Título: A polêmica vai às urnas
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 31/10/2012, Mundo, p. 24

Além de votar para presidente, eleitores americanos opinarão a respeito de vários temas delicados em 6 de novembro. Estados farão referendo sobre assuntos como a aprovação do casamento gay e leis contrárias à reforma da saúde proposta por Obama

Não é apenas para eleger o próximo presidente dos Estados Unidos que os eleitores americanos irão às urnas no dia 6 de novembro. Algumas das questões mais polêmicas no país estarão sob teste nas 174 proposições a serem apreciadas por moradores de 37 dos 50 estados. Segundo levantamento realizado pelo Instituto Iniciativa e Referendo (IRI, por sua sigla em inglês), ligado à Universidade do Sul da Califórnia, os principais temas em votação estão relacionados a saúde, casamento homossexual, legalização da maconha e impostos. As medidas são de iniciativa popular ou propostas dos legisladores locais e podem estabelecer novas regras ou alterar outras já vigentes, como é o caso da Califórnia, onde se decidirá sobre o fim da pena de morte (leia mais nesta página).

Segundo o IRI, as proposições deste ano superam em 15 as das eleições legislativas de 2010 e, em 21, as das presidenciais de 2008. O instituto explica que as questões mais polêmicas são todas de iniciativa popular, representando 50 das 174 existentes. Em geral, alguns temas se repetem nos estados. “Isso pode acontecer como resultado de uma campanha coordenada por um grupo com interesse no assunto ou de como os estados respondem, por exemplo, a uma decisão da Suprema Corte”, diz o relatório.

As medidas são todas estaduais e não há alterações em leis federais. Mesmo assim, a reforma da saúde proposta pelo presidente Barack Obama e confirmada pela Suprema Corte este ano, o Ato do Cuidado Acessível, mais conhecido como ‘Obamacare’, motivou controvérsias. Eleitores do Alabama, da Flórida, de Montana e do Wyoming dirão se aceitam ou não uma lei estadual que desobriga indivíduos e empresas a participar do sistema de saúde previsto na reforma nacional. O resultado pode ser visto como um termômetro de como o país está percebendo a mudança no setor.

Um tema recorrente há pelo menos uma década é o casamento entre pessoas do mesmo sexo. De acordo com o IRI, apesar da grande inclinação na opinião pública em favor da união homossexual, todas as vitórias sobre o tema são provenientes de leis ou decisões de cortes judiciais. Quando questionados nas urnas, os eleitores consistentemente optam por restringir o casamento à união entre um homem e uma mulher. No estado de Washington, por exemplo, os eleitores votarão sobre petição popular que rejeita a recém-criada lei autorizando o casamento gay.

Estratégias O assunto foi usado como estratégia pelo Partido Republicano nas eleições presidenciais de 2004. Preocupados com a abstenção, republicanos levaram o casamento gay para ser votado em referendos de alguns estados, como lembra o cientista político Patrick Flavin, da Universidade Baylor (Texas). Apático com o processo eleitoral em si, o eleitor se sentia motivado a manifestar sua opinião sobre o tema. Uma vez no local de votação, escolhia também o presidente. A estratégia funcionou, e os republicanos conseguiram uma participação maior que a esperada, ajudando a eleger George W. Bush.

Especialista no processo de iniciativas e referendos, o professor Floyd Feeney, da Escola de Direito da Universidade da Califórnia em Davis, lembrou que, nos anos 1980, os republicanos já haviam usado dessa prerrogativa no estado. Ao levar a questão das armas às urnas — tema que interessa especialmente os eleitores do partido —, os conservadores garantiram o governo estadual. Questionado se este ano alguns dos referendos estão sendo usados com esse propósito, ele disse acreditar que não, mas assinala que só será possível ter uma ideia clara a respeito após as eleições.

Na opinião de Feeney, os republicanos seguiram outra estratégia em 2012. Estados governados pelo partido aprovaram exigências de documentos com foto, como carteira de motorista e passaportes, para votar. A manobra é vista pelos democratas como restritiva, uma vez que muitos eleitores pobres, em sua maioria pró-Obama, não dispõem desses documentos. Uma das principais formas de identificação nos EUA, a Seguridade Social, não tem foto.

Entre os casos específicos dos estados, alguns chamam mais a atenção. No Alabama, a população decidirá se remove o trecho da Constituição estadual, escrita há 111 anos, que prevê segregação racial nas escolas. A medida não se aplica mais na prática, mas sua extinção foi recusada em referendos anteriores. Em Massachusetts, um estatuto a ser apreciado, chamado Morte com Dignidade, poderá autorizar o suicídio assistido a pacientes em estado terminal.

Filme pró-Obama Um filme que será exibido nos Estados Unidos pelo canal National Geographic em 4 de novembro, dois dias antes das eleições, está sendo apontado como uma verdadeira peça de campanha pró-Obama. Seal team six: The Raid on Osama bin Laden conta a história da missão no Paquistão que terminou com a morte do terrorista fundador da Al-Qaeda. Segundo o New York Times, uma edição recente incluiu imagens de Obama, o que poderia favorecer sua reeleição. O produtor Harvey Weinstein, apoiador dos democratas, diz que a inclusão de cenas buscou apenas tornar o filme mais atual.