O globo, n.31434, 30/08/2019. País, p. 06

 

Entrevista - Sydney Sanches 

Juliana Castro 

30/08/2019

 

 

O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sydney Sanches avalia que a decisão da Segunda Turma da Corte de anular a condenação do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine na Lava-Jato não tem previsão no Código Penal, “mas é uma construção que busca preservar o direito da ampla defesa”. Pelo entendimento do Supremo na terça-feira, dar o mesmo prazo para alegações finais a réus que fizeram delação premiada e aos que não são delatores fere o direito de defesa destes últimos. Sanches, que integrou a Corte entre 1984 e 2003, vê um momento de fragilidade da Lava-Jato na conjuntura atual.

A decisão da Segunda Turma faz sentido do ponto de vista técnico?

A lei processual diz que os prazos das alegações finais é o mesmo para todos os réus. A acusação tem o prazo dela, e a defesa dos réus tem o mesmo prazo em seguida. Não se faz distinção de um réu que é acusado por outro, o que acontece em ações comuns. Há processos sem delatores em que um réu põe a culpa no outro. Não foi ilegal o que foi feito pelo Sergio Moro (dar o mesmo prazo de alegações finais para réus delatores e não delatores).

Em face da lei de delação premiada e entendendo que os delatores não são só réus, mas acusadores, a Segunda Turma achou por bem que deveria se abrir um outro prazo para a defesa dos réus não delatores. É uma construção. Não é prevista na lei, mas uma solução encontrada para que a defesa não fique sacrificada. Não é uma aplicação pura e simples da lei, mas uma decisão para uma situação nova. É provável que tenha acontecido em todos os outros casos (o que ocorreu no processo de Bendine), mas é preciso saber se vai anular todos esses processos semelhantes. Se o STF entender que tem que preservar essa orientação nova, praticamente vai anular todos os julgamentos desses casos.

Como o senhor teria votado?

Eu teria aplicado o Código de Processo Penal como está. A lei tem que ser aplicada. Quem quiser, que mude a lei. Mas como eu votaria não importa agora.

O que pode acontecer daqui para a frente?

É preciso saber o que o plenário acha. O entendimento foi o de que defesa não pôde rebater o delator, mas, e se já debateu a questão no processo? Não se pode dizer que o réu não delator ficou indefeso. Tem que ver caso a caso, se houve prejuízo ou não à defesa. No caso do Bendine, não se examinou isso. Presumiu se o prejuízo porque foi ouvido no mesmo prazo. A pergunta é se houve prejuízo. Aí a construção até se justificaria.

Como o senhor avalia o momento atual da Lava-Jato?

A Lava-Jato está um pouco fragilizada. O juiz tem de ser imparcial. Quando há dúvidas, sempre há aquele risco de anulação de sentença. Mas isso sempre tem que ser avaliado caso acaso, se houve prejuízo ou não. Aqui loque conversaram( mensagens no Tele gram vazadas) realmente interferiu ou foi somente uma troca de opiniões? Em cada caso, é preciso verificar se houve prejuízo, se a comunicação entre eles repercutiu ou não nos processos. Agora, a conversa deve ser evitada porque o juiz tem que manter a isenção. Se ele dá instrução a um aparte e não dá à outra, como fica? Achoque a imagem do Moro ficou prejudicada, mas não totalmente. O que importa é o que ficou provado (nos processos), o fundamento da decisão. Várias sentenças foram confirmadas em segunda instância. Muitas penas foram até ampliadas.

E como vê a atuação do Supremo em relação à Lava-Jato? Haverá mudanças?

Tem que esperar a poeira baixar. Enquanto as coisas acontecem, é muita poeira. É cedo pra dizer.

Como o senhor viu os vazamentos das conversas dos procuradores e do então juiz Sergio Moro?

Realmente, foi um excesso do Moro e do Ministério Público. É uma coisa que podia ter sido evitada. O juiz não dá instruções ao MPF de como proceder, tem de falar nos autos. Mas, a meu ver, não se pode dizer: “Ah, porque houve isso está tudo nulo”. Precisa ver se influenciou nas provas colhidas no processo judicial. Não se pode jogar fora tudo o que foi feito, dizendo que se foi parcial. Se Moro estivesse em exercício, seria o caso de uma advertência. Mais do que isso, não.

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Lava-Jato: novo pedido para anular condenação

Carolina Brígido 

30/08/2019

 

 

O ex-diretor da Engevix Gerson de Mello Almada pediu ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF) a anulação de duas condenações na Lava-Jato contra ele com base na decisão tomada pela Segunda Turma. Na última terça-feira, o colegiado anulou a sentença do ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil Aldemir Bendine porque o então juiz Sergio Moro abriu prazo conjunto para todos os réus apresentarem alegações finais. Para os ministros do STF, o correto seria primeiro se manifestarem os réus delatores e, depois, os delatados.

O pedido de Almada não será julgado pelo relator da Lava-Jato, Edson Fachin, mas peloministro Ricardo Lewandowski. Isso porque a defesa de Almada fez um pedido de extensão do benefício no mesmo processo de Bendine. Como Fachin foi derrotado na votação de terça-feira, o relator para o caso passa a ser o primeiro a divergir do relator —no caso, Lewandowski.

Lewandowski poderá decidir o pedido sozinho, ou levar para a Segunda Turma, composta por cinco ministros do tribunal. Ele também poderá pedir para o caso ser encaminhado ao plenário, com votação de todos os 11 ministros. No pedido feito ao STF, Almada afirma que a situação dele é idêntica à de Bendine.

Na quarta-feira, o ministro Fachin encaminhou ao plenário do STF outro caso na mesma situação. Caberá ao presidente Dias Toffoli marca rada tapara o plenário proferira interpretação definitiva do STF sobre o tema.