O globo, n.31431, 27/08/2019. Economia, p. 19

 

Declarações de Trump apontam trégua na disputa com a China 

João Sorima Neto 

27/08/2019

 

 

O alívio nos mercados globais ontem veio, surpreendentemente, das declarações do presidente Donald Trump. Depois de abalar as Bolsas na semana passada, o americano afirmou, na reunião do G-7, que Pequim “quer muito fazer um acordo”. Com isso, os principais índices de ações globais fecharam em alta — mas não no Brasil.

Na contramão do mercado externo, o Ibovespa, principal índice do mercado acionário brasileiro, encerrou em queda de 1,27% aos 96.429 pontos. Já o dólar comercial teve valorização de 0,29%, a R$ 4,1369, com um cenário de maior aversão ao risco no exterior, ainda reflexo da disputa comercial entre China e EUA. Na máxima do dia, a moeda americana chegou a ser negociada a R$ 4,158. Segundo operadores, estrangeiros foram os principais vendedores de ações ontem.

— A guerra comercial ainda terá novos capítulos, apesar da trégua deste início de semana. Na prática, como consequência, a China deve

crescer menos, o que afeta o Brasil, que vende commodities para o país asiático. Por isso, muitos investidores estrangeiros vendem suas posições em Bolsa e o Ibovespa recua — explica Pedro Galdi, analista da Mirae Asset Wealth Management.

Segundo Trump, a Casa Branca e Pequim “estão tendo discussões muito significativas”:

— Talvez eu esteja errado, mas estamos em uma posição mais firme agora para fechar um acordo, um acordo mais justo para todos.

Na noite de domingo, Trump disse que a China havia chamado os negociadores americanos para retomar as discussões. E disse que o presidente Xi Jinping é “um grande líder”.

BANCOS E PETROBRAS CAEM

Mais cedo, em Chongqing, o vice-premier chinês, Liu He, afirmou que o governo está disposto a “resolver o problema por meio de consultas e cooperação, com uma atitude tranquila”:

— Nós nos opomos firmemente à escalada da guerra comercial — afirmou. — Não é produtiva para a China, nem para os Estados Unidos, nem para o mundo.

Para Camila Abdelmalack, economista-chefe da CM Capital Markets, as declarações de Trump e do governo chinês trouxeram algum alívio para os mercados. No entanto, o sentimento de cautela permanece, já que o cenário de mudanças bruscas de posicionamento de ambos os lados se mostrou comum.

—Esse evento vai influenciar o mercado por um prazo indefinido, então sempre vai ter uma cautela. Por agora, está tudo tranquilo, mas amanhã as coisas podem mudar —disse Camila.

Na Europa, apenas Londres registrou queda, de 0,47%. Frankfurt avançou 0,40%, e Paris, 0,45%. Em Nova York, o índice Dow Jones teve alta de 1,05%, enquanto S&P 500 e Nasdaq subiram 1,10% e 1,32%, respectivamente.

No cenário doméstico, segundo analistas, pesou ainda a divulgação de pesquisas sobre a avaliação do governo Jair Bolsonaro.

As ações mais negociadas do Ibovespa fecharam em queda. As preferenciais (PN, sem direito a voto) do Bradesco recuaram 1,12%, a R$ 31,61, enquanto as PN do Itaú Unibanco perderam 0,24%, a R$ 33,07. Os papéis ordinários (ON, com voto) da Petrobras caíram 1,27%, a R$ 26,42, e os PN, 1,81%, a R$ 23,84.

Com relação ao mercado de câmbio, o presidente da Câmbio Store, José Marques da Costa, avalia que o dólar pode voltar a ser negociado abaixo de R$ 4 quando de fato houver alguma notícia mais positiva e concreta em relação a um possível acordo comercial entre chineses e americanos.

— Esses movimentos muito rápidos de alta ou de baixa da moeda americana são especulativos. Por isso, a tendência é que a divisa americana recue um pouco em relação ao real quando sair alguma notícia mais concreta sobre um possível entendimento entre EUA e China — explicou Marques da Costa.

PETRÓLEO RECUA 1%

No exterior, o Dollar spot, índice da Bloomberg que acompanha o desempenho da moeda americana frente a uma cesta de divisas, subia 0,44% no encerramento dos negócios no Brasil.

Em Londres, o barril do petróleo tipo Brent, referência internacional, recuou 1%, a US$ 58,70. Já o do tipo WTI, negociado em Nova York, teve queda de 0,98%, a US$ 53,64, de acordo com dados da agência Bloomberg.

Em meio à queda generalizada no Ibovespa, as ações ON da Cielo registraram a maior alta do índice, com ganho de 0,97% a R$ 7,31. A empresa anunciou ontem o Cielo Pay, um sistema para transações financeiras por meio de contas de pagamentos, um modelo similar ao de fintechs que vêm crescendo no país. O aplicativo gratuito, que começa a funcionar em 14 de outubro, permite que pequenos comerciantes e prestadores de serviço recebam pagamentos sem a necessidade das chamadas maquininhas.