O globo, n.31433, 29/08/2019. País, p. 08

 

Bolsonaro 'entre a cruz e a espada' sobre vetos ao abuso de autoridade 

Daniel Gullino 

Jussara Soares 

29/08/2019

 

 

A líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), afirmou ontem que o presidente Jair Bolsonaro disse estar “entre a cruz e a espada” na análise dos vetos do projeto que regulamenta o abuso de autoridade, para não desagradar nem o Congresso nem a população.

Joice entregou a Bolsonaro — ao lado dos líderes do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), e no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) — um manifesto pedindo o veto de dez pontos do projeto. O documento tem o apoio de entidades da área jurídica, cujos representantes também participaram da reunião, além de 53 deputados.

— Ao final, o presidente disse: “Olha, eu estou entre e cruz e a espada. Se eu vetar tudo, eu crio um problema com parte do Congresso, e obviamente a população vai aplaudir. Se eu não vetar nada, crio um problema com a população”. Então, ele está ponderando muito — relatou Joice, após a reunião.

CÁLCULO POLÍTICO

Segundo Joice, Bolsonaro está fazendo um cálculo político para definir quais pontos do projeto vetará:

—Ele não adiantou o que vai vetar, mas nós sabemos que ele vetará alguns pontos, e a torcida é para que ele possa vetar esses dez pontos. Mas, claro, tudo é uma costura política. A gente tem que fazer essa conta, porque o governo ainda tem, no mínimo, três anos e meio pela frente. Temos outros projetos para aprovar. Então, essa matemática política é o que o presidente está fazendo agora.

Já o Major Vitor Hugo tentou minimizar o desgaste de eventual derrubada dos vetos pelo Congresso:

— Não é constrangimento, são fases naturais do processo legislativo. Assim como a Câmara e o Senado aprovaram, agora é a vez do presidente fazer o seu juízo a respeito do projeto de lei que foi aprovado. A própria Constituição prevê a análise dos vetos. Não haverá constrangimento se parte dos vetos do presidente for derrubado, como já aconteceu, não só com nosso presidente, mas com vários.

Ele afirmou, no entanto, que a tendência é a manutenção dos vetos:

— A questão é que o que nós temos visto, até com o que houve nas ruas no final de semana (manifestações), e nós vemos na imprensa e vemos também dentro do Parlamento, em conversas com líderes, é que existe uma grande tendência de manutenção (dos vetos).

Segundo Joice e Vitor Hugo, Bolsonaro sinalizou que só tomará uma decisão no fim do prazo, em 5 de setembro. O único ponto que o presidente já adiantou que deve vetar é o que prevê condenação por submeter o preso ao uso de algemas quando não houver resistência à prisão.

Os trechos da lei mais criticados

> Possibilidade de perda do cargo, mandato ou função pública a partir da condenação.

> Condenação a partir da prisão em “manifesta desconformidade com as hipóteses legais”.

> Punição por constranger o preso, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência.

> Condenação por deixar de identificar-se ou identificar-se falsamente ao preso.

> Condenação por submeter o preso ao uso de algemas quando não houver resistência à prisão.

> Condenação por obtenção de prova por meio manifestamente ilícito.

> Condenação por induzir pessoa a praticar crime para capturá-la em flagrante delito.

> Punição por dar início à persecução penal, civil ou administrativa, sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente.

> Condenação por negar ao interessado ou advogado acesso aos autos.

> Condenação por violar direito ou prerrogativa de advogados.

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Fake news: Congresso derruba veto do Bolsonaro 

Gustavo Maia 

29/08/2019

 

 

O Congresso derrubou ontem o veto do presidente Jair Bolsonaro ao projeto de lei que cria o crime de denunciação caluniosa com finalidade eleitoral, com pena prevista de dois a oito anos de prisão, além de multa. A resolução de Bolsonaro foi rejeitada por deputados federais (326 votos a 84) e por senadores (48 a 6). A matéria seguirá agora para promulgação.

O texto foi aprovado em 24 de abril pelo Senado, depois de passar pela Câmara dos Deputados. Em 4 de junho, Bolsonaro publicou no Diário Oficial o veto ao dispositivo, justificando que a pena é “muito superior” à de conduta semelhante já tipificada no Código Eleitoral.

O texto determina como crime o ato de “dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, de investigação administrativa, de inquérito civil ou ação de improbidade administrativa, atribuindo a alguém a prática de crime ou ato infracional de que o sabe inocente, com finalidade eleitoral”.

Segundo Bolsonaro, o texto “viola o princípio da proporcionalidade entre o tipo penal” e a pena cominada. Já existe o crime de injúria eleitoral, que consiste em “injuriar alguém, na propaganda eleitoral”.

Na sessão conjunta do Congresso, parlamentares que se manifestaram sobre o veto foram favoráveis à manutenção do texto. Os contrários eram ligados ao governo e ao PSL.