O globo, n.31434, 30/08/2019. País, p. 07

 

Bolsonaro e Moro tentam mostrar conciliação 

Daniel Gullino 

Jussara Soares 

30/08/2019

 

 

Depois de desautorizações públicas do presidente Jair Bolsonaro ao ministro da Justiça, Sergio Moro, os dois passaram a trocar gentilezas na tentativa de dar uma aparência de normalidade à relação. Em evento ontem no Planalto, o presidente chamou o subordinado de “patrimônio nacional”, enquanto Moro atribuiu ao chefe um “mérito inegável” na redução de homicídios registrada nos primeiros meses de 2019.

Na Polícia Federal (PF), porém, a crise não é vista como resolvida. A declaração de Bolsonaro de que é ele quem manda na corporação e a possibilidade anunciada de trocar o diretor-geral, Maurício Valeixo, provocou a ameaça de uma debandada. Ainda há incerteza sobre a permanência de Valeixo. À GloboNews, Moro declarou que o diretor fica, mas que “as coisas eventualmente podem mudar”. Na PF, permanecem críticas à postura do ministro no episódio, pois esperava-se dele uma defesa enfática da instituição.

Valeixo vai viajar hoje com Moro, de acordo com a colunista do GLOBO Bela Megale. O delegado irá para João Pessoa no mesmo avião do ministro. Valeixo já estava com seu voo de carreira acertado, mas mudou os planos para viajar com Moro. Eles participarão da inauguração de uma ala na sede da PF da Paraíba.

A troca de afagos entre Bolsonaro e Moro aconteceu no lançamento do projeto “Em Frente, Brasil”, de combate a crimes violentos nas cidades com maiores índices de homicídios, organizado no Palácio do Planalto. Enquanto os outros dez ministros presentes desceram sozinhos a rampa que liga o terceiro e o segundo andares do Planalto, Moro apareceu por último, junto com Bolsonaro. Ainda fizeram uma parada no meio da descida, quando se abraçaram e posaram para fotos, sob aplausos.

— Se Deus quiser, vai dar certo esse plano piloto montado pelo Ministério da Justiça, tendo à frente Sergio Moro, que é um patrimônio nacional —disse Bolsonaro, em seu discurso.

O presidente agradeceu Moro por ter deixado a atividade de juiz para entrar em seu governo:

—Obrigado, Sergio Moro. Você abriu mão de 22 anos de magistratura não para entrar em uma aventura, mas sim na certeza de que todos nós juntos podemos, sim, fazer melhor para a nossa pátria e colocar o Brasil no lugar de destaque que ele merece estar.

O evento ontem teve a assinatura de convênios com cinco cidades, uma em cada região do país: Ananindeua (PA), Paulista (PE), Cariacica (ES), São José dos Pinhais (PR) e Goiânia (GO). A ideia é expandir para todo o país o programa, que prevê quatro eixos: levantamento de dados estatísticos sobre criminalidade, repressão a grupos criminosos, prevenção social e mecanismos de governança e gestão.

Apesar dos elogios, além da crise na PF há ainda outros pontos com capacidade de estremecer a relação entre Moro e o presidente. O ministro já defendeu que sejam feitos pelo menos oito vetos no projeto que regulamenta o abuso de autoridade, enquanto Bolsonaro ainda pesa a amplitude de sua decisão tendo em vista os efeitos que isso pode ter no Congresso.