O globo, n.31424, 20/08/2019. Economia, p. 17

 

Saque do FGTS beneficiará mais Norte e Nordeste 

Geralda Doca 

20/08/2019

 

 

A decisão do governo de liberar os saques das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) no valor de até R$ 500 beneficia as famílias mais pobres, sobretudo das regiões Nordeste e Norte, de acordo com estudo da Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia. O levantamento considera o montante de dívidas inscritas no Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), o custo da cesta básica e a renda mensal média dos trabalhadores formais e informais.

Pelo estudo, 37,3% dos brasileiros que estão com o nome negativado têm dívidas de até R$ 500. A Região Nordeste lidera o ranking dos devedores até esse patamar, com 44,1%, seguida pelo Norte, com 41,6%. A SPE avalia que o dinheiro poderá ser usado para limpar o nome junto às instituições financeiras, de modo a evitar o aumento da dívida e abrir margem para o consumo.

ALCANCE MENOR

O saque dessa parcela do FGTS também é relevante para as pessoas que trabalham ou desejam trabalhar e têm uma renda mensal de até R$ 500. Cerca de 30% da população brasileira estão nessa situação,sendo queno Nordeste a média sobe para 48% e no Norte, para 43%. O valora ser sacado representa pouco mais de 20% da renda média dessas duas regiões. O levantamento mostra também os R$ 500 são suficientes para comprar acesta básica de uma família de quatro pessoas por um mês em todo o país.

Ao todo, serão beneficiados 96 milhões de trabalhadores —46,3 % da população brasileira — sendo 15,6 milhões no Nordeste e 5,2 milhões no Norte. Em São Paulo, são 28 milhões, e em Minas Gerais, 10 milhões. No Rio há 9 milhões de cotistas, oque equivale a 52,7% da população doestado.

Para a equipe econômica, é importante levar em consideração a situação das famílias mais vulneráveis de cada região, não o volume de saques. Moradores do Norte e Nordeste enfrentam maior restrição orçamentária, o que dificulta a compra mensal de itens da cesta básica e o pagamento das dívidas em atraso. Nessas duas regiões, o presidente Jair Bolsonaro teve pior desempenho nas eleições de 2018.

Contudo, segundo integrantes do Conselho Curador do FGTS, uma análise do perfil das contas do Fundo aponta que a medida provisória que autorizou os saques pode não ter o alcance esperado, pois mais de 80% delas têm saldo médio em torno de R$ 100, inferior ao limite autorizado pelo governo. Apenas 8,71% dos devedores inscritos no SPC têm dívida de até R$ 100. A maior parte dos trabalhadores vai sacar os recursos, mas a quantia pode não ser suficiente para pagar dívidas ou garantir um mês de cesta básica.

RECURSOS ‘SOBRANDO’

Os estudos realizados pela equipe econômica não foram baseados no valor médio do saldo das contas. Segundo o secretário de Politica Econômica, Adolfo Sachsida, o governo cogitou autorizar o saque em valor superior ou um determinado percentual da conta, mas optou por definir um valor nominal de até R$ 500 para beneficiar um maior número de pessoas. Cerca de 80% dos cotistas do FGTS têm saldos até esse valor. A estimativa é que a MP coloque nas mãos dos trabalhadores R$ 40 bilhões, entre setembro deste ano e março de 2020.

Sachsida destacou que esses recursos estavam “sobrando” no FGTS, mal alocados, e que era melhor esse dinheiro ir para seus donos. Liberar uma quantia maior poderia comprometer os recursos para habitação, saneamento e infraestrutura, setores financiados pelo FGTS, afirmou o secretário.

— O trabalhador saberá melhor o que deve fazer com o dinheiro. É aconselhável pagar dívidas atrasadas —afirmou Sachsida.

A MP recebeu 134 emendas, sendo que a maior parte delas prevê aumentar o valor do saque para valores que chegam a R$ 3 mil por conta. O argumento é que o teto de R$ 500 é baixo e terá impacto reduzido na economia. Uma delas, apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), propõe elevar para R$ 1 mil, devido ao fato de o salário mínimo estar, atualmente, em R$ 998. Ele cita ainda o valor da dívida média inscrita no SPC em julho, de R$ 3.247,39.

A comissão especial do Congresso Nacional que vai analisar a matéria será instalada amanhã, quando serão designados o relator da MP e o presidente do colegiado.