O Estado de São Paulo, n. 46040, 06/11/2019. Política, p. A8

 

PF pede a prisão de Dilma; Fachin Nega

Rafael Moraes Moura

06/11/2019

 

 

Inquérito apura compra de apoio do MDB pelo PT nas eleições presidenciais de 2014

Decisão. Ministro do STF, Fachin diz que não há provas de que haja obstrução da investigação

A Polícia Federal pediu ao relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, ministro Edson Fachin, a prisão temporária da presidente cassada Dilma Rousseff (PT), em inquérito que apura a suposta compra do apoio político do MDB em benefício do PT nas eleições presidenciais de 2014. O ministro negou a prisão, mas autorizou a tomada de depoimento da petista.

Fachin negou outros quatro pedidos de prisão solicitados pela PF neste mesmo inquérito: do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega (PT), dos ex-senadores Eunício Oliveira (MDB-CE) e Valdir Raupp (MDB-RO), e do ministro Vital do Rêgo Filho, do Tribunal de Contas da União (TCU). A investigação ainda cita os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Jader Barbalho (MDB-PA) e os governadores de Alagoas, Renan Filho (MDB), e do Pará, Helder Barbalho (MDB).

As suspeitas de compra de apoio político foram levantadas nas delações premiadas do executivo da J&F Ricardo Saud e do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Em depoimentos, Saud disse ter havido pagamento de cerca de R$ 40 milhões a senadores do MDB, a pedido do PT, para comprar o apoio político do partido na campanha de reeleição de Dilma, em 2014.

Ao requerer a prisão de Dilma e outras nove pessoas, a PF apontou o risco de os investigados interferirem na apuração dos fatos, caso fossem mantidos em liberdade, alegando ser “imprescindível” a decretação da prisão temporária. Fachin, no entanto, concluiu que não havia necessidade para a adoção de “medida extrema”. Ele cita que a própria Procuradoria-Geral da República (PGR) se posicionou contra a prisão por falta de evidências que os suspeitos pudessem “atrapalhar a execução das medidas de busca e apreensão”.

“Nada obstante, esteja satisfatoriamente demonstrada a plausibilidade das hipóteses investigativas levadas a efeito pela autoridade policial, a pretensão de restrição da liberdade dos investigados não se encontra provida da indicação de concretas condutas atentatórias às apurações que evidenciem a necessidade da medida extrema”, escreveu Fachin.

Suspeita. Para a PF, os elementos colhidos nas investigações “indicam a existência de um grupo criminoso” formado pela alta cúpula do PT e por senadores do MDB, que “mantiveram uma estrutura estável e organizada para a compra e venda do apoio político” para as eleições de 2014. De acordo com PF, a estrutura criminosa era chefiada por Dilma e operacionalizada por Mantega, com interlocução de Raupp e Renan Calheiros.

Em um relatório de 218 páginas anexado à investigação, a PF aponta elementos de que Dilma, Mantega e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeram crime de corrupção ativa por utilizarem uma parcela de R$ 35 milhões a partir de “negócios espúrios” firmados pelo grupo J&F com o BNDES e os fundos Petros e Funcef. “Contribuições realizadas pelo Grupo J&F a pedido de Guido Mantega do PT aos senadores do PMDB (...) para ‘comprar’ apoio político para a candidata Dilma Rousseff, totalizaram R$ 40,9 milhões”, diz o relatório.

Quanto aos senadores, a PF aponta que há “indicativos verossímeis” da prática de corrupção passiva, por meio da entrega de valores em dinheiro vivo e emissão de notas fraudulentas.

Defesas. Em nota, Dilma afirmou que o pedido de prisão é “absurdo”. Ela ataca o ministro da Justiça, Sérgio Moro, de perseguir adversários políticos. Já Moro afirmou que “não atua ou interfere nos inquéritos” da PF. Renan escreveu no Twitter que os “fatos ocorrem no momento em que a PGR renova o pedido de anulação da delação (da J&F)”. Anteontem, a PGR pediu ao Supremo extinção dos acordos de Joesley e Wesley Batista. Eunício e Mantega afirmaram que estão à disposição “para prestar os esclarecimentos”. Lula informou, por meio de advogados, que não praticou qualquer ilícito. Raupp, Braga e Vital do Rêgo não responderam.

Pedido negado

“Contribuições realizadas pelo Grupo J&F a pedido de Guido Mantega do PT aos senadores do PMDB (...) para ‘comprar’ apoio político para a candidata Dilma Rousseff, totalizaram R$ 40,9 milhões”.

Relatório da PF

“A pretensão de restrição da liberdade não se encontra provida da indicação de concretas condutas atentatórias às apurações que evidenciem a necessidade da medida extrema”

Edson Fachin

MINISTRO DO SUPREMO

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Em carta, senadores pedem para Toffoli manter segunda instância

Paulo Roberto Netto

06/11/2019

 

 

Texto assinado por 43 parlamentares diz ser ‘grave’ revisão do atual entendimento; Corte volta ao tema amanhã

Um grupo de senadores entregou ontem uma carta ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, pedindo que a Corte mantenha a prisão após condenação em segunda instância. O julgamento do Supremo sobre o tema será retomado amanhã e Toffoli pode ser o chamado voto de minerva, que deve desempatar o placar.

Até agora, quatro ministros votaram a favor da execução antecipada da pena e três contra. Se a prisão em segunda instância for revista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva poderá ser solto. Condenado no caso do triplex do Guarujá, Lula está preso em Curitiba desde abril do ano passado.

O ministro Marco Aurélio Melo, relator das três ações que estão em julgamento no STF – nenhuma delas relacionada a Lula – votou contra a prisão em segunda instância, sob o argumento de que ninguém pode ser condenado até o “trânsito em julgado”, quando todos os recursos jurídicos cheguem ao fim.

“Exigir trânsito em julgado após terceiro ou quarto graus de jurisdição, para então autorizar prisão do condenado, contraria a Constituição e coloca em descrédito a Justiça brasileira perante a população e instituições nacionais e estrangeiras”, escreveram 43 dos 81 senadores que assinaram a carta. “A lei deve valer para todos e, após a segunda instância, não mais se discute a materialidade do fato, nem existe mais produção de provas.”

Flávio. O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, não assinou a carta. Cobrado por bolsonaristas nas redes sociais, ele publicou ontem no Twitter um vídeo no qual defende a execução antecipada de pena. “Deixo aqui o registro público e oficial da minha posição favorável à prisão após condenação em segunda instância”, disse.

Flávio disse que enquanto senadores assinavam a lista de apoio ao tema, na semana passada, ele estava em Israel. “E nesta semana, como também não estarei em Brasília, eu gravo esse vídeo para consolidar minha posição”, afirmou o senador, que é alvo de investigações do Ministério Público.

Na Câmara, cerca de 50 deputados também subscreveram uma carta endereçada a Toffoli pedindo a manutenção da prisão após segunda instância, redigida por Capitão Augusto (PL-SP), presidente da Frente Parlamentar da Segurança.