Valor econômico, v.20, n.4748, 13/05/2019. Empresas, p. B6

 

Para Anatel, avanço do setor está no Senado 

Ivone Santana 

13/05/2019

 

 

Leonardo Morais: empresas poderão criar suas próprias redes privadas se a lei permitir que aluguem o espectro das teles num mercado secundário

Depois de enviar cartas ao Senado com sua proposta de agenda legislativa, em abril, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tem se empenhado em explicar aos parlamentares os projetos que tramitam na casa. Se aprovados, eles podem acelerar a expansão da banda larga e das comunicações máquina a máquina (M2M, na sigla em inglês), consideradas fundamentais para a disseminação da Internet das Coisas (IoT).

Uma das matérias mais conhecidas da agenda legislativa é o projeto de lei da Câmara (PLC) 79/2016, atualmente em trâmite no Senado. O PLC 79 altera o marco legal das telecomunicações - permite trocar as atuais concessões de telefonia fixa por autorizações, investir em banda larga em vez da telefonia fixa, transformar o valor dos bens reversíveis que estão com as concessionárias em investimentos, entre outras mudanças.

A defesa desse projeto, naturalmente, faz parte da agenda legislativa da agência, mas Leonardo Euler de Morais, presidente da Anatel, destaca outros projetos que também considera importantes e que podem causar impactos ao setor.

Na lista está o PLS 349/2018, de autoria do senador Garibaldi Alves Filho (MDB/RN), que altera as regras de cobrança das cargas tributária e regulatória incidentes sobre os dispositivos M2M e propõe reduzir as taxas e contribuições sobre as estações terminais de pequeno porte para recepção via satélite - as chamadas Vsat (do inglês, Very Small Aperture Terminal). A expectativa é que a redução dos tributos nas Vsats diminua o preço da banda larga por satélite. Atualmente, o projeto está sob relatoria do senador Chico Rodrigues (DEM/RR).

Morais considera fundamental que IoT seja isenta de taxação pelo Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel), já que a potencial receita que cada dispositivo deverá gerar "é na casa de centavos por ano." Sem isso, não haverá ecossistema de IoT no país, afirma.

A Taxa de Fiscalização de Instalação (TFI) de dispositivos do chip para internet das coisas é de R$ 5,68 e a de funcionamento (TFF), R$ 1,89. No entanto, da receita bruta de R$ 12 por ano prevista para cada chip, a receita líquida será negativa em R$ 2,28 no primeiro ano de operação e positiva em R$ 1,51 nos anos seguintes, segundo projeção do SindiTelebrasil, que representa as operadoras de telecomunicações. No cálculo entram todos os fundos setoriais mais o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

O Fistel incide também sobre os terminais de satélite. No Vsat do tamanho de uma pizza brotinho, a TFI é de R$ 201,12 mais 50% desse valor em taxa anual de fiscalização de funcionamento, destaca Morais. Já para um aparelho celular, o valor é de R$ 26,83.

"Mostramos que se reduzir o valor para a Vsat, tem um ganho tributário", diz ele. "Em dez anos, o ganho é de R$ 2 bilhões - a maior parte, R$ 1,4 bilhão, em termos de ICMS, mas também tem um pequeno ganho com Fistel de R$ 60 milhões." O estudo foi feito por ele em conjunto com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), vinculado ao Ministério da Economia.

De acordo com estudo da Consultoria Tendências, que integra a agenda legislativa 2018 do SindiTelebrasil, se houver redução dessas barreiras tributárias, os investimentos em M2M/IoT até 2025 têm potencial para alcançar R$ 206 bilhões, com crescimento estimado em dois pontos percentuais no Produto Interno Bruto (PIB).

Outro ponto da agenda é o compartilhamento de espectro - as faixas de frequência usadas pelas operadoras para implantação dos seus serviços. O tema é tratado no Projeto de Lei da Câmara (PLC) 79/2016, atualmente em trâmite no Senado.

O mercado secundário de espectro para telecomunicações é uma das mudanças propostas. Isso significa que qualquer empresa poderá sublocar a licença de uma operadora e construir sua própria rede privada.

A regulamentação atual não permite a uma empresa transacionar o uso do espectro. "Isso pode gerar uma ineficiência locativa do espectro, e devemos primar pela sua locação e eficiência, diz o presidente da Anatel.

Como aplicação prática da flexibilização do uso do espectro, Morais cita uma mina da companhia Vale com maquinário totalmente automatizado num polígono bem definido. Hoje, uma empresa de telecomunicações não pode ceder à Vale nesse polígono seu direito de uso de radiofrequência em caráter primário para que os tratores sejam operados remotamente. Se o PL for aprovado, esse mercado secundário será viabilizado.

"É fundamental ter esse mercado secundário", diz o presidente da Anatel. "As teles possuem licenças e vão poder negociar o uso da frequência. Isso não é permitido no Brasil mas funciona em outros países."

Na prática, uma empresa que tem o direito de explorar blocos de frequência de 10+10 megahertz, na faixa de 700 MHz (para 4G), em caráter nacional, terá flexibilidade para exploração desse espectro. Uma operadora de grande porte poderá vender seu direito para uma empresa menor local. "Isso gera mais negócios, permite que o mercado promova arranjos eficientes para locação de espectro. É uma questão importante para 5G", diz Morais, referindo-se à próxima geração de serviços móveis.

Todas as gerações de celular lidam com o melhor uso do espectro, afirma João Moura, diretor-executivo da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (TelComp). A entidade atende principalmente operadoras e prestadoras de serviços especializadas, regionais ou de menor porte, além de grandes companhias. Para ele, o compartilhamento no mercado secundário vai ganhar novo peso no ambiente de 5G.