Título: Desmonte da máquina no Entorno
Autor: Marcos, Almiro; Oliveira, Sheila
Fonte: Correio Braziliense, 27/10/2012, Cidades, p. 33

Nem bem terminaram as eleições municipais, a população de algumas cidades do Entorno onde os atuais prefeitos não foram reeleitos ou não fizeram sucessores já começa a sentir os resultados, e negativos. Pelo menos em quatro dos maiores e principais municípios, o quadro é preocupante. Já foram registrados demissão em massa de servidores, prejuízos em serviços públicos essenciais, como na saúde, e falta de regularidade na prestação de atividades como a coleta de lixo.

Os atuais gestores dizem que as providências são para deixar a casa arrumada para os sucessores. Para o Ministério Público, no entanto, a situação não é bem assim, tanto que uma recomendação foi encaminhada a todas as promotorias alertando para os casos e algumas ações já estão sendo engatilhadas contra os atuais prefeitos. Os futuros administradores dizem saber dos problemas e esperam uma transição tranquila.

O desmonte da máquina administrativa após o período eleitoral é fato recorrente nos municípios goianos. No passado, foram constatados problemas semelhantes. Desta vez, porém, o Ministério Público de Goiás (MP-GO) decidiu se antecipar. Assim que se encerraram as eleições, em 7 de outubro, o Centro de Apoio Operacional do Patrimônio Público do MP (Caopp) encaminhou uma circular a todas as promotorias do Estado, alertando para os problemas que normalmente ocorrem.

Reação Para o promotor Rodrigo César Bolleli Faria, que coordena o Caopp, a ação dos prefeitos derrotados configura-se "como nítida retaliação ao resultado das urnas". "Se tais gestores pretendem mesmo arrumar a casa, como alegam, por que não se organizaram ao longo de todo o governo? Se configurar improbidade administrativa, acionaremos os prefeitos. A população não pode ser prejudicada", alerta o promotor.

A reportagem do Correio esteve, nos últimos dias, em quatro cidades onde a oposição foi vencedora nas eleições: Novo Gama, Valparaíso, Santo Antônio do Descoberto e Águas Lindas. A situação, em todas elas, é semelhante, com demissão de comissionados e redução de expediente de alguns serviços públicos.

Em Santo Antônio, por exemplo, o principal problema é o atraso no salário dos servidores. Com isso, a carga horária dos alunos foi encurtada e o serviço de coleta de lixo acabou prejudicado. Para a professora Dulciléia Martins, o problema é de gestão. Em Valparaíso, de 160 trabalhadores no primeiro semestre, o quadro do hospital da cidade caiu para 96. O resultado é a falta de assistência aos pacientes, que passam horas à espera de médicos.

Já no Novo Gama, o problema na área é semelhante, mas o Ministério Público cobra uma resposta da prefeitura. Em Águas Lindas, um dia após a eleição, todos os comissionados foram demitidos. Mais uma vez, uma das áreas mais atingidas é a saúde. O único hospital da cidade tem, agora, três médicos. Diante do caos, a pressão sobre o DF tende a aumentar até o fim do ano, uma vez que os prefeitos eleitos tomam posse em janeiro.

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Santo Antônio do Descoberto

Em Santo Antônio do Descoberto, a 50 quilômetros de Brasília e com mais de 38 mil habitantes, os pais de alunos foram informados que a carga horária da rede municipal seria reduzida como medida de contenção de despesas. Os alunos passaram a ter apenas três horas de aula por dia, desde o início de outubro. Além disso, outro problema relacionado com a educação é o atraso no pagamento dos servidores e professores. O prefeito David Leite (PR) garantiu ao Correio que a situação voltaria ao normal. "Foi um fato isolado, não tem nada a ver com a sucessão municipal", disse o prefeito, que foi impedido pela Justiça de concorrer à reeleição. Na cidade, o escolhido nas urnas foi o Padre Getúlio de Alencar (PMDB), cujo registro acabou cassado. Portanto, deve assumir o cargo o segundo colocado, Itamar Prado (PDT). Outras categorias também reclamam de salários atrasados este mês, como os garis. Como resultado, há o acúmulo de lixo. Nas ruas da cidade, 15 dias depois das eleições, ainda era possível ver santinhos de candidatos a vereador e prefeito espalhados. O prefeito diz que a cidade enfrenta problemas pela falta de recursos, já que depende basicamente de repasses constitucionais. "Se em novembro não melhorar, teremos de demitir servidores, aí os serviços públicos serão afetados de fato", afirma. "O prefeito é que não está conseguindo administrar as verbas que entram", acredita a professora Dulcélia Martins.