O globo, n.31430, 26/08/2019. Negócios e Leilões, p. 23

 

O lixo gerando lucros 

26/08/2019

 

 

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei 12.305/ 2010, previa que todos os lixões existentes no país deveriam ser fechados até 2014 – uma forma de fazer valer o que está escrito na Constituição: o meio ambiente deve ser preservado para as presentes e futuras gerações. Mas não foi o que aconteceu. Cinco anos após o prazo previsto na lei, a maioria das cidades brasileiras continuam descartando lixo na natureza sem qualquer cuidado ou tratamento.

Mas, num trabalho que pode ser comparado ao das formiguinhas, algumas empresas brasileiras têm feito sua parte neste processo, transformando a coleta, a reciclagem e a destinação correta do lixo em bons negócios. De quebra, ajudam o meio ambiente e impulsionam o conceito de economia circular.

Um bom exemplo vem de Canoas, no Rio Grande do Sul, onde fica a sede da Sebanella, especializada na reciclagem de gesso, que passou a ser considerado um material reciclável em 2011. Logo após a alteração na lei, Sebastian Pica, com formação em comércio exterior e experiência na importação de cimento, pesquisou o mercado e descobriu que não havia, pelo menos na sua região, nenhuma iniciativa de reciclagem do resíduo.

A empresa foi licenciada em 2012, com investimentos de R$ 400 mil na construção de uma planta “precária”, que processava 300 toneladas de gesso por mês. Hoje, a área tem mais de 1,5 mil metros quadrados e chegará ao final do ano respondendo pelo processamento de 2 mil toneladas/mês.

A Sebanella tem 50 pontos de coletas no estado e outros 25 em Santa Catarina, e está em processo de licenciamento para obter mais dez pontos em cidades estratégicas da região, o que possibilitará chegar a 2,5 mil toneladas mensais. A cada dia, os galpões da empresa recebem entre 15 a 20 caminhões com capacidade para transportar até 60 toneladas de resíduos.

A totalidade do gesso moído é destinada a duas indústrias multinacionais cimenteiras, que misturam de 3% a 5% do resíduo na composição do cimento. Os planos para 2020 incluem a calcificação do gesso para ser reutilizado na construção civil. “Estamos negociando com prefeituras para criar ecopontos de coleta de sobras de gesso de obras residenciais”, diz Sebastian, acrescentando que a empresa faturou R$ 2, 76 milhões em 2018.

FOCO NO PLÁSTICO

Em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, fica a Pró Recicle, fundada em 2004, que é especializada na coleta, transporte e destinação final correta de plástico, papel e papelão, ferro e lixo não reciclável. O negócio exigiu R$ 3 milhões de investimentos e processava 600 toneladas de resíduos. Hoje, processa o dobro.

Comandada pelo socio fundador Rodrigo Faria, a empresa coleta material em mais de 300 indústrias do estado e vende os recicláveis para cerca de 25 parceiros comerciais. O plástico é o carro-chefe do negócio, respondendo por 30% do faturamento de R$ 1 milhão mensal. Selecionado e prensado em fardos de 300 e 500 Kg, o material é destinado à produção de sacos de lixo, embalagens de material de limpeza e a fábricas de fibra têxtil feita de garrafas pet. O PCV e os poliestirenos custam R$ 0,50 o quilo e os chamados plásticos de engenharia, R$ 4.

O crescimento da empresa ao longo de 2019 foi de 10%, bem abaixo do desempenho dos anos anteriores à crise, quando o incremento era de 20% . Rodrigo Faria disse que os planos de expansão estão suspensos até 2020, quando tem expectativa de que a economia vai, enfim, voltar a crescer. “Não dá para arriscar agora, tínhamos esperança de que este ano seria melhor e nada se concretizou. Alguns clientes reduziram a produção ou fecharam as portas. Estamos em compasso de espera”, conclui.