Correio braziliense, n. 20519, 26/07/2019. Política, p. 3

 

Conteúdos serão enviados à Justiça

Renato Souza

26/07/2019

 

 

Depois de Sérgio Moro sugerir que dados hackeados seriam destruídos e causar controvérsia, Polícia Federal avisa que material seguirá para o Poder Judiciário

O destino do material apreendido com os hackers presos pela Polícia Federal foi alvo de controvérsia ontem. Em ligação para o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro Sérgio Moro falou em descarte dos diálogos. No entanto, a afirmação provocou reação imediata do Poder Judiciário e turbulência na internet. Diante dos ânimos exaltados, a Polícia Federal informou que a Justiça é que vai decidir o que deve ser feito do conteúdo.
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que apenas um juiz pode definir se as provas apreendidas devem ou não ser destruídas. Procurado pelo Correio, o ministro, que está no exterior, afirmou que a Justiça deve ser informada sobre o que foi recolhido durante as buscas realizadas pelas equipes policiais. “Se houve a produção de prova, eu entendo que isso deve ser submetido a quem é de direito, ou seja, o Poder Judiciário”, declarou.
De acordo com ele, mesmo envolvendo a invasão do celular de autoridades com foro, como o presidente da República, Jair Bolsonaro, “a princípio, o caso é jurisdição da primeira instância” da Justiça. “O presidente só tem foro se for processado. Neste caso, entendo eu, a princípio tudo deve ser submetido à primeira instância.”
Tranquilidade
O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Otávio Noronha, que também foi alvo dos ataques cibernéticos, afirmou que Moro lhe informou por telefone sobre o descarte do material. “O ministro do STJ disse que está tranquilo porque não tem nada a esconder e que pouco utilizava o Telegram”, diz a nota da Presidência do tribunal. “O ministro Moro informou, durante a ligação, que o material obtido vai ser descartado para não devassar a intimidade de ninguém. As investigações sobre o caso são de responsabilidade da Polícia Federal, a quem cabe responder sobre o caso.”
Segundo a PF, “as investigações que culminaram com a deflagração da Operação Spoofing não têm como objeto a análise das mensagens supostamente subtraídas de celulares invadidos”, mas que “o conteúdo de quaisquer mensagens que venham a ser localizadas no material apreendido será preservado, pois faz parte de diálogos privados, obtidos por meio ilegal”. Ainda de acordo com a corporação, “caberá à Justiça, em momento oportuno, definir o destino do material, sendo a destruição uma das opções”.

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Brecha para Lula

 

 

 

 

 

Bernardo Bittar

26/07/2019

 

 


A confissão de um dos hackers presos e o material apreendido  podem beneficiar o ex-presidente Lula no julgamento de um habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF). A possibilidade existe se a perícia atestar a veracidade dos supostos diálogos entre o então juiz Sérgio Moro e procuradores da Lava-Jato.
A defesa de Lula acusa Moro de parcialidade e cita o teor das reportagens do Intercept. O ex-ministro da Justiça e subprocurador-geral da República aposentado Eugênio Aragão disse que a possível ilegalidade do material divulgado não diminui o valor da prova. “Se as mensagens foram obtidas de forma criminosa, não servem para incriminar Moro e os procuradores, mas servem para ajudar aqueles que forem vítimas de fraude de processo, serve para defender”, explicou.
Para o ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, o caso ainda é “uma grande confusão”. “Não se sabe o alcance da atividade dos hackers. Não dá para ter a mínima ideia se uma coisa diz respeito a outra.” Ele disse que, pela primeira vez, vê o MP alegar a teoria da árvore com frutos envenenados em sua defesa. “Até então, só usava-se na defesa de réu processado. Agora, a matéria foi trazida pelo MP. É coisa de deixar boquiaberto quem atua no direito penal”, explicou. Para ele, o que falta é “alguém negar as alegações veiculadas até agora”.