O globo, n.31429, 25/08/2019. Mundo, p. 45

 

Mobilização 

Marco Grillo

Daniel Gullino

25/08/2019

 

 

Governo inicia ação contra o fogo em 6 estados, promete R$ 28 milhões e escala Força Nacional

Após reações internas e externas, com ameaça de boicote ao acordo entre Mercosul e União Europeia que está em construção, o governo brasileiro anunciou as primeiras medidas efetivas para combater os focos de incêndio que consomem a Floresta Amazônica. Duas aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB), com capacidade para transportar 12 mil litros de uma mistura de água e um produto químico que reduz as chamas, foram acionadas.

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, afirmou que há um “combinado” para que o Ministério da Economia desbloqueie R$ 28 milhões previstos no orçamento deste ano para o emprego das operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

Além de Exército, Marinha e Aeronáutica, 30 bombeiros da Força Nacional de Segurança irão hoje de Brasília para Porto Velho para participar da operação. As Forças Armadas têm um contingente de 43 mil homens na Amazônia Legal e o governo informou que não serão enviadas tropas de outras regiões. Estão previstas operações em seis estados.

AJUDA PARA O IBAMA

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, autorizou o envio de agentes da Força Nacional de Segurança para auxiliar os fiscais do Ibama no combate ao desmatamento no Pará e em Rondônia. Ainda não há definição do tamanho do efetivo que será deslocado. A medida deverá ser publicada amanhã. Todos os estados que vão contar com o apoio do governo federal registram mais queimadas neste mês na comparação com o período equivalente de 2018, exceto Roraima.

As primeiras ações coincidiram com um pedido de reunião urgente com o presidente Jair Bolsonaro feito pelo Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia Legal. Em documento, os governadores pedem “apoio material para enfrentamento efetivo ao desmatamento e incremento às ações de fiscalização de atividades legais”. Ao mesmo tempo, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, pediu ajuda dos estados:

— É importantíssima a participação dos estados. Enfrentamos até agora muita dificuldade com o suporte estadual. Já Bolsonaro afirmou que a situação na Amazônia “está indo para a normalidade” e disse que a média das queimadas está abaixo dos últimos anos.

— O que nós podemos fazer, estamos fazendo. A Amazônia é uma área maior do que toda a Europa. Se eu tivesse 10 milhões de pessoas, não conseguiria fazer prevenção. É lamentável o que acontece. Alguns incêndios são espontâneos, outros, pelo que parece, são criminosos — afirmou, ao sair do Palácio da Alvorada. O presidente já autorizou formalmente o emprego das tropas em quatro estados: Rondônia, Roraima, Pará e Tocantins.

Outros dois, Mato Grosso e Acre, devem ter o aval até amanhã. O decreto presidencial que instituiu a GLO determina que a permissão para o envio do efetivo será concedida, caso haja a solicitação dos governadores dos estados da Amazônia Legal.

O ministro da Defesa afirmou que aguarda a liberação, acertada em reunião com a equipe econômica na sexta-feira, dos R$ 28 milhões que estão contingenciados, destacando os gastos elevados que envolvem uma operação de GLO. Ele disse que a atuação na favela da Maré consumiu cerca de R$ 1 milhão por dia.

— Estou numa fase em que só acredito quando abrir o cofre e conferir — disse Azevedo e Silva. Já Ricardo Salles disse que o Fundo Amazônia tem um saldo de pouco mais de R$ 1 bilhão e que esses recursos estão sendo usados pela pasta do Meio Ambiente nas ações contra as queimadas. Alemanha e Noruega bloquearam os repasses para o Fundo recentemente após o governo lançar suspeitas sobre a destinação do dinheiro.

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Setor agro faz governo mudar de tom em 48 horas 

Manoel Ventura 

25/08/2019

 

 

A reação do governo à crise causada pelos incêndios na Amazônia foi costurada em 48 horas. As ações concretas para conter o fogo e o tom mais ameno usado pelo presidente Jair Bolsonaro estão acompanhados do temor de uma retaliação global contra produtos brasileiros, principalmente do agronegócio. Enquanto Bolsonaro culpava

ONGs, naturalizava a queimada e cobrava a responsabilidade de governadores, produtores rurais procuraram o governo para demonstrar preocupação com o impacto dos incêndios e da reação do Palácio do Planalto sobre as exportações brasileiras, especialmente as destinadas aos países europeus. Integrantes do governo iniciaram uma série de extensas reuniões, desde a última quarta-feira, para discutir uma saída para acrise.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, atuou diretamente na articulação para que a repercussão internacional não prejudique os produtores brasileiros. Ela levou o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, para uma reunião na Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), na quarta-feira. Naquele mesmo dia, o presidente Jair Bolsonaro havia acusado governadores da Região Norte de serem “coniventes” com o aumento de desmatamento e queimadas:

— Tem governo estadual que não fez nada, e pode fazer. Sob tensão, o encontro de Salles com os produtores rurais teve “clima bastante pesado”, segundo relato de fontes que participaram da reunião. Os agricultores foram direto ao assunto: estava cada vez mais real a possibilidade de uma retaliação generalizada contra produtos brasileiros, afetando as exportações e com efeitos em todo o mercado agrícola nacional. E cobraram uma resposta imediata de Salles.

O ministro, porém, adotou uma postura reativa, sem apresentação de medidas concretas, irritando os representantes do agronegócio. Na quinta-feira, o governo chegou à conclusão de que é preciso intensificar as medidas para melhorar a imagem do Brasil. Os diplomatas e adidos agrícolas no exterior ficaram encarregados de convencer a comunidade internacional que o país respeita e cumpre as normas ambientais.

Na sexta-feira, o governo anunciou medidas de combates às queimadas na Amazônia, e Bolsonaro foi à TV dizer que a “proteção da floresta é nosso dever”, mas afirmando que há incêndios em todo o mundo:

— Incêndios florestais existem em todo o mundo e isso não pode servir de pretexto para possíveis sanções internacionais.O Brasil continuarás endo, como foi até hoje, um país amigo de todos e responsável pela proteção da sua Floresta Amazônica.

O governo decidiu atuar para divulgar de maneira maciça as ações das Forças Armadas na Amazônia Legal. A primeira equipe que sairá hoje de Brasília para Porto Velho é formada por 30 bombeiros e 18 integrantes da comunicação das Forças Armadas.