Correio braziliense, n. 20518, 25/07/2019. Política, p. 3

 

Sérgio Moro celebra prisões

25/07/2019

 

 

Pelas redes sociais, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, parabenizou a operação da Polícia Federal que resultou na prisão de quatro suspeitos de invadirem o celular de autoridades. Na mensagem, ele destacou que os acusados já têm antecedentes criminais. “Parabenizo a Polícia Federal pela investigação do grupo de hackers, assim como o MPF (Ministério Público Federal) e a Justiça Federal. Pessoas com antecedentes criminais, envolvidas em várias espécies de crimes. Elas, a fonte de confiança daqueles que divulgaram as supostas mensagens obtidas por crime”, escreveu.

Moro se referiu ao site The Intercept Brasil, que desde 9 de julho publica trechos de supostos diálogos trocados com procuradores da Lava-Jato quando ele era juiz. As mensagens foram usadas para lançar suspeitas sobre a parcialidade do ministro quando atuou em casos da Lava-Jato na época em que era juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba.
O editor executivo do The Intercept, Leandro Demori, respondeu ao ministro, destacando que, em nenhum momento, revelou a fonte que repassou o conteúdo que está sendo publicado. “Nunca falamos sobre a fonte. Essa acusação de que esses supostos criminosos presos agora são nossa fonte fica por sua conta”, rebateu. “Não surpreende vindo de quem não respeita o sistema acusatório e se acha acima do bem e do mal. Em um país sério, o investigado seria você.”
Também pelo Twitter, Moro demonstrou preocupação com a quantidade de chamadas telefônicas que teriam sido feitas pelos hackers, na tentativa de clonar linhas telefônicas e acessar contas das vítimas em aplicativos de mensagem. “Leio, na decisão do juiz, a referência a 5.616 ligações efetuadas pelo grupo com o mesmo modus operandi e suspeitas, portanto, de serem hackeamentos. Meu terminal só recebeu três. Preocupante”, completou o ministro. (RS)

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

"Operação é questão de honra"

Rafaela Gonçalves

25/07/2019

 

 

 


O vice-presidente da Associação Nacional de Delegados da Polícia Federal, Luciano Soares Leiro, classificou como uma questão de honra a operação que resultou na prisão dos quatro suspeitos de hackear o celular do ministro Sérgio Moro e de outras autoridades. “A palavra certa é essa ousadia, porque se você tem um aparato de persecução penal e esse aparato é invadido por aqueles que deveriam estar sendo investigados, então isso é realmente uma questão de honra. E é por isso que nós estamos com todos os esforços possíveis para poder fazer essa apuração”, disse, em entrevista ao CB.Poder, uma parceira entre o Correio Braziliense e a TV Brasília.
Leiro também comentou sobre os supostos diálogos entre o então juiz Sérgio Moro e integrantes da Operação Lava-Jato. Ele disse não enxergar irregularidade nas mensagens. “Você deve evitar esse tipo de contato, mas é normal e acontece”, frisou. Segundo ele, as conversas não comprometem a validade da operação. “Tudo que foi investigado na Lava-Jato já passou por várias instâncias e todas referendaram em sua quase totalidade. A operação não é só o ministro Sérgio Moro e o procurador Dallagnol (Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa em Curitiba), é todo um arcabouço que está validado. Acredito muito nas provas que foram colhidas, porque foram ratificadas, são robustas e ninguém fabricou o que foi apurado.”
Sobre a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, de suspender todos os processos baseados em dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), compartilhados sem autorização judicial, Leiro considerou os danos. “Se essa decisão for extensiva, realmente o prejuízo é gigantesco, podendo colocar o Brasil como um paraíso para a lavagem de dinheiro do crime organizado. Sem o Coaf, vai se tornar muito difícil obter informações para identificar indícios de lavagem de dinheiro”, ressaltou. Ele defendeu que decisões com essa magnitude deveriam ser tomadas pelo plenário, por gerar insegurança jurídica.
Leiro também falou a respeito do clima de insatisfação dos policiais com a reforma da Previdência. “Foi-nos prometido, de certa forma, pelo presidente, um tratamento similar ao que foi feito com os militares e, até o último instante, nós tínhamos a informação de que a nossa aposentadoria ia tramitar com a dos militares”, contou. “Fomos surpreendidos com o envio da nossa junto à PEC como um todo. O Brasil continua a ter a pior aposentadoria policial do mundo, mesmo com as alterações que foram feitas.” 

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Vulnerabilidade está no usuário, não na tecnologia

 

 

Cláudia Dianni

25/07/2019

 



A vulnerabilidade que possibilitou o acesso aos diálogos trocados por procuradores da força-tarefa da Lava-Jato está na camada do usuário e não na do aplicativo Telegram, disse o advogado Frank Ned Santa Cruz, especialista em direito digital. Segundo ele, se houvesse algum tipo de vulnerabilidade na tecnologia de criptografia no aplicativo Telegram, o mercado underground (de hackers) já saberia.
Na avaliação dele, o mais provável é que um ou mais integrantes do grupo da Lava-Jato, que trocava mensagens, não tenha adotado medidas de segurança, por isso, teve o chip do celular clonado. Algo que pode ser evitado ao ativar a confirmação em duas etapas, disponível nas configurações dos próprios aplicativos, Telegram, WhatsApp ou Signal.
O especialista explicou que o mercado underground é frequentado pelos chamados white hats (chapéus brancos), hackers éticos que elaboram ou modificam softwares ou trabalham na invasão de sistemas para proteger seus clientes; e os black hats (chapéus pretos), também conhecidos como crackers, ou seja, aqueles que quebram sistemas de segurança com objetivos ilícitos.
“Há troca de vulnerabilidades no mercado underground, e ninguém sabe se está trocando com um white ou um black hat. As  trocas são técnicas”, contou. Segundo ele, uma vulnerabilidade recém-descoberta, conhecida como zero day, vale muito no mercado. “Se houvesse algo com relação à segurança do Telegram, todo mundo no meio já estaria sabendo. Quem descobre, vai ganhar dinheiro, vendendo para a empresa, ou vai apresentar em um congresso. Isso não ia ficar restrito ao Brasil”, afirmou ele, que atuou por 20 anos como hacker ético.
Santa Cruz avaliou que houve clonagem dos celulares, inclusive do ministro da Economia, Paulo Guedes, e da líder do governo na Câmara dos Deputados, Joice Hasselmann (PSL-PR). “Tanto que Moro disse ter recebido uma ligação de seu próprio número. Isso é típico de clonagem.”
De acordo com ele, diferentemente do hackeamento, não é preciso ter muito conhecimento técnico para clonar o chip de um celular e, a depender das configurações, é possível acessar o histórico de mensagens anteriores. Com relação à possível adulteração do conteúdo das mensagens, ele disse que a técnica é sofisticada, mas é possível editar as mensagens disponibilizadas. No entanto, segundo ressaltou, somente com perícia forense computacional é possível descobrir se houve adulteração.