O globo, n.31433, 29/08/2019. Sociedade, p. 26

 

Desafios para a (r)evolução do envelhecimento 

Matheus Rocha 

29/08/2019

 

 

Em 1940, nascer no Brasil significava viver, em média ,45 anos. Quase oito décadas se passaram e a expect no país, hoje, é de 76 anos, com perspectiva de seguir em alta. Essa transformação radical suscita a pergunta: como conciliar longevidade e bem-estar? Na última segunda-feira, personalidades de diferentes áreas se reuniram para debater esses desafios no seminário Viva a Longevidade, uma realização O GLOBO e Época em parceria com Bradesco Seguros.

O evento foi mediado pelo médico gerontólogo Alexandre Kalache. Ele, que passou 35 anos estudando e lecionando entre Rio de Janeiro, Londres, Oxford e Granada, é presidente da Aliança Global de Centros de Longevidade e presidente no Brasil do Centro Internacional da Longevidade. Ao abrir o seminário, Kalache afirmou que estamos vivendo atualmente uma revolução da longevidade:

— Quando nos imaginamos no dia do nosso aniversário de 85 anos, pensamos geralmente em uma noite de festa com a família, com amigos, ou até mesmo em uma viagem. Poucos se imaginam em um hospital geriátrico.

No evento, ajuíza Andréa Pachá destacou que vidas mais longas têm gerado novas dinâmicas sociais, como o processo em que idosos seve em obrigados a cuidar de outros idosos.Ela lembrou ter presenciado ocaso de uma senhora de 75 anos que vislumbrou a chance de descansara pó suma vida inteira dedicada à família, mas acabou tendo que cuidar da mãe de 97 anos:

—Foi muito importante ter visto isso para pensar na nossa capacidade de adiara vida. Ela planejou um futuro e, quando ele chegou, não podia viver o que havia imaginado.

Já o geriatra Daniel Azevedo alerto upara os riscos de confiarem medicamentos com supostas propriedades anti envelhecimento:

—A velhice é algo inexorável.Não será uma pílula mágica que vai muda risso.

O encontro incluiu ainda palestras da educadora financeira Ana Leoni, da atriz Bruna Lomb ardieu ma entrevista ao vivo coma atriz e apresentadora Cissa Guimarães. Confira aqui os destaques das mesas.

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Prolongamento da vida cria novos conflitos nos tribunais 

Mateus Campos 

29/08/2019

 

 

À frente da 4ª Vara de Órfãos e Sucessões do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Andréa Pachá percebeu de perto a evolução da longevidade. Para a juíza carioca, o fenômeno teve impacto direto nos tribunais, que passaram a mediar casos antes restritos às famílias.

— O envelhecimento era uma condição privada. As pessoas envelheciam, adoeciam e morriam cuidadas por seus familiares. Hoje não só as famílias se transformaram, como a velhice se transformou —disse.

A magistrada é autora do livro “Velhos são os outros” (ed. Intrínseca), em que traduziu para a ficção alguns dos conflitos que mediou. A partir dessa experiência, ela é capaz de sugerir uma série de medidas que podem ser tomadas por quem envelhece, a fim de preservar sua independência e seus desejos.

Segundo Andréa, fazer um planejamento sucessório é muito importante para evitar desentendimentos entre herdeiros. Outras medidas também podem ser avaliadas para garantir que as vontades dos idosos sejam respeitadas. Para isso, no entanto, é preciso romper antigos tabus.

— Nossa sociedade nega a morte, como se fosse um fato inexistente. É possível ter essa conversa, sentar com a família e estabelecer como será a administração do patrimônio. Doar o patrimônio ainda em vida e manter o usufruto, patrimonializar dinheiro e imóveis através de empresas, resolver questões tributárias —listou.

Um dos conflitos que mais preocupam a magistrada em relação ao envelhecimento envolvem curatelas exercidas pelos filhos quando os pais não têm mais capacidade de gerir seu patrimônio. Muitas vezes, viram disputas de espólios em vida.

—Se não há uma conversa sobre quem exercerá a função, o momento que deveria ser de serenidade passa a ser um dos piores já experimentados pelo idoso —disse.