Caso Queiroz. Ministério Público realiza busca e apreensão em endereços ligados a Flávio, a Fabrício Queiroz e a Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente da República

Mandados. Agentes do MP cumpriram 24 medidas judiciais no Rio e em Resende um ano e meio após início do inquérito

Três semanas após o Supremo Tribunal Federal liberar a investigação sobre uma suspeita de “rachadinha” no antigo gabinete do senador Flávio Bolsonaro (sem partidoRJ) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, o Ministério Público Estadual (MPRJ) fez ontem, pela primeira vez, uma operação ostensiva para procurar provas sobre eventuais crimes de lavagem de dinheiro e peculato neste caso. Foram cumpridos 24 mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Flávio, a seu ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz e a familiares de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro.

Instaurado em julho de 2018, o inquérito corre sob sigilo e apura se funcionários do gabinete de Flávio devolviam parte do salário. Em dezembro daquele ano, o Estado revelou que um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) encontrou movimentações atípicas nas contas bancárias de Queiroz, por onde passou R$ 1,2 milhão, entre saques e depósitos. A troca de informações entre o Coaf e o MP-RJ fez a ação ser paralisada por quatro meses por decisão tomada pelo presidente do Supremo, Dias Toffoli, em julho. Até então, a Justiça havia autorizado quebras de sigilo bancário e fiscal de 86 pessoas e nove empresas.

Ontem, agentes do MP estiveram em endereços ligados a 12 desses alvos, entre eles três pessoas que também atuaram no antigo gabinete de Bolsonaro na Câmara dos Deputados: seu ex-sogro José Procópio Valle; sua ex-cunhada Andrea Siqueira Valle e uma prima da sua exmulher, Juliana Vargas.

O caso Queiroz gerou desgaste para Bolsonaro, eleito presidente com o discurso de combate à corrupção, também presente no manifesto do partido que pretende criar, o Aliança pelo Brasil. Flávio é o primeiro-vice-presidente do Aliança.

No fim da tarde de ontem, o senador visitou o pai no Palácio da Alvorada. Ao longo da investigação, Bolsonaro defendeu o filho e declarou que o objetivo do processo era atingilo. Ontem, no entanto, ele não deu nenhuma declaração sobre o assunto para a imprensa. O tema também não teria sido tratado durante almoço com representantes dos três Poderes no Planalto, segundo presentes. “Foi só um bate-papo informal”, disse Toffoli.

Defensor de Flávio, o advogado Frederick Wassef afirmou que o MP não vai encontrar “nada de ilegal” na investigação. A defesa de Queiroz se disse surpresa com a medida de busca e apreensão .

Depósitos. Relatório feito pelo MP para justificar os pedidos de busca e apreensão afirma que Queiroz recebeu R$ 2 milhões em centenas de depósitos e transferências feitos por 13 assessores do gabinete de Flávio ao longo de 11 anos. Os promotores também descobriram que parentes de Ana Cristina Valle, ex-mulher de Bolsonaro, sacavam em espécie mais de 90% do que recebiam de salário como assessores de Flávio na Assembleia Legislativa. A maior parte deles vive em Resende, a cerca de 160 quilômetros do Rio. Embora tenham trabalhado em gabinetes da família Bolsonaro no Rio e no Distrito Federal, alguns desses familiares de Ana Cristina nem chegaram a pedir crachá funcional, de acordo com a Promotoria.

Chocolate. Além dos endereços ligados a parentes de Ana Cristina e ex-assessores do gabinete de Flávio entre 2003 e 2018, os promotores também cumpriram no início da manhã um mandado de busca em uma franquia de uma marca de chocolates que tem o senador como sócio. Os agentes arrombaram a porta para entrar na loja, localizada no shopping Via Parque, na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, que estava fechado. Quando os funcionários chegaram para trabalhar, foram surpreendidos com os investigadores já dentro da loja.

Os procuradores foram atrás de relatórios contábeis do estabelecimento. A intenção é cruzar dados da receita da loja para confirmar se o montante arrecadado coincide com o volume de vendas. O mesmo motivo levou o Ministério Público do Rio ao escritório que faz a contabilidade da franquia.

A investigação apura suspeita de “rachadinha” no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio. A prática consiste na devolução de parte do salário do servidor ao parlamentar.

Instaurado em julho de 2018, o inquérito sigiloso investiga se funcionários do gabinete de Flávio devolviam parte do salário. Em dezembro daquele ano, o Estado revelou que Coaf encontrou movimentações atípicas de R$ 1,2 milhão nas contas de Queiroz.

No mês passado, o STF autorizou o compartilhamento de dados da Receita com MP e PF, sem necessidade de autorização judicial. E foi derrubada liminar de Dias Toffoli que beneficiou Flávio e suspendeu 935 ações.

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Advogado de senador nega ‘rachadinha’ e diz que houve ‘ilegalidades’ no cumprimento de mandados de busca

O advogado Frederick Wassef, defensor do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), disse ontem que não teme os resultados da nova incursão do Ministério Público do Rio contra seu cliente. A investigação mira suposto esquema de “rachadinha” no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, quando ele era deputado estadual.

“O Flávio está surpreso, mas zero de preocupação. Como eu também. Nada de ilegal vão encontrar, como não encontraram na quebra do sigilo bancário e fiscal”, disse Wassef.

Conforme o advogado, “jamais existiu esquema de rachadinha” no antigo gabinete do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro. “Invadiram a empresa do meu cliente, mas certamente não vão encontrar nada, simplesmente porque não existe nada que o comprometa. Vão pegar documentos, informações do dia a dia de uma empresa de chocolates, nada mais”, afirmou, sugerindo “ilegalidades e arbitrariedades” nas buscas numa franquia de chocolates da qual Flávio é sócio. “Arrombaram a porta, pelo que sei, um absurdo. Imagine o estrago que isso causa, clientes assustados, temerosos de comprar alguma coisa.”

A defesa de Fabrício Queiroz se disse surpresa com a medida de busca e apreensão em endereços do ex-assessor de Flávio. Em nota, o advogado Paulo Klein classificou a operação como “absolutamente desnecessária”, já que seu cliente “sempre colaborou com as investigações”. “Ademais, surpreende que, mesmo o MP reconhecendo que o juízo de primeira instância seria incompetente para processar e julgar qualquer pedido relacionado ao ex-deputado, o tenha feito e obtido a referida decisão.”

‘Estrago’

“Arrombaram a porta, pelo que sei, um absurdo. Imagine o estrago que isso causa, clientes assustados, temerosos de comprar.”

Frederick Wassef

ADVOGADO DE FLÁVIO BOLSONARO