O globo, n.31431, 27/08/2019. Sociedade, p. 23

 

Combate ás queimadas 

Jussara Soares 

Eliane Oliveira 

Daniel Gullino

Fernando Eichenberg

27/08/2019

 

 

Após o presidente da França, Emmanuel Macron, anunciar que os países do G7 dariam US$ 20 milhões (cerca de R$ 83 milhões) para combater as queimadas na Floresta Amazônica, o governo brasileiro rejeitou a oferta. Em nota, o Ministério das

Relações Exteriores (MRE) listou mecanismos já existentes, reivindicando que a França se “engaje” neles “com seriedade”, em vez de “lançar iniciativas redundantes, com montantes que ficam muito aquém dos seus compromissos internacionais, e com insinuações ambíguas quanto ao princípio da soberania nacional”.

O governo brasileiro cobrou ainda dos países ricos o cumprimento do Acordo de Paris. “Quando foi aprovado, em 2015, os países desenvolvidos comprometeram-se a mobilizar US$ 100 bilhões por ano em financiamento climático para os países em desenvolvimento até 2020, compromisso que não está sendo cumprido nem remotamente”, diz a nota do Itamaraty, lembrando que a finalidade dessas verbas é justamente reduzir o desmatamento e promover o reflorestamento.

Após o Palácio do Planalto confirmar a recusa da verba prometida pelo G7, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse no “Roda Viva”, da TV Cultura, que a ajuda seria “importante de ser aceita”:

—Onyx tem papel político. Eu sou ministro do Meio Ambiente e tenho outra visão.

Segundo o anúncio feito Jair Bolsonaro, presidente do Brasil por Macron, parte dos recursos estava vinculada a um trabalho com ONGs. Para o governo brasileiro, a política de defesa e preservação da região deve ficar restrita aos países que fazem parte do Tratado de Cooperação Amazônica (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela). A ideia é “encapsular” essas questões, para evitar a interferência externa.

Bolsonaro deu o tom em um pronunciamento logo após o anúncio de Macron, com quem vem trocando farpas nos últimos dias:

—Será que alguém ajuda alguém, a não ser uma pessoa pobre, né, sem retorno? Quem é que está de olho na Amazônia? O que eles querem lá?

Depois, no Twitter, o presidente afirmou que não vai aceitar que Macron faça “ataques descabidos e gratuitos à Amazônia” e acusou o francês de tratar o Brasil como uma “colônia ou uma terra de ninguém”. Também disse que a “soberania de qualquer país é o mínimo que se pode esperar num mundo civilizado”.

Em entrevista coletiva, ontem, o francês disse estar “em aberto” o debate sobre a internacionalização jurídica da floresta, ressalvando não ser o caso na iniciativa atual do grupo (leia mais na próxima página).

ALIANÇA COM OS EUA

O governo Bolsonaro avaliou que Macron fracassou ao tentar responsabilizar o Brasil no episódio, e fontes próximas à presidência trabalham em três frentes: aceitar apenas a ajuda dos vizinhos sul-americanos e de Israel; lançar um grupo de trabalho com os Estados Unidos, para que seja construída uma proposta de política ambiental conjunta; e adotar ações mais “drásticas”, para mitigar os efeitos dos incêndios no Norte do país. O presidente tem reunião marcada para a manhã de hoje com governadores dos estados que fazem parte da Amazônia Legal.

Quanto a Israel, o Brasil está desenvolvendo um mecanismo de auxílio mútuo e cooperação técnica em ações de resgate e combate a desastres naturais. O assunto foi tratado, no último sábado, por telefone, em conversa entre Bolsonaro e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.

No caso da nova proposta de política ambiental a ser delineada com os EUA,a ideia é construir ações “que respeitem a soberania dos Estados”. O tema será discutido no dia 10, em Washington, no âmbito do Primeiro Diálogo Estratégico Global entre EUA e Brasil, em reunião entre o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e o secretário de Estado americano, Mike Pompeo.