O globo, n.31432, 28/08/2019. Sociedade, p. 28

 

Peru e Colômbia convocam países da Amazônia para frente comum

Fernando Eichenberg

Daniel Gullino

Eliane Oliveira 

28/08/2019

 

 

Os presidentes do Peru e da Colômbia anunciaram ontem que irão convocar uma reunião dos países amazônicos nos próximos dias para promover a proteção da Floresta Amazônica, no momento em que o Brasil registra um número recorde de queimadas. Até o fechamento desta edição, o governo brasileiro não havia se manifestado sobre o encontro.

Segundo o presidente colombiano, Iván Duque, a reunião deve ocorrer na cidade de Letícia, na Amazônia colombiana, no dia 6 de setembro.

— Vamos fazer uma convocação para que todos os países da Amazônia possam ter uma abordagem em comum e também para lançar um compromisso diante dessa realidade tão importante que não está recebendo a devida atenção —afirmou o presidente peruano, Martín Vizcarra, que estava com Duque na cidade peruana de Pucallpa para um encontro regional.

Vizcarra disse que o objetivo da reunião será evitar o desmatamento e buscar alternativas para que a floresta gere progresso e desenvolvimento para as comunidades.

Os incêndios não se limitam ao Brasil. Pelo menos 10 mil quilômetros quadrados estão queimando na Bolívia, perto de suas fronteiras com o Paraguai e o Brasil.

AJUDA DO G7 SÓ DEPOIS DE DESCULPAS

Ontem, depois de inicialmente ter rechaçado a oferta do G7 de US$ 20 milhões para o combate às queimadas, o presidente Jair Bolsonaro disse que só aceitará a oferta se o líder francês, Emmanuel Macron, voltar atrás em sua afirmação de que o brasileiro mentiu e desistir de discutir a internacionalização da floresta, como havia sinalizado anteontem.

— Primeiramente, o senhor Macron tem que retirar os insultos que faz à minha pessoa. Ele me chamou de mentiroso. Depois, pelas informações que eu tive, a nossa soberania está em aberto na Amazônia. Para conversar ou aceitar qualquer coisa com a França, que seja com as melhores intenções possíveis, ele vai ter que retirar essas palavras — disse Bolsonaro, na saída do Palácio da Alvorada, reforçando:

—Primeiro retira, depois oferece, daí eu respondo.

O presidente francês, por sua vez, voltou a defender ontem uma reflexão para a construção de um “novo direito internacional do meio ambiente”. Em discurso aos embaixadores franceses reunidos no Palácio do Eliseu, ele evocou a retomada das discussões em torno do Pacto Mundial do Meio Ambiente, germinado por Laurent Fabius durante sua presidência da COP 21, em 2015, que selou o Acordo de Paris.

—O quadro internacional muda. Quando se fala do Ártico, da Antártica, dos oceanos ou da Floresta Amazônica, falamos de um bem geográfico comum, inseparável da biodiversidade. É indispensável construir uma boa governança internacional. O que nós precisamos é construir este novo direito internacional do meio ambiente. Precisamos engajar com força a diplomacia francesa neste objetivo —disse.

O presidente francês afirmou ainda que a floresta é estratégica para os países da região, mas também para o “planeta inteiro” em termos de aquecimento global e biodiversidade.

— Sobre este tema, notei inquietudes e certas inconveniências de alguns dirigentes, considerando que a soberania era, no fundo, agressividade — disse Macron, referindo-se a Bolsonaro, mas sem citá-lo.

— O que é um erro. Nós somos um país soberano, e, em grandes acontecimentos, aceitamos com alegria e benevolência a solidariedade internacional. Mas há nove países na Floresta Amazônica, alguns deles aceitaram nossa ajuda, e faremos tudo para que Colômbia, Bolívia e regiões brasileiras que queiram recebê-la possam obtê-la e reflorestar rapidamente.

DOAÇÃO DO REINO UNIDO

Na noite de ontem, porém, o governo brasileiro confirmou que vai aceitar um aporte do Reino Unido no valor de 10 milhões de libras — o equivalente a cerca de R$ 51 milhões — para ajudar com a floresta. A oferta foi feita em um telefonema entre o secretário para assuntos externos daquele país, Dominic Raab, do Partido Conservador britânico, e o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.

Segundo uma fonte do governo brasileiro, Raab e Araújo conversaram sobre o meio ambiente e projetos de interesse dos dois países. Ambos não entraram em detalhes sobre essas atividades.

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Sem mais verbas, 80 mil bolsas do CNPQ no ínicio de setembro

Renata Mariz 

28/08/2019

 

 

Se nenhum recurso for liberado pelo governo para o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), as cerca de 80 mil bolsas de pesquisa mantidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado à pasta, serão suspensas a partir de setembro, em um verdadeiro apagão na ciência do país. O pagamento da folha de agosto ocorrerá por volta do quinto dia útil do mês de setembro.

“Após esse pagamento, se não houver recomposição orçamentária, não haverá mais recursos para pagamento das bolsas atualmente em curso”, afirmou o CNPq em nota ao GLOBO. O ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, vem afirmando publicamente que só tem recursos para pagar os incentivos “até setembro” e que está pedindo liberação de verba ao Ministério da Economia.

O CNPq é um das principais agências de pesquisa científica e tecnológica do país, ofertando bolsas a alunos da educação básica, graduação, pós-graduação, recém-doutores e pesquisadores experientes no país e no exterior. Além disso, o conselho investe em projetos de pesquisa e nas ações de divulgação científica e tecnológica no país. Essas ações, no entanto, também estão prejudicadas.

Cerca de 300 eventos científicos que já haviam sido aprovados tiveram o incentivo cancelado. Na linha de eventos com foco mundial, 14 projetos tinham sido referendados e esperavam o recurso federal. Há também outras duas linhas, eventos nacionais e regionais, com projetos aprovados.

Outra chamada do mesmo edital, que estava na fase de análise das propostas, foi cancelado. No total, o CNPq iria aportar cerca de R$ 15 milhões em divulgação científica. Neste ano, a agência cancelou a concessão de novas bolsas.