O Estado de São Paulo, n. 46068, 04/12/2019. Política, p. A10

 

Turma do Supremo torna Renan réu na Operação Lava Jato

Rafael Moraes Moura

04/12/2019

 

 

Senador do MDB é acusado de receber propina por meio de doação eleitoral ‘disfarçada’; é a primeira vez que ele é alvo de ação penal   

Defesa. Para Renan, acusação da Procuradoria-Geral não se sustenta por ‘falta de provas’

O senador Renan Calheiros (MDB-AL) se tornou réu pela primeira vez na Lava Jato pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Por 3 votos a 2, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou ontem denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o emedebista. Renan ainda é investigado em outros nove inquéritos na Corte.

A acusação formal acolhida ontem foi apresentada em agosto de 2017, pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. De acordo com a denúncia, Renan e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado acertaram pagamento de propina, por meio de doações “disfarçadas” para diretórios do MDB no Tocantins e em Aracaju em 2008 e 2010. A Procuradoria afirmou que Renan procurou Machado para negociar propina em troca de apoio político para mantê-lo na Transpetro. Machado comandou a subsidiária da Petrobrás entre 2003 a 2014.

As propinas teriam sido quitadas por meio de doações oficiais feitas por uma empresa de engenharia ao diretório do MDB no Tocantins em 2010. De acordo com a Procuradoria, a NM Engenharia depositou R$ 150 mil nas contas do partido. O pagamento da propina via doação oficial foi uma forma de lavar o dinheiro, dissimulando sua real natureza e origem, segundo a Procuradoria.

Prevaleceu no julgamento o entendimento do relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin, que votou semana passada pelo recebimento parcial da denúncia – apenas no que diz respeito aos fatos ocorridos no Tocantins. Em relação aos outros episódios, Fachin rejeitou a denúncia.

“Esse comportamento constitui gravíssima ofensa à legislação penal da República. Agentes da República, valendo-se de doações a partido, conferem aparência de legitimidade a recursos financeiros manchados pela nota da delituosidade”, disse o decano do STF, Celso de Mello.

Para a ministra Cármen Lúcia, “há uma série de dados” que levam a um conjunto de provas “mínimo”, o que justifica a abertura da ação penal. Entre os documentos destacados pela ministra estão comprovantes de depósitos e extratos telefônicos. Celso e Cármen acompanharam Fachin, formando maioria pelo recebimento da denúncia.

Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram pela rejeição da denúncia, mas acabaram vencidos. “É um corta e cola sem nenhum nexo. A denúncia não descreve a conduta do acusado e não aponta elementos concretos de prova. Nenhuma prova. Nenhuma mensagem. Nada”, afirmou Gilmar. “É um tipo de crime espiritual, uma situação constrangedora.”

Para Lewandowski, a Procuradoria não conseguiu reunir na denúncia “elementos seguros” que justificassem a abertura de uma ação penal.

Renan já havia sido colocado no banco dos réus pelo Supremo, mas não na Lava Jato, por peculato. O parlamentar foi acusado de desvios de recursos públicos de verba indenizatória do Senado por meio da contratação de uma empresa locadora de veículos em 2005. No ano passado, foi absolvido pela Segunda Turma do STF.

‘Falsa’. Renan afirmou ontem que a denúncia da Procuradoria é “falsa” e será arquivada “por absoluta falta de provas”. Para o senador, trata-se da “criminalização” da doação legal ao diretório e sobre a qual ele não teve nenhuma responsabilidade.

As defesas de Sérgio Machado e da NM Engenharia e o diretório do MDB no Tocantins não responderam.

 ‘Delituosidade’

“Esse comportamento constitui gravíssima ofensa à legislação penal. Agentes da República, valendo-se de doações a partido, conferem aparência de legitimidade a recursos manchados pela nota da delituosidade.”

Celso de Mello

DECANO DO SUPREMO