Correio braziliense, n. 20516, 23/07/2019. Brasil, p. 5

 

Mudanças chegam ao Conad

Ingrid Soares

23/07/2019

 

 

Decreto retira os especialistas e os representantes civis do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) promoveu uma mudança na composição do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad) que, entre outras funções, aprova o Plano Nacional de Políticas sobre Drogas. Um decreto publicado ontem no Diário Oficial da União retirou todos os especialistas e representantes da sociedade civil do grupo, que será composto apenas por membros do governo e dos conselhos estaduais antidrogas. Com a mudança, foram reduzidos de 31 para 14 o número de cadeiras. Essa é mais uma das alterações em conselhos, que se tornaram rotina desde a posse do presidente. 
Criado em 2006, o Conad contava com a participação de um jurista indicado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); com um médico, pelo Conselho Federal de Medicina (CFM); um psicólogo, pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), um assistente social, pelo Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), um enfermeiro, pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), um cientista, pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e um educador indicado pela União Nacional dos Estudantes (UNE). Todas essas vagas foram excluídas.
Dos 14 integrantes do conselho, 12 serão membros com cargo de ministro ou indicados por ministério ou órgão federal, um integrante de conselho estadual e outro, de órgão estadual sobre drogas. O Conad é presidido pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro. A partir de agora, o ministro da Cidadania, Osmar Terra, passa a integrar o conselho. Segundo o decreto, é “vedada a divulgação de discussões em curso sem a prévia anuência do Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública e do Ministro de Estado da Cidadania”.
Para Paulo Aguiar, do Conselho Federal de Psicologia, até então titular no Conad, a medida representa um retrocesso. “O Conad trata de questão complexa, que agora vem sendo tratada com uma perspectiva mais ligada a crenças, se afastando do científico. A gente a baseia na ciência e no conhecimento produzido pelos representantes da sociedade civil. Esse conselho não é mais conselho, mas sim um grupo interministerial”, concluiu. Para ele, o decreto está conectado à PEC 108, que prevê a extinção dos conselhos profissionais. “Foi tudo arquitetado. É uma articulação, uma tentativa de diminuir a democracia nesse processo. O governo Bolsonaro se fecha em si, afastando a sociedade e construindo um projeto autoritário”, opina.
Em nota, a União Nacional dos Estudantes (UNE) lamentou a decisão. “Ampliar o debate sobre as drogas no Brasil é bandeira da UNE. É uma questão que deve ser tratada do ponto de vista da saúde pública, social e do tráfico. Excluir agentes que possam contribuir com esses conhecimentos é um retrocesso sem tamanho”, afirmou o presidente da UNE, Iago Montalvão.
O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) classificou a medida como ‘autoritária e antidemocrática, que impõe um modelo de combate ao uso de drogas violento e punitivo, que visa trancafiar o usuário em comunidades terapêuticas que, na maioria das vezes, se parecem com manicômios que violam direitos humanos fundamentais, como denunciado em outras ocasiões’.
Entre as recentes políticas sobre drogas do governo Jair Bolsonaro, está a sanção da lei aprovada pelo Congresso que autoriza a internação involuntária de dependentes químicos, sem a necessidade de autorização judicial. A medida gera divergências. O CFESS defende que o tratamento seja realizado no Sistema Único de Saúde (SUS). 
Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que a nova estrutura de funcionamento do Conad moderniza a interlocução com a sociedade e com os diversos órgãos públicos envolvidos nas políticas antidrogas e que a criação de um Grupo Consultivo permitirá a participação efetiva de seis especialistas na área de políticas sobre drogas. “Somos contra a liberalização das drogas”, escreveu, no Twitter, o presidente Jair Bolsonaro. “Há décadas a esquerda se infiltrou em nossas instituições e passou a promover sua ideologia travestida de posicionamentos técnicos. O decreto que assinei hoje extingue vagas para órgãos aparelhados no Conselho Nacional de Drogas e acaba com o viés ideológicos nas discussões”
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