O Estado de São Paulo, n. 46077, 13/12/2019. Política, p. A10

 

Sob pressão, relator propõe reduzir fundo para R$ 2 bi

Renato Onofre

13/12/2019

 

 

Domingos Neto defendeu R$ 3,8 bi para bancar gastos de campanha no ano que vem, mas recua diante do risco de veto de Bolsonaro    

‘Acordo’. Relator Domingos Neto diz que está conversando com líderes sobre valor menor

 O relator do Orçamento no Congresso, deputado Domingos Neto (PSD-CE), tenta convencer líderes de partidos da Câmara a abandonar a ideia de engordar a quantia destinada a campanhas eleitorais no ano que vem e aceitar os R$ 2 bilhões propostos pelo governo. O recuo ocorre após a sinalização do presidente Jair Bolsonaro de que pode vetar um valor maior, deixando candidatos a prefeito e a vereador sem recursos públicos do fundo eleitoral em 2020.

A Comissão Mista do Orçamento, formada por deputados e senadores, aprovou na semana passada relatório de Domingos Neto que prevê R$ 3,8 bilhões para o fundo usado para financiar as campanhas eleitorais. Este valor ainda precisa passar pelo plenário, em votação marcada para o dia 17.

Na terça-feira passada, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), se reuniu com dirigentes de partidos na Câmara e levou uma proposta de baixar o valor do fundo para o ano que vem para R$ 2,5 bilhões, com o compromisso de que, assim, Bolsonaro não vetaria. Pouco após a negociação ser noticiada pelo Estado, o presidente foi ao Twitter dizer que não havia tratado do assunto nem “enviado recado” ao Congresso.

“Estou trabalhando junto aos líderes para convencer a manter os R$ 2 bilhões propostos pelo governo. É preciso construir consenso e acordo”, afirmou Domingos Neto. A lógica do deputado é de que mais vale ter a garantia de que os partidos terão algum dinheiro para as campanhas do que correr o risco de aprovar os R$ 3,8 bilhões e, depois, caso Bolsonaro vete, ficarem sem o que foi proposto pelo governo.

A disputa do ano que vem será a primeira eleição municipal abastecida majoritariamente com recursos públicos. As contribuições de pessoas físicas são permitidas, mas limitadas a 10% da renda do doador no ano anterior.

Resistência. Líderes partidários ainda estão reticentes em relação ao acordo – parte deles se sentiu enganada pelo governo. Na reunião de terça, Bezerra Coelho deu a entender que falava em nome do presidente quando propôs a redução para R$ 2,5 bilhões.

Após a negativa do presidente no Twitter, os dirigentes voltaram a se reunir com o líder do governo do Senado para tentar entender o que havia acontecido. Bezerra Coelho afirmou a eles que o acordo havia sido negociado com a equipe de articulação política do Palácio do Planalto, mas que Bolsonaro ligou na noite de terça, após a reunião, avisando que vetaria a proposta de R$ 2,5 bilhões levada pelo próprio líder do governo.

Anteontem, num evento na Confederação Nacional da Indústria (CNI), em Brasília, Bolsonaro se manifestou sobre o assunto e criticou o valor proposto pelo relator. “Vamos supor que passe o fundão de R$ 3,8 bilhões. Quanto caberá ao meu futuro partido (Aliança pelo Brasil)? Não sabe? Parabéns, é zero”, afirmou o presidente.

O aumento do fundo eleitoral para R$ 3,8 bilhões foi incluído por Domingos Neto na proposta orçamentária após um pedido assinado por presidentes de 13 partidos. A lista tinha assinaturas de integrantes do PP, MDB, PTB, PT, PSL, PL, PSD, PSB, Republicanos, PSDB, PDT, DEM e Solidariedade. Juntos, esses partidos representam 430 dos 513 deputados e 61 dos 81 senadores.

O grupo agora está dividido: parte já admite recuar e aceitar os R$ 2 bilhões, mas outros defendem aprovar o valor maior e tentar reunir maioria na Câmara e no Senado para derrubar um eventual veto de Bolsonaro.

O fundo eleitoral se tornou a principal fonte de recursos de campanhas após a decisão do Supremo tribunal Federal, de 2015, de proibir a doação empresarial. Em 2018, o fundo destinou R$ 1,7 bilhão a candidatos.

'Diversidade'. Parlamentares favoráveis ao aumento alegam que a disputa do ano que vem, quando os eleitores irão às urnas para escolher prefeitos e vereadores, demandará muito mais recursos por envolver candidatos nas 5.568 cidades do País.

“Hoje, o fundo eleitoral é responsável por um Congresso mais diverso, com representantes indígenas, pessoas com deficiência, professoras e jovens que vieram de periferias e interiores do País. É por causa desse novo sistema que teremos mais mulheres prefeitas e vereadoras. Sem ele, elegeríamos somente pessoas que têm muito dinheiro para financiar campanhas”, afirmou Domingos Neto na semana passada, após receber críticas nas redes sociais pelo aumento que propôs.

Vaivém

R$ 1,7 bi

foi o valor recebido pelos partidos nas eleições de 2018.

R$ 3,7 bi

foi o valor do fundo proposto em julho pelo Congresso para 2020.

R$ 2 bi

foi o valor proposto pelo governo Jair Bolsonaro para o fundo.

R$ 3,8 bi

foi o valor proposto pelo relator do Orçamento no Congresso.

R$ 2 bi

é o valor do fundo proposto agora pelo relator do Orçamento. 

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Bolsonaro pode vetar pontos do pacote anticrime, diz Moro

Breno Pires

13/12/2019

 

 

Contrário à criação do juiz de garantia e a mudanças nas prisões preventivas, ministro vai discutir assunto com presidente 

Balanço. Moro apresentou as ações deste ano do ministério

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, afirmou ontem que trechos do pacote anticrime, aprovado pelo Congresso anteontem, podem ser vetados pelo presidente Jair Bolsonaro, mas não citou quais pontos. Segundo o Estado apurou, o ministro deve defender os vetos à criação da figura do juiz de garantia e às alterações nas regras para a aplicação de prisões preventivas.

Os dois itens não faziam parte do pacote apresentado pelo ministro, em fevereiro, ao Congresso, e foram incluídos pelo grupo de trabalho da Câmara dos Deputados que analisou as propostas de Moro e do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. Outro trecho que foi incluído e será analisado é o que modifica algumas regras de acordos de colaboração premiada.

“O presidente vai analisar a possibilidade de sancionar integralmente ou vetar parcialmente. Mas, talvez, haja alguns vetos. Isso vai ser discutido com o presidente da República”, disse Moro, ao fim de um evento de apresentação de balanço anual dos trabalhos de todas as secretarias do Ministério da Justiça.

A criação do chamado juiz de garantia prevê que o julgador responsável por determinar prisões provisórias ou quebras de sigilo no início de investigações não seja o mesmo que vai julgar o caso no final. A medida é vista como uma reação a Moro, que teve sua imparcialidade questionada – quando era juiz da Lava Jato na primeira instância – após divulgação de mensagens hackeadas atribuídas a ele e a integrantes da força-tarefa da operação em Curitiba. A expectativa entre parlamentares próLava Jato é de que esse item seja vetado e que a oposição não consiga maioria para derrubar a decisão presidencial.

A aprovação do pacote no Congresso foi um dos feitos destacados pelo ministro em sua apresentação ontem, assim como a queda nos índices de violência. “A partir do momento que a lei for sancionada, fará diferença na segurança pública do País”, disse Moro.

‘Potencial’. O ministro elogiou ainda a “rapidez” dos congressistas na análise do pacote. “Nosso desejo era que fosse decidido antes, mas não deixa de ser alvissareiro que tenha sido decidido no fim deste ano, porque abre um horizonte mais promissor para o próximo ano no âmbito da Justiça e da Segurança Pública. Acreditamos que essas medidas têm grande potencial para reforçar a segurança pública, reduzindo a criminalidade no País. Vai ser ótimo começar próximo ano com esses instrumentos à disposição para que possamos trabalhar mais e mais, e melhor, na área da segurança pública”, afirmou.

Para o ministro, a impunidade em casos de crimes de morte é ainda mais grave que crimes de corrupção. “Repudiamos todos os crimes como corrupção e roubos armados, mas o crime mais grave é o de sangue, homicídio ou feminicídio”, disse.

Nesse contexto, Moro citou a aprovação da proposta que prevê a prisão imediata de condenados em tribunais do júri em primeira instância quando a pena for maior a 15 anos. “A partir de agora, quem for condenado pelo júri segue para a prisão e não fica em liberdade”, disse o ministro da Justiça.

Avaliação

“O presidente vai analisar a possibilidade de sancionar integralmente ou vetar parcialmente. Mas, talvez, haja alguns vetos. Isso vai ser discutido.”

Sérgio Moro

MINISTRO DA JUSTIÇA