O globo, n.31428, 24/08/2019. País, p. 12

 

Expulsão de Aécio do PSDB, em crise interna, pode parar na Justiça 

Guilherme Caetano

24/08/2019

 

 

Em meio à crise interna deflagrada após a filiação do deputado federal Alexandre Frota e da vitória do deputado federal Aécio Neves na executiva nacional, que votou pela sua manutenção no PSDB, o partido se prepara para enfrentar um processo que pode extrapolar a barreira partidária. Ao mesmo tempo em que um grupo de tucanos quer recorrer à instância maior da legenda para tentar evitar a entrada de Frota, expulso pelo PSL, outra preocupação é na esfera jurídica, uma vez que lideranças tucanas não descartam a judicialização do processo envolvendo Aécio.

Além disso, o fogo amigo domina as fileiras da sigla. Em entrevista recente, o presidente do PSDB em São Paulo, Fernando Alfredo, declarou, à “Folha de S.Paulo”, sem citar nomes, que “boa parte da turma que votou no Aécio pela não expulsão é a turma para quem ele distribuiu dinheiro”, e que o deputado mineiro prejudicou o partido, em especial o prefeito (paulista) Bruno Covas. Tanto Bruno como o governador de São Paulo, João Doria, vinham fazendo campanha pela saída do colega mineiro.

O prefeito paulista chegou a ser contundente: “Ou ele ou eu”. Doria, que defendia o afastamento de Aécio para que fizesse sua defesa fora da sigla, queixou-se após ver a executiva poupar o correligionário.

O governador de São Paulo afirmou por meio do Twitter que o “PSDB escolheu o lado errado”, e que a decisão do diretório nacional “não reflete o sentimento da opinião pública brasileira”.

Por mais que não esteja enterrado, o caso de Aécio só deve ter novos rumos caso ele seja condenado judicialmente. Grampeado pedindo R$ 2 milhões ao então dono da JBS, Joesley Batista, para que pudesse pagar despesas com sua defesa na Justiça, o então presidente do PSDB perdeu espaço no partido desde então.

O tucano mineiro é alvo de ao menos oito inquéritos eé réu por corrupção passiva e obstrução da Justiça. As investigações foram abertas após delações da Odebrecht, da JBS e do ex-senador petista Delcídio Amaral, a partir de desdobramentos da Lava-Jato. Aécio é réu no processo relativo ao episódio envolvendo Joesley. O deputado nega. Ele ainda não foi julgado.

Diretório paulista arquivou pedido que barrava filiação de Alexandre Frota

REGRAS

O departamento jurídico do PSDB afirmou que o código de ética do partido prevê expulsão de filiados quando há condenação pela Justiça — o que não é o caso do parlamentar mineiro —e que uma eventual “judicialização” do processo não cabe à legenda. Procurado pelo GLOBO, Bruno Covas não comentou se pretende deixar a legenda. O outro caso que balançou o PSDB na última semana foi o de Alexandre Frota. O diretório estadual do PSDB de São Paulo foi responsável por arquivar na última terça-feira o documento que pedia a impugnação da ficha do recém-filiado.

Os autores do documento, José Aníbal e Pedro Tobias, no entanto, protocolaram o mesmo pedido também à cúpula do partido. O colegiado pode decidir nos próximos dias se barra ou não a entrada do ex-deputado do PSL.

Partiu da boca de Frota o motivo pela reação tucana. No documento, Tobias e Aníbal afirmam que o PSDB não pode ser usado por pessoas que estejam “à margem de sua carga histórica e ideológica” e destacam ofensas proferidas por Frota recentemente, como a que ele se refere a Geraldo Alckmin, ex-governador de São Paulo e considerado uma liderança emblemática do PSDB, como um “porco” e um “rato de esgoto e acuado”.

Além do mais, alguns tucanos se incomodaram com a defesa que Frota fez da candidatura de Joice Hasselmann, líder do governo Bolsonaro no Congresso, à prefeitura de São Paulo horas antes de se filiar ao PSDB. Para eles, já fechado com a nova sigla, o deputado deveria ter endossado a candidatura de Bruno Covas, atual prefeito e candidato natural tucano à reeleição.

A cúpula nacional é presidida por Bruno Araújo, próximo ao governador João Doria, de quem partiu o convite para Frota se filiar à sigla. Aníbal não parece otimista em relação o que o diretório pode decidir. Respondeu com um “não sei, vamos ver” quando perguntado sobre as expectativas.

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Batalha de Doria cria desconforto no ninho tucano

Flávio Freire 

24/08/2019

 

 

A despeito da derrota sofrida na executiva nacional do PSDB, que decidiu manter o deputado Aécio Neves no partido, o governador João Doria continuará à frente de uma batalha silenciosa aos ouvidos do eleitor, mas que criará evidente desconforto em fileiras tucanas. Desse mal-estar provocado pela disputa interna, Doria terá pela frente caminhos —aparentemente —incontornáveis.

Não só na esfera do discurso político, que terá de ser modulado de acordo com a conveniência em manter ou não a proximidade com o presidente Jair Bolsonaro, dado seu interesse em disputar a próxima eleição presidencial, mas principalmente no ambiente partidário.

Duas possibilidades nesse sentido aparecem na proa do barco do governador. A primeira delas deriva de conversas recentes entre jovens tucanos e integrantes do MBL interessados em apostar na ideia de que um novo partido deve ser criado para que Doria possa seguir sem maiores problemas rumo a 2022.

Um dos líderes do movimento não esconde tais negociações, sob argumento de que há convergência na agenda parlamentar com o PSDB para, no futuro, lançar e apoiar candidatos do mesmo partido.

Outra frente a ser aberta também está na mesa de negociação, com PSDB, DEM e PSD discutindo uma possível fusão dos três partidos numa só sigla, tendo, entre seus objetivos, lançar um nome único para a sucessão de Bolsonaro.

Em meio a essas movimentações, Doria seguirá convicto de que o PSDB não deve dar espaço a quem é réu em processos criminais, daí a ferrenha disputa com Aécio, seu novo algoz.

O governador pretende fazer dessa bandeira — repetindo o discurso da última eleição —para encorpar sua candidatura ao Palácio do Planalto. Tanto que, em sua defesa na derrota contra Aécio, evocou os 13 milhões de votos da última eleição, subestimando as 34 pessoas que decidiram apoiar o deputado mineiro dentro do partido.

Enquanto não assume qualquer uma das principais possibilidades à vista —saída do PSDB ou a fusão da legenda com outros partidos —Doria trabalha para rechear seu partido com integrantes do PSL. Os louros pela criação do mais novo tucano Alexandre Frota recaem exclusivamente sobre o governador, que vem sondando outros parlamentares do partido do presidente, mesmo sob olhares tortos da velha guarda do partido.