O Estado de São Paulo, n. 46067, 03/12/2019. Política, p. A8

 

Governo prioriza deputados aliados ao liberar emendas

Renato Onofre

03/12/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Até semana passada foram executados R$ 4,2 bilhões; um dos mais próximos a Bolsonaro, Marco Feliciano teve maior valor pago

Parlamentares de partidos do bloco conhecido como Centrão, como PP, DEM e PL, e aliados próximos ao presidente Jair Bolsonaro tiveram a maior quantia de emendas liberadas até agora. No topo da lista está o deputado Pastor Marco Feliciano (Podemos-SP), vice-líder do governo na Câmara e um dos aliados mais fiéis ao Palácio do Planalto. Dos R$ 15 milhões indicados por ele no Orçamento deste ano, R$ 12 milhões já foram pagos. Outro fiel escudeiro do presidente, o deputado Eder Mauro (PSD-PA), conseguiu liberar R$ 11,6 milhões.

Até a semana passada, o governo já havia empenhado R$ 8,6 bilhões dos R$ 9,2 bilhões previstos para o ano inteiro. Primeira etapa para a liberação do recurso, o empenho é fase em que o governo se compromete a reservar a despesa na dotação orçamentária. Menos da metade foi efetivamente pago (R$ 4,2 bilhões).

As emendas são indicações que deputados e senadores fazem no Orçamento para destinar recursos a suas bases eleitorais. Os parlamentares podem apontar investimentos em serviços e obras, como a construção ou manutenção de unidades de saúde, reformas de escola ou construção de pontes, por exemplo. Com isso, podem lucrar politicamente, enaltecendo ter sido responsável por levar dinheiro àquela localidade.

Os pagamentos das emendas individuais são obrigatórios, mas a prioridade dada para liberar antes recursos indicados por algum congressista depende de negociação política. Por isso, é comum serem utilizadas como moeda de troca pelo Planalto em votações importantes.

Questionado sobre o motivo de ter mais emendas liberadas em relação aos colegas da Câmara, Feliciano disse ter um perfil diferente da maioria, mas negou favorecimento do Planalto. “A maioria dos deputados tem acordo com prefeito e essas coisas. Eu não tenho”, afirmou. “Não sei nem qual é o critério que o governo usou para isso, até porque eu não me preocupo com isso. Eu nunca fui na Casa Civil falar: eu preciso que libere emenda”, completou.

Mesmo deputados que não exercem mais o cargo, mas ainda estão envolvidos no dia a dia da política, tiveram prioridade na fila de pagamentos das emendas. Foi o caso do ex-assessor do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), Leonardo Quintão (MDB-MG). Ele ficou apenas dois meses no Palácio do Planalto, mas conseguiu o desbloqueio de quase tudo que sobrou na “sua conta” com o governo. Foram empenhados R$ 14,9 milhões e pagos R$ 12,1 milhões. Quintão teve direito de indicar emendas porque ainda era deputado no ano passado, quando o Orçamento deste ano foi discutido no Congresso.

No “top 10” dos que conseguiram liberar mais em emendas há um “intruso”. O ex-deputado Andres Sanchez (PT-SP) já teve R$ 13,9 milhões empenhados. Uma análise do destino dos recursos, porém, mostra que o governo empenhou apenas as indicações que o petista fez para engordar o Fundo Nacional da Saúde, usado para despesas em hospitais e outras unidades de saúde.

O governo costuma usar as emendas parlamentares para alcançar o valor mínimo que a lei determina para recursos do Orçamento destinados a áreas de saúde e educação. Outras ações indicadas por Sanchez, para programas na área de esporte na cidade de Parapuã, no interior de São Paulo, estão “zeradas”.

O Estado mostrou no sábado que, sob ameaça de ver travada a agenda econômica no Congresso, o governo cedeu à pressão de parlamentares e acelerou a liberação de emendas em novembro. Até a última semana do mês, foram empenhados R$ 2,2 bilhões. É a segunda maior reserva de recursos feita em um único mês desde que o presidente Jair Bolsonaro assumiu.

O Planalto alega que o valor maior em novembro se deve ao descontingenciamento de verbas, anunciado pelo Ministério da Economia no dia 18. O desembolso ocorreu após o Centrão dar um ultimato ao Planalto: ou quita a “dívida” contraída na negociação pela aprovação das mudanças das regras da aposentadoria ou o governo não aprova mais nada neste ano no Congresso.

Partidos. Na análise por partido, PSD, MDB, DEM, PTB, PL e PP lideram a lista das legendas que mais conseguiram, proporcionalmente, liberar os recursos dos seus deputados. O PSD do ex-ministro Gilberto Kassab conseguiu a execução de 75% (R$ 446,66 mi) dos R$ 594 milhões empenhados. Como revelou o Estado no sábado, levantamento do governo mostra que o PSD também é o partido que mais conseguiu emplacar indicações políticas na administração federal, com 154 cargos.

Procurado para comentar a ordem da liberação das emendas, o Palácio do Planalto não se manifestou até a conclusão desta edição.

Critério

“A maioria dos deputados tem acordo com prefeito e essas coisas. Eu não tenho. Não sei nem qual é o critério que o governo usou para isso, até porque eu não me preocupo com isso. Eu nunca fui na Casa Civil falar: eu preciso que libere emenda.”

Marco Feliciano (Pode-SP)

DEPUTADO FEDERAL

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Apoio a Planalto pode resultar em expulsão

Daniel Weterman

03/12/2019

 

 

Um dos principais aliados do presidente Jair Bolsonaro, o deputado Marco Feliciano (SP) corre o risco de ser expulso do Podemos. O partido deve concluir até o fim do mês um processo contra o parlamentar. Um dos casos em análise pelo conselho de ética da legenda é o gasto de R$ 157 mil com um tratamento odontológico reembolsado pela Câmara, revelado pelo Estado em agosto. Na época, o parlamentar argumentou que precisava corrigir um problema de articulação na mandíbula e reconstruir o sorriso com coroas e implantes na boca.

Durante a campanha, Feliciano declarou apoio a Bolsonaro, apesar de o partido ter um candidato próprio: o senador Alvaro Dias. A possível saída forçada de Feliciano ocorre dentro da estratégia do Podemos de se afastar do “bolsonarismo” e se firmar como a sigla da Lava Jato. O partido tem atraído parlamentares da centro-direita descontentes com o governo e, só no Senado, passou de cinco para dez parlamentares nos últimos meses – a segunda maior bancada. Como mostrou o Estado, o crescimento tem incomodado aliados do presidente.

Feliciano se filiou ao Podemos em 2018 com a expectativa de que, sendo pastor da Assembleia de Deus, pudesse ser um puxador de votos.

O deputado afirmou que não está acompanhando o processo disciplinar. “Não estou nem a par disso. Para mim, o que acontecer está bom”, disse, negando que vá deixar o Podemos por decisão própria. “Que o eleitor julgue o caso. Um partido expulsa um deputado por apoiar um presidente da República. Aí, não tem mais o que fazer”, afirmou, acrescentando que fechou um acordo com o Podemos desde a campanha eleitoral para ser independente.

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Para Moro, 2ª instância pode ser votada agora

Breno Pires

Daniel Weterman

03/12/2019

 

 

Ministro da Justiça diz ser contra acordo para PEC da Câmara, conforme acertaram Maia e Alcolumbre

 

Pressa. Moro diz que projeto de lei resolveria discussão

O ministro Sérgio Moro, da Justiça e Segurança Pública, afirmou ser contra deixar para 2020 a discussão sobre a prisão em segunda instância. Esse é o cenário mais provável no momento no Congresso, na medida em que o Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), costura acordo com líderes para aguardar a tramitação de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) na Câmara.

Na primeira manifestação contrária ao acordo, Moro reafirmou que não é necessária PEC, e sim, projeto de lei, para promover a mudança, por meio da alteração do Código do Processo Penal.

“Eu gostaria de ver isso aprovado o quanto antes. Se for possível aprovar por um projeto de lei neste ano, no Senado ou na Câmara, um tanto melhor. Por que a gente tem de esperar o ano que vem?”, perguntou em Moro, em entrevista à Rádio Jornal do Commercio de Caruaru.

“Mas, se a decisão do Congresso for fazer por uma emenda constitucional, que tenha alguns prazos maiores, aí é uma decisão do Congresso. O importante é a sociedade, nós ficarmos vigilantes em relação a essa situação, para que possamos ver isso realizado.”

A tentativa de firmar um acordo para bloquear a tramitação das propostas no Senado foi encampada por Alcolumbre, em reunião com líderes do Congresso na terça-feira da semana passada. Após reação da ala contrária à solução, incluindo a presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Simone Tebet (MDB-MS), Alcolumbre decidiu aguardar a Câmara enviar um cronograma de tramitação da PEC e instalar comissão especial hoje. A expectativa é se Maia irá cumprir esse combinado.

Se a PEC da Câmara realmente for priorizada, a tramitação deve ser mais lenta e a aprovação, mais difícil. Uma PEC precisa de 308 votos na Câmara e 49 no Senado em dois turnos para ser aprovada, além de ter de passar por comissões antes do plenário, com até 40 sessões. Levantamento feito pelo Estado em novembro mostra que prisão após segunda instância tem maioria no Congresso.

Já um projeto de lei, como querem Moro e a bancada “lavajatista”, precisa de maioria simples nas duas Casas. Defensores da proposta dizem já ter votos para aprovar o projeto. Reservadamente, parlamentares avaliam que a estratégia de priorizar a PEC da Câmara leva em conta que os deputados dificilmente votarão a proposta em plenário rapidamente. Ou seja, esperar a Câmara e evitar que o Senado aprove outra proposta deixaria o assunto em “banho-maria”.

Deputados do Centrão argumentam que a PEC da Câmara, ao alcançar mais processos além de acusações penais, é uma discussão mais justa e aplica a segunda instância “para todos”. A proposta tem um efeito ampliado e afetar não só ações na área criminal, mas também antecipar o pagamento de dívidas cobradas na Justiça, aumentando despesas para União, Estados, municípios e empresas.

“Eu sou daqueles que prefiro esperar mais um mês e dar uma solução robusta, estruturada que responde à população, que dá estabilidade para as instituições a embarcar numa aventura, para fazer demagogia, sabendo que ela não terá efeito prático nenhum ou que ela pode mudar ali na próxima esquina”, disse o deputado Marcelo Ramos (PL-AM).  

Mais propostas na fila

Fracassou ontem a primeira tentativa de agilizar votações da Câmara. A ideia era esvaziar a pauta, mas os deputados aprovaram dois pedidos de urgência, o que aumentou a fila de propostas.