Correio braziliense, n. 20517, 24/07/2019. Política, p. 2

 

Presos suspeitos de invadir celular de Moro

Renato Souza

24/07/2019

 

 

Polícia Federal transfere para Brasília três homens e uma mulher acusados de crime cibernético contra o ministro e outras autoridades. Não há evidências de ligação deles com mensagens hackeadas do ex-juiz. Um dos detidos já foi condenado por posse ilegal de arma

Chegaram ontem a Brasília os quatro suspeitos de terem invadido o celular do ministro da Justiça, Sérgio Moro, e os de juízes federais e delegados. Eles foram presos pela Polícia Federal na capital paulista, em Araraquara e em Ribeirão Preto, no âmbito da Operação Spoofing, deflagrada a partir do inquérito aberto pela corporação para investigar o acesso não autorizado aos aparelhos de integrantes do Executivo e do Judiciário. Os nomes de todos detidos serão divulgados a partir do meio-dia de hoje, quando o sigilo do caso será levantado pela Justiça de Brasília.

A reportagem apurou, porém, que um dos suspeitos é Gustavo Henrique Elias Santos, 28 anos, preso em Araraquara. Ele é DJ e tinha sido detido anteriormente por porte ilegal de arma. A pena foi prestação de serviços à comunidade. O advogado dele, Ariovaldo Moreira, afirmou que o cliente não trabalha na área de tecnologia. “Ele é um cidadão comum. Não atua na área de informática”, disse o defensor.

Também foram detidos a mulher de Gustavo, Suelem Oliveira, e Walter Delgatti Neto, 30. A identidade do outro suspeito não tinha sido conhecida até o fechamento desta edição. Os mandados foram autorizados pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, e determinam a prisão preventiva.

Os suspeitos foram levados para a Superintendência da Polícia Federal, no Setor Policial Sul. Lá, foram ouvidos na noite de ontem e devem permanecer presos até que a Justiça averigue a participação deles nas invasões. A PF informou que, a partir de agora, “as investigações seguem para que sejam apuradas todas as circunstâncias dos crimes praticados”.

Os presos são acusados de integrar uma organização criminosa especializada em crimes cibernéticos. Durante a operação de ontem, as equipes policiais também cumpriram sete mandados de busca e apreensão. Foram recolhidos celulares, computadores, pen drives e outros equipamentos que podem ajudar na investigação.

De acordo com informações obtidas pela reportagem, não há evidências, até o momento, de que os detidos tenham ligação com a interceptação de conversas envolvendo Moro e procuradores da força-tarefa da Lava-Jato no Paraná. No entanto, as diligências apuram se eles têm participação no acesso irregular aos celulares do desembargador federal Abel Gomes, do Tribunal Regional da Federal (TRF) da 2ª Região; do juiz federal Flávio Lucas, da 18ª Vara Federal do Rio de Janeiro; e dos delegados federais Rafael Fernandes, de São Paulo, e Flávio Reis, de Campinas (SP).

Perícia

Em abril deste ano, de acordo com o Ministério da Justiça, Sérgio Moro identificou uma tentativa de invasão ao celular dele. O aparelho foi enviado para perícia, o que teria levado os agentes aos suspeitos. Após o episódio envolvendo o ministro, uma série de ações de criminosos virtuais foi registrada em diversos estados, contra juízes, procuradores, deputados e integrantes do Executivo.

Apesar da invasão, Moro disse que o suposto hacker não conseguiu acessar o conteúdo. Ao contrário de procuradores da Lava-Jato no Paraná, para os quais a invasão teria resultado na interceptação de conteúdos, como mensagens de texto, áudios, fotos, vídeos e documentos trocados por meio do aplicativo de conversa.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, também solicitou que a Polícia Federal investigue a invasão de um suposto hacker ao seu aparelho celular, que teria sido acessado remotamente na segunda-feira. Na tarde de ontem, ele ligou para Moro e o informou do caso. A investigação será conduzida em Brasília, e profissionais do Instituto Nacional de Criminalística vão compor a equipe destinada à análise do caso. A assessoria do Ministério da Economia informou, que, após o aparelho ser acessado, o invasor entrou em contato com jornalistas pelo aplicativo Telegram. Em nota, a pasta informou que “o ministro nunca teve conta nesse serviço (Telegram)” e pediu que seja desconsiderada “qualquer mensagem recebida do número antigo, que já será desativado”. A PF também investiga suposta invasão ao celular da deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), que teria ocorrido na madrugada de domingo.

Sinais

O diretor da área de Cyber Security da Kroll, em São Paulo, Dani Dilkin, destacou que existem diversos meios de invadir celulares. De acordo com ele, quando ocorrem, há sinais comuns que podem ser notados pelos usuários, a fim de impedir um prejuízo maior. “Eventualmente, se percebe que seu celular fica sem sinal por algumas horas. Pode ser minutos, mas eu pensaria em horas. Esse é o tempo que se leva para direcionar o chip. Em algumas ocorrências, ele transfere o número de volta ao usuário, faz tudo que precisa, sem que o dono da linha perceba, e devolve o número para o chip original”, relatou.

Dilkin afirmou que é necessário tomar medidas para evitar a interceptação de dados e que as pessoas devem se preocupar com a prevenção. “Em caso de invasão, a primeira coisa que eu faria seria contatar a operadora, a fim de informar o problema”, explicou. (Colaborou Jorge Vasconcellos)

Falsificação

De acordo com a PF, “Spoofing é um tipo de falsificação tecnológica que procura enganar uma rede ou uma pessoa fazendo-a acreditar que a fonte de uma informação é confiável quando, na realidade, não é”, explicou a corporação, em nota.

PF nega inquérito contra Greenwald

Em ofício enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, afirma que o jornalista Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil, não é alvo de nenhum inquérito aberto pela corporação. Valeixo atende uma determinação do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli.
O magistrado acolheu um pedido da Rede Sustentabilidade para que seja declarada inconstitucionalidade de qualquer investigação contra o profissional de imprensa.
O Intercept tem divulgado mensagens hackeadas supostamente envolvendo o então juiz Sérgio Moro e procuradores da Lava-Jato no Paraná.