Título: Fora dos trilhos
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 04/11/2012, Mundo, p. 16
Próximo presidente norte-americano terá um trabalho árduo para tirar a principal locomotiva econômica do mundo do atoleiro
Quatro anos após o estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos e da chegada do primeiro negro à Casa Branca, os eleitores norte-americanos se preparam para escolher quem será o próximo presidente do país. A decisão, mais do que em qualquer outro momento da história, estará carregada de esperança, sobretudo para os milhões de eleitores que perderam o emprego, moradia e renda em meio à pior crise enfrentada pelos EUA em mais de 80 anos. A escolha entre Barack Obama e Mitt Romney será determinada pelos problemas econômicos e pela crença de que um dos dois pode resolvê-los. O mundo, por motivos semelhantes, estará de olho nas eleições da próxima terça-feira, também esperançoso que dali saia o nome que vai recolocar os EUA no posto de locomotiva do planeta.
Quem assumir a Casa Branca em janeiro de 2013 encontrará ainda uma economia fria e o sonho americano de que tudo é possível mesmo em um país despedaçado. "O americano sempre teve uma espécie de certeza de que o futuro é melhor do que o presente e, quando você tem uma perspectiva de que o passado é melhor que o presente, como agora, não há força para o desenvolvimento, como foi na Argentina e na Rússia", argumenta Marcos Troyjo, professor de economia da Universidade Columbia, em Nova York. O país, na visão de especialistas, está pagando a fatura de mais de 10 anos de "guerra ao terror" e do resgate de instituições financeiras entre 2008 e 2009, quando a crise hipotecária derrubou mercados mundo afora e quebrou bancos e seguradoras nos EUA.
Reintegração
O preço para salvar o mercado financeiro e manter soldados em batalhas longe dos EUA foi enorme e vai pesar na gestão do próximo presidente. A dívida pública explodiu. Passou de 76,1% do Produto Interno Bruto (PIB), em 2006, para 106,6% este ano. A taxa de desemprego, que foi de 4,7% em 2001, bateu em 7,9% no mês passado — o índice seria ainda maior não fosse o desalento dos norte-americanos que desistiram de procurar trabalho e, consequentemente, não aparecem nas estatísticas. "O próximo presidente assumirá um país fragmentado e dividido", explica Alexandre Coelho, diretor para as Américas do Daiwa Capital Markets, em Nova York. "Fundamentalmente, o próximo presidente terá de reintegrar uma recém-criada classe de novos-pobres à economia real. O vencedor terá de resgatar e reconstituir a classe média americana através da consolidação de seu poder de compra e geração de riqueza", diz.
Sem emprego e renda, o consumismo, que sustentou a economia doméstica e impulsionou o mundo, ruiu. As encomendas às fábricas caíram drasticamente: na comparação entre agosto e julho, o tombo foi de 2,5%. A indústria passou a operar abaixo do seu potencial máximo, com apenas 70% do que é capaz de fazer. "Tem mais coisas envolvidas. Não existe um setor externo forte para o caso de os EUA conseguirem exportar. A demanda mundial ainda está enfraquecida", observa Rodolfo Oliveira, economista da Tendências Consultoria.
Em meio a esse cenário, ainda surgem dúvidas quanto à capacidade do país de garantir um crescimento sustentável. A previsão do Fundo Monetário Internacional (FMI) para 2013 é que o PIB cresça 2,5%, mas são crescentes as possibilidades desse número ser revisado para baixo. Essa visão negativa foi reforçada principalmente depois de as estimativas para 2012 terem sido derrubadas seguidamente até chegarem a 1,9% neste fim de ano. "Os EUA estão com ritmo de crescimento ainda lento e um pouco instável, porém melhor do que o observado no passado recente", pondera Oliveira.