O Estado de São Paulo, n. 46056, 22/11/2019. Metrópole, p. A16

 

Desmate em unidades protegidas sobe 84% e supera média de toda a Amazônia

André Borges

Giovana Girardi

22/11/2019

 

 

Ambiente. Destruição ocorreu mais em áreas federais, como as controladas pelo ICMBio, e estaduais e em terras indígenas, onde, por lei, não poderia ocorrer nenhuma retirada da floresta. Neste ano ainda houve aumento de cortes em polígonos com mais de 500 hectares

Jamanxim. Entre 36 áreas desmatadas com mais de mil hectares, 12 estão em unidades de conservação ou terra indígena

O desmatamento da Amazônia em áreas protegidas (unidades de conservação federais e estaduais) e em terras indígenas, onde, por lei, não poderia ocorrer retirada da floresta, foi ainda maior do que a média registrada em todo o bioma no último ano. Se forem consideradas somente as UCs federais, cuja fiscalização é de competência do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, a derrubada das árvores cresceu 84% entre agosto de 2018 e julho de 2019, se comparada com o volume dos 12 meses anteriores.

O desmate nas Unidades de Conservação (parques, florestas e reservas) como um todo teve alta de 35% entre agosto do ano passado e julho deste ano (saltando de 767 km² para 1.035 km²); já nas terras indígenas, o aumento foi de 65% (de 260,6 km² para 429,9 km²), segundo dados preliminares do sistema Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que mostram as taxas oficiais de desmatamento.

Houve 412 km² de corte raso dentro das florestas protegidas pelo governo federal, ante 223 km² do período anterior, conforme informações oficiais apuradas pelo Estado. O crescimento no ataque às unidades de conservação entre agosto de 2018 e julho de 2019 fez deste o pior período dos últimos 14 anos, só ficando atrás do volume registrado em 2005, quando 586 km² foram derrubados.

Considerando todas as UCs, a unidade mais comprometida foi a Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, gerida pelo Estado do Pará. Ela faz parte do mosaico da Terra do Meio, no entorno da BR-163. Foi naquela região que houve o Dia do Fogo, no começo de agosto, que ajudou a impulsionar as queimadas no bioma.

Dentro dessa APA ocorreu o maior polígono de desmatamento de toda a Amazônia: uma área de 4,5 mil hectares (45 km²) foi suprimida de uma vez, de acordo com imagens do Prodes. Houve ainda um outro corte de 3,2 mil hectares neste ano.

Mudança. A maior parte dos desmatamentos da Amazônia em geral ocorre em parcelas de até 50 hectares, estratégia que ajuda a driblar a fiscalização. Neste ano, porém, notou-se aumento de polígonos com mais de 500 hectares. Levantamento feito pelo site de jornalismo de dados Infoamazonia, compartilhado com o Estado, mostra que entre as 36 áreas desmatadas com mais de mil hectares em 2019 em toda a Amazônia, 12 estão em unidades de conservação ou terras indígenas – ao menos parcialmente. Dessas, seis estão na APA Triunfo do Xingu – e duas ocupam área da Estação Ecológica Terra do Meio. Há ainda uma na Terra Indígena Baú, que fica ao lado da Terra do Meio, e outras duas na Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, também na região.

Em outros pontos da Amazônia, chamam a atenção, segundo a Infoamazonia, um corte de 2,1 mil hectares no Parque Nacional dos Campos Amazônicos e um outro de 1,3 mil na Reserva Extrativista Rio Preto-Jacundá, em Rondônia. Entre as terras indígenas, a mais devastada foi a de Ituna/Itatá, na região de Altamira, no Pará. Foram tirados 8% (12 mil ha) dos 142,5 mil hectares. A gestão Jair Bolsonaro planeja formas de flexibilizar o manejo de terras indígenas.

Questionado, o Ministério do Meio Ambiente não se manifestou até as 21 horas de ontem.

Geral

9.726 km²

Foi o índice total de desmatamento na Amazônia, divulgado na segunda-feira, uma alta de 29,5%, maior taxa da década.

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Entorno da BR-163 é a área com maior desafio

22/11/2019

 

 

Secretário diz que abortou desmate maior; especialista cita Código Florestal e mudança em lei como facilitadores

Segundo o pesquisador Paulo Barreto, do Imazon, todo o entorno da BR-163 é fronteira de expansão da grilagem e da pecuária há alguns anos, com vários frigoríficos próximos que compram carne obtida de modo ilegal. Já o secretário de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, Mauro de Almeida, disse que as regiões de São Felix do Xingu, de Novo Progresso e de Altamira são os principais desafios para o combate ao desmatamento no Estado.

Segundo Almeida, após o corte de 4,5 mil hectares na APA Triunfo do Xingu, três pessoas foram presas. “Nós abortamos o problema nos 4,5 mil hectares, porque, na verdade, estavam contratados 20 mil hectares de desmatamento”, disse.

“APA é categoria de conservação branda, pois permite a permanência de algumas propriedades privadas dentro. E não há um plano de manejo para estimular a conservação com medidas especiais, como pagamento por serviços ambientais. A conservação dependeria de aplicar o Código Florestal e a Lei de Crimes Ambientais”, diz Barreto.

Para ele, houve uma diminuição na confiança sobre a aplicação da lei a partir da reforma do Código Florestal, em 2012, que anistiou alguns desmatadores, e com a aprovação de uma lei em 2017 pelo governo Temer que facilitou a regularização fundiária de terras da União ocupadas na Amazônia.

A justificativa era dar título de terra para os mais pobres e reparar injustiças históricas com pessoas que ocuparam a região, após o chamado do governo federal na década de 1970, e nunca tiveram a situação legalizada. Para ambientalistas, isso favoreceria grileiros. Estudo feito pelo pesquisador e publicado na revista Environmental Research Letters, em junho, estimou ganhos de até R$ 8 bilhões por grileiros a partir da lei. “Além disso, o mercado para carne continua bom, especialmente com aumento de exportações para China”, diz Barreto.

Fiscalização. Especialistas que acompanham a área ambiental ainda atribuem o crescimento do desmatamento na área a fatores como o enfraquecimento da fiscalização federal e a sinalização do governo de que pretende flexibilizar a exploração comercial de áreas hoje protegidas. Em 2018, o orçamento do ICMBio para proteger as florestas havia sido de R$ 23 milhões. Neste ano, esse orçamento diminuiu quase 50%, chegando a R$ 13,5 milhões.

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Cientista apontaa outro navio como suspeito de ter derramado óleo

Roberta Jansen

22/11/2019

 

 

Voyager I, de bandeira das Ilhas Marshall, navegou como navio fantasma, segundo análise da Ufal

Voyager 1. De 1º de julho a 13 de agosto, embarcação navegou com transponder desligado

Um estudo do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite (Lapis), da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), apresentado ontem em audiência na Câmara dos Deputados, em Brasília, aponta o navio Voyager I, de bandeira das Ilhas Marshall, como o principal suspeito pelo derramamento de óleo que atinge o Nordeste e o Espírito Santo. Desde 30 de agosto, 720 localidades foram afetadas.

Com base em diversas análises de imagens de satélite e dados de inteligência da Marine Traffic, o coordenador do Lapis, Humberto Barbosa, refutou a principal hipótese defendida pela Marinha: a de que o desastre teria sido provocado pelo navio grego Bouboulina. “Este (Voyager I) é o navio que a gente aponta como suspeito”, afirmou o pesquisador em apresentação a parlamentares da Comissão Externa sobre o derramamento do óleo. “Não estou dizendo que ele é o culpado. O Lapis não tem ferramenta criminal para dizer que o Voyager I é o culpado. Porém, baseado em evidências de satélite e informações da Marine Traffic, chegamos a essa conclusão.”

O Lapis concluiu que o Voyager I passou pela costa brasileira em julho com o transponder desligado, ou seja, como um navio fantasma. O cruzamento das informações de inteligência com as manchas de óleo captadas por satélite nos dias 19 e 24 de julho apontam para essa conclusão. “Nós estudamos as trajetórias de 111 navios cargueiros e nenhuma delas era compatível com as datas dos vazamentos, apenas a do Voyager.”

Lista. A Marinha informou que o Voyager I não está entre as cinco embarcações apontadas como principais suspeitas pelo derramamento de óleo (Maran Apollo, Maran Libra, Minerva Alexandra, Cap. Pembroke e Bouboulina). Ainda segundo a Marinha, as imagens apresentadas pelo Lapis não seriam de óleo, mas de algas.

Segundo as informações levantadas pelo Lapis, o navio costuma fazer o trajeto de um país asiático até a Venezuela, passando pela África do Sul. Normalmente, a embarcação navega com o transponder ligado, indicando sua localização ao longo do percurso. No entanto, entre 1.º de julho e 13 de agosto, a embarcação navegou com o transponder desligado, violando o direito marítimo internacional.

O acompanhamento via satélite mostra que o navio partiu de um país asiático em 1.º de julho. Quando passou pelo Oceano Atlântico, a embarcação seguiu um trajeto incomum e fez uma manobra que indicaria uma mudança de trajetória, justamente na altura do litoral do Nordeste. “O percurso mostra alteração na direção do navio, indicando comportamento suspeito ou grande problema mecânico”, disse Barbosa.

PERGUNTAS & RESPOSTAS

Empresa grega é investigada

Qual a origem do óleo?

A causa do derramamento de óleo ainda é desconhecida. Há 20 dias, a Polícia Federal deflagrou operação contra uma empresa suspeita. O navio Bouboulina, da empresa grega Delta Tankers, entrou na mira de autoridades, mas a petroleira nega irregularidades.

O que dizem especialistas?

Pesquisadores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e de uma organização americana, a Skytruth, afastam suspeitas sobre o Bouboulina. Segundo imagens de satélite analisadas pelos cientistas, não há relação entre a trajetória do navio e o derramamento.

Quais as outras suspeitas?

Análise da Ufal identificou outra embarcação suspeita, a Voyager I, navio-tanque de bandeira das Ilhas Marshall que teria desligado o transponder durante o trajeto.