 

Benesses em PEC paralela reduzem em R$ 43 bi ganho com nova Previdência

Adriana Fernandes

29/11/2019

 

 

Finangas públicas. Aprovado no Senado, texto com regras para a aposentadoria de servidores nos Estados e municípios prevê criação de regime próprio para categorias como peritos criminais e agentes da Abin e também manda ressarcir DF por gastos com segurança

 A PEC paralela da Previdência aprovada no Senado, com regras para a aposentadoria de servidores estaduais e municipais, abriu a possibilidade de criação de um regime especial para algumas categorias do funcionalismo e tem potencial para anular em R$ 43 bilhões em 10 anos a economia com a reforma da Previdência já aprovada. A proposta ainda precisa ser aprovada em dois turnos na Câmara.

Aprovada no Senado, a chamada Proposta de Emenda Constitucional (PEC) paralela, com regras para a aposentadoria de servidores estaduais e municipais, tem potencial para anular parte do ajuste da reforma da Previdência já aprovada. Mesmo levando em consideração as novas receitas que o texto pretende criar (com a taxação de exportações agrícolas, por exemplo), a previsão é de um aumento de R$ 43 bilhões nas despesas em 10 anos, segundo cálculos preliminares obtidos pelo ‘Estado’. A proposta ainda precisa ser aprovada em dois turnos na Câmara.

A PEC foi vendida pelo Senado como um complemento da reforma ao incluir a possibilidade de adesão dos Estados e município às regras de aposentadoria dos servidores do governo federal. O texto aprovado pelos senadores, porém, acabou abrindo a possibilidade de criação de regime especial para algumas categorias – peritos criminais, guardas municipais e até mesmo agentes e oficiais da Abin, o serviço de inteligência do governo federal.

A possibilidade de regime especial para novas categorias, incluindo policiais civis dos Estados (que já estava na reforma promulgada), vai na contramão do princípio pretendido pelo projeto original, de regras iguais para todos os trabalhadores. Pelas normas que já estão em vigor, homens e mulheres que entraram no mercado de trabalho depois do dia 12 deste mês precisam cumprir idade mínima de 65 anos e 62 anos, respectivamente, para se aposentar .

A regulamentação da aposentadoria será feita por legislação complementar e há grande preocupação de que outras categorias pressionem por regras especiais, caso a proposta avance na Câmara. Só de servidores do Executivo, há 267 sindicatos e associações que pressionam os parlamentares por alterações que os beneficiam. A Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, lançada este ano, reúne 235 deputados e sete senadores.

“O Senado abriu a porteira das bondades. A PEC paralela só piora a reforma da Previdência”, diz o economista Paulo Tafner, especialista em Previdência.

Distrito Federal. Além da previsão de regime especial para algumas categorias, emenda incluída na PEC prevê repasse de pelo menos R$ 17,6 bilhões de receitas do Imposto de Renda para o Distrito Federal nos próximos 10 anos relativo ao salário dos servidores da segurança que são pagos com dinheiro do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF).

O fundo é alimentado com recursos da União e o Tribunal Contas da União (TCU) já havia determinado que a arrecadação do IR cobrado na fonte deveria ser dividida entre o governo federal e todos os Estados e municípios. Uma articulação da bancada do DF, porém, conseguiu incluir na PEC a transferência para o governo distrital.

A PEC também pode abrir brecha para prefeitos e governadores gastarem livremente recursos que foram capitalizados e poupados, nos últimos anos, para fazer frente à Previdência dos seus servidores. Segundo técnicos do governo, artigo permite que prefeitos e governadores gastem esse dinheiro, deixando o buraco para o próximo gestor, segundo técnicos.

Para Felipe Salto, diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, a PEC paralela, cujo objetivo era tratar da inclusão dos Estados e municípios, acabou avançando sobre outros assuntos que podem ter efeito fiscal relevante. “A ideia foi criar um incentivo para que mais e mais Estados e municípios aderissem à reforma da União, mas a PEC paralela os libera dessas punições”, afirmou Salto.
‘Bondades’

 “O texto aprovado no Senado abriu a porteira das bondades. A PEC paralela só piora a reforma da Previdência.”
Paulo Tafner

ECONOMISTA
 

O QUE MUDA

Regra de cálculo

Por acordo entre governo e oposição, o relator Tasso Jereissati promoveu uma modificação em relação ao cálculo das aposentadorias, que sozinha reduz em R$ 20 bilhões a economia com a reforma já aprovada.

Transição mais suave para mulheres

No caso de aposentadoria por idade, o texto prevê idade mínima de 60 anos a partir de 2020 com transição gradual de 6 meses a cada dois anos, até atingir 62 anos.

Tempo de contribuição para homens

Prevê tempo mínimo de contribuição de 15 anos, inclusive para os homens que ainda vão ingressar no mercado de trabalho.

Pensão por morte

Define que nenhum pensionista terá renda formal inferior ao salário mínimo. Tasso acatou emenda para que esse benefício fique estabelecido, também, no caso de servidores estaduais e municipais.

Criação de um benefício universal infantil

A PEC prevê uma lei para a criação de benefício que concentra recursos nas famílias mais pobres e na primeira infância.

O que é preciso para a PEC paralela valer?

O texto precisa do apoio dos deputados, em dois turnos. É preciso o voto de 308 de 513 deputados para aprová-la.

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Relator propõe bônus para funcionalismo em caso de superávit

Daniel Weterman

29/11/2019

 

 

Proposta foi apresentada pelo senador Oriovisto Guimarães para reduzir rejeição no Congresso à PEC emergencial

 O relatório da PEC emergencial no Senado cria uma espécie de participação de lucros e resultados (PLR) para os servidores públicos. Quando as receitas superarem as despesas no caixa da União, Estados e municípios, os servidores públicos vão ter direito a um bônus de até 5% do chamado superávit primário. Além disso, o parecer inclui políticos na mesma redução de salários prevista para os funcionários de carreira.

O relator da proposta, Oriovisto Guimarães (Pode-PR), concluiu o parecer e deve apresentar o documento até hoje. Ele ainda negociava os pontos com a equipe econômica e a versão final do relatório não foi divulgada. O formato de acionar os gatilhos em caso de emergência fiscal será mantido.

A PEC desenhada pelo governo prevê gatilhos como redução de salários e jornadas de trabalho se a União descumprir a chamada regra de ouro, norma que proíbe o governo de contrair dívida para pagar despesas correntes. O texto foi enviado ao Congresso Nacional justamente para diminuir despesas obrigatórias, principalmente as relacionadas aos servidores. Nos Estados e municípios, as medidas poderão ser acionadas quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente.

Dentro do pacote do ministro da Economia, Paulo Guedes, a PEC emergencial é a que enfrenta maior resistência no Congresso. O relator incluiu o bônus como estratégia para diminuir a rejeição. O parecer prevê que, em caso de superávit primário, o presidente da República, governador ou prefeito poderá distribuir até 5% do resultado entre os servidores. A distribuição e os critérios deverão ser definidos por lei complementar e não serão obrigatórios.

Para o diretor da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto, o bônus deveria ser discutido na reforma administrativa (que reformula o RH do Estado), e não na PEC emergencial. “Se quer criar mecanismos de premiar a boa conduta e a produtividade do serviço público, tem que pensar em coisas mais sofisticada e fazer isso no âmbito de uma reforma administrativa”, afirmou.

A IFI projeta que o governo central – Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central – só vai voltar a fechar as contas no azul em 2026. O superávit projetado é de R$ 25,4 bilhões. Com isso, R$ 1,27 bilhão seria distribuído para os servidores federais pela proposta do relator. “Para o servidor que receber isso, vai ser relevante. Do ponto de vista fiscal, não me parece tão significativo e preocupante, mas não é a maneira mais adequada de endereçar.”

Políticos. O senador também incluiu os políticos – presidente, governador, prefeito e parlamentares – na previsão de corte de até 25% de salários em caso de emergência fiscal. A intenção é colocá-los para “pagar a conta” ao lado dos servidores de carreira. A redução da jornada de trabalho, programada para os funcionários, não foi prevista para os políticos.

A PEC emergencial é uma das propostas do pacote econômica do Guedes. Cria mecanismos emergenciais de controle de despesas públicas para União, Estados e municípios e abre R$ 50 bilhões no Orçamento do governo federal em uma década.

Outra proposta, chamada de PEC do pacto federativo, transfere R$ 400 bilhões em recursos de exploração de petróleo e dá mais autonomia financeira para Estados e municípios.