O Estado de São Paulo, n. 46082, 18/12/2019. Economia, p. B3

 

Entrevista - Maria Cristina Peduzzi: 'Verde Amarelo não é mais emprego com menos direito'

Idiana Tomazelli

Murilo Rodrigues Alves

18/12/2019

 

 

Para primeira mulher à frente do TST, programa não interfere na legislação; ela sugere mais tempo de licença-paternidade    

Foco. Licença-maternidade influencia diferença salarial entre gêneros, diz Maria Cristina

‘Verde Amarelo não é mais emprego com menos direito’

Maria Cristina Peduzzi, presidente eleita do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

A presidente eleita do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Maria Cristina Peduzzi, disse que vê o novo programa de emprego do governo, batizado de Verde Amarelo, como política temporária para a geração de vagas formais a jovens, não uma iniciativa que reduza direitos. “Eu não diria que isso signifique mais emprego, menos direitos”, afirmou a ministra ao Estado, lembrando ter advogado para o jornal na Corte por 20 anos.

Primeira mulher eleita presidente do TST, Maria Cristina defendeu que a última barreira para que homens e mulheres tenham tratamento equânime no mercado de trabalho é a licença depois do nascimento dos filhos. Ela sugeriu que, assim como é permitido em outros países, o tempo de afastamento dos pais seja maior para que as mães não sejam preteridas em promoções.

Qual sua análise sobre o programa Verde Amarelo?

Eu não posso me manifestar sobre constitucionalidade, porque amanhã eu posso ter de julgar. Até porque essa medida provisória nem foi ainda aprovada, não é a definitiva. Mas eu vi a medida provisória como, primeiro, uma disciplina temporária, com um objetivo específico de movimentar o trabalho do jovem, até como uma forma de estimular aprendizagem do jovem que ainda está cursando o ensino superior. Segundo, ela só tem vigência por três anos. Não interfere no que está estabilizado, ela está querendo uma injeção, digamos, para o jovem ingressar de forma temporária no mercado e, com isso, até se capacitar amanhã para outras funções.

Um mote do próprio governo que vem sendo repetido é: o trabalhador precisa escolher entre ter mais direitos ou mais empregos. A sra. entende o novo programa nessa perspectiva?

Então, eu não diria que isso significa mais emprego, menos direitos. Não. Ele não interfere na legislação permanente, na legislação que disciplina o contrato regular, que é via de regra por prazo indeterminado. Até o contrato de experiência visa a continuidade por princípio. Esse programa nasceu com o objetivo bem claro.

Há uma crítica de o programa cria duas espécies de trabalhadores: uns com menos direitos do que os outros. A sra. concorda com essa distinção?

A igualdade significa tratar igual os iguais e, no que houver desigualdade, cria disciplina jurídica diversa. No que eu identifiquei não é um contrato igual ao contrato base por prazo indeterminado. Ele foi construído como uma política pública e o Poder Judiciário, no momento próprio, haverá de examinar esses aspectos.

Houve avanços das mulheres no mercado de trabalho, mas ainda há diferença de salários e de tratamento. Qual é o desafio?

Eu diria que a igualdade substancial, eu só falo na área do trabalho, só será efetivada no momento em que tivermos, no plano da Previdência, e eu me refiro aí à licença-maternidade, um sistema igualitário com o do homem. Na Alemanha, já existe há muitos anos um estímulo para a licença-paternidade, em condição melhor do que a maternidade. Há possibilidade de opção, em vez de a mãe se afastar, o pai se afasta. Temos isso na Alemanha, na Escandinávia, até de uma certa forma em Portugal, modalidades de incentivar o pleno acesso da mulher ao mercado de trabalho, sem distinções.

Eles dividiriam o afastamento?

Exatamente. Falando genericamente, são mecanismos que não só estimulam a divisão do descanso para esse fim como também a remuneração. Quando o homem se afasta, a remuneração é maior do que quando a mulher se afasta.

Por que seria difícil de implementar essa política no Brasil?

Porque é muito custosa. Não depende só da lei.

A sra. acha que a diferença salarial no setor privado vem do fator licença-maternidade?

Identifico esse aspecto como sendo (o causador), ao menos no campo do trabalho. Costuma-se dizer que ‘os cargos de direção são muitas vezes ocupados por homens’. Pode ser uma questão cronológica, ou pode ser uma questão até de opção. Nós não sabemos. Eu digo que não vejo mais essa discriminação, quer ao acesso, quer à promoção, quer ao acesso em cargos de chefia, de direção, pelo fato de serem mulheres. O que vejo é que, quando se trata de jovens que podem engravidar, se afastar, pode haver preferência. Mas não pelo fato de ser mulher. A igualdade está se implementando.

O IBGE mostrou que as mulheres ganhavam 79,5% do salário dos homens em 2018. O fator licença-maternidade é o que está por trás dessa diferença?

Sempre há ainda um resquício histórico e cultural, não há dúvida. Por mais evoluídos que sejamos, ainda esse resquício cultural pode se revelar. É o que se chama de machismo. Pode até haver, não vou negar que exista, que pode existir.

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Orçamento define salário mínimo de R$ 1.031 em 2020

Daniel Weterman

Idiana Tomazelli

18/12/2019

 

 

O Congresso aprovou ontem o Orçamento de 2020 com a previsão de salário mínimo em R$ 1.031. O reajuste de 3,31% só leva em conta a previsão de inflação deste ano, sem aumento real, em relação ao valor atual de R$ 998.

O valor definitivo do salário mínimo, no entanto, ainda precisa ser fixado pelo governo, já que a política de valorização, em vigor desde 2015, não terá efeitos em 2020.

O Orçamento da União detalha todos os gastos a serem realizados pelo governo ao longo do ano. Também traz uma estimativa de quanto a União vai arrecadar (em sua maior parte, em impostos e contribuições). Nenhum gasto público pode ser realizado sem que esteja previsto no Orçamento.

O Orçamento de 2020 foi fixado em R$ 3,687 trilhões, dos quais R$ 917,1 bilhões ficarão reservados para o refinanciamento da dívida pública. Para investimentos, a previsão é de R$ 121,5 bilhões. A proposta foi elaborada considerando a meta fiscal de um déficit primário (ou seja, despesas maiores que receitas) de R$ 124,1 bilhões no próximo ano.

Emergencial. O Orçamento aprovado no Congresso considera uma economia de R$ 6 bilhões para a União em 2020 com a redução de custos prevista na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) emergencial. A PEC prevê gatilhos como a redução de salários e jornada de trabalho em 25% quando a União descumprir a regra de ouro - que proíbe o governo de contratar dívida para bancar despesas correntes, como salários e benefícios.

O cálculo leva em conta que a PEC estará promulgada em junho do ano que vem, ou seja, representa a metade da economia projetada pelo governo em um ano porque as regras só estariam válidas em seis meses de 2020.

Com base nisso, o relator ampliou a destinação de recursos para algumas áreas indicadas por parlamentares. Caso a PEC não seja aprovada, as transferências dependerão da aprovação de um crédito extra no Orçamento.

Emendas. Congressistas negociaram até o último momento recursos para as bases eleitorais. Tudo para garantir dinheiro para obras e projetos em 2020, ano de eleições municipais. Deputados e senadores indicaram individualmente um total de R$ 9,469 bilhões em emendas.

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BC vê economia com 'tração' e prega cautela para juros

Fabrício de Castro

Eduardo Rodrigues

18/12/2019

 

 

Ata da reunião do Copom diz que expansão da atividade e do crédito pode levar à ‘pressão altista da inflação’

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central afirmou que a economia brasileira “ganhou tração” e que “o atual estágio do ciclo econômico recomenda cautela na condução da política monetária”.

A avaliação consta de ata divulgada ontem referente à última reunião do comitê – realizada na semana passada, e que terminou com a redução da taxa básica de juro (a Selic) para 4,5% ao ano. Este é o menor patamar histórico do indicador.

Segundo o comitê – formado pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, e pelos oito dirigentes da instituição –, o último trimestre deste ano deve apresentar aceleração da atividade, reforçada pela liberação dos recursos do FGTS e PIS/Pasep. “O cenário básico do Copom supõe que o ritmo de crescimento subjacente da economia, que exclui os efeitos de estímulos temporários, será gradual”, diz a ata.

Ainda de acordo com o documento, o BC considera a possibilidade de a ociosidade na economia brasileira – traduzida por máquinas paradas na indústria e desemprego – cair mais rapidamente do que o previsto, na esteira da expansão da atividade e do crédito. Com isso, na visão do BC, poderia surgir uma “pressão altista na inflação”.

Para este ano, a meta central de inflação é de 4,25%, podendo oscilar de 2,75% a 5,75%. Para 2020, o objetivo central é de 4% – com oscilação de 2,5% a 5,5%.

Em função do cenário de retomada da atividade e choque de preços, economistas do mercado financeiro ainda divergem sobre os próximos passos da política de juros do Banco Central.

“De um lado, há as projeções confortáveis para inflação e, por outro, uma preocupação de que a atividade possa se acelerar mais rápido que o previsto”, afirmou o economista Luis Bento, da Rio Bravo Investimentos, ao comentar a ata. “O BC deixou aberto o espaço para corte da Selic no ano que vem, mas conseguiu se posicionar bem no sentido de ser dependente dos dados até a próxima reunião”, acrescentou.

Até por ter promovido cortes sucessivos nos últimos meses, o BC optou, desta vez, por não se comprometer com nova redução no próximo encontro do Copom, marcado para fevereiro.