O Estado de São Paulo, n. 46126, 31/01/2019. Metrópole, p. A16

 

OMS decreta emergência global por coronavírus; China tem 213 mortes

Fabiana Cambricoli

31/01/2020

 

 

Saúde. Novo status permite a países integrarem esforços sanitários, científicos e financeiros para conter surto; declaração do tipo já foi feita outras cinco vezes na história. Entidade opta por não recomendar restrições de viagem ou comércio e evita críticas a Pequim

A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou ontem emergência de saúde pública de interesse internacional pelo surto do novo coronavírus. Identificado pela primeira vez em dezembro, o vírus já deixou 213 mortos na China e infectou 9,7 mil pessoas. Outros 19 países, de quatro continentes, já confirmaram casos. A OMS não recomendou restrição de viagem ou comércio com o país asiático. Mas várias nações já adotam medidas drásticas. A Rússia fechou fronteira com a China ontem – o que já havia sido feito pela Mongólia.

A decisão foi tomada pela diretoria da OMS após consulta a um comitê de especialistas que se reuniu por mais de sete horas em Genebra. É a sexta vez que a entidade declara esse status. A medida permite que os países integrem esforços sanitários, financeiros e científicos na contenção do surto.

O comitê de emergência já havia se reunido duas vezes na semana passada, mas, na ocasião, concluiu que “era muito cedo” para decretar alerta global. O argumento da OMS foi o de que, embora já configurasse emergência na China, o surto ainda estava muito localizado e não representava ameaça internacional. O cenário, porém, se agravou na última semana. Embora mais de 98% das infecções tenham sido registradas em território chinês, o total de países com confirmações tem crescido todos os dias – ontem foram reportados dois casos na Itália.

Na Alemanha, no Japão, no Vietnã e nos Estados Unidos, o vírus já contaminou pessoas que não estiveram em território chinês, o que indica transmissão interna nesses locais, cenário que eleva o risco de propagação global. Esse foi o motivo pelo qual o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, decidiu reconvocar o comitê de emergência e declarar alerta global.

Na entrevista coletiva em que o anúncio foi feito, Ghebreyesus afirmou que, por mais que o número de casos em outros países ainda seja pequeno (98 registros), é necessária ação coordenada entre nações.

“Embora esse número seja relativamente pequeno em comparação com o registrado na China, devemos agir juntos agora para limitar uma futura propagação. Não sabemos o tipo de dano que o novo coronavírus pode causar se ele se espalhar por um país com um sistema de saúde mais frágil. Precisamos agir agora para ajudar os países a se preparar para essa possibilidade”, declarou Ghebreyesus.

Sobre a decisão de não impor restrições de deslocamento, ele afirmou que “não há necessidade” de interferir nas viagens e comércio internacionais. “Pedimos a todos os países que implementem decisões consistentes e baseadas em evidências. A OMS está à disposição para aconselhar qualquer país que esteja avaliando medidas.”

O presidente do comitê de emergência, Didier Houssin, afirmou que, com a declaração de emergência, a OMS poderá questionar os países que já adotaram medidas restritivas sobre os motivos da decisão. Várias nações já iniciaram triagens de viajantes em aeroportos para detectar possíveis sintomas e retiraram seus cidadãos da região de Wuhan, epicentro do surto.

Acelerar o desenvolvimento de vacinas, tratamentos e diagnósticos também foi uma recomendação da OMS aos países. Além disso, foi reforçada a necessidade de combater a disseminação de rumores.

Cautela. Em seu pronunciamento, o diretor-geral da OMS ressaltou diversas vezes os esforços do governo chinês em conter a epidemia, numa clara intenção de não causar mal-estar político com o país mais populoso do mundo, peça fundamental para a economia global.

“O governo chinês deve ser parabenizado pelas medidas extraordinárias que vem tomando para conter o surto de coronavírus, apesar do severo impacto socioeconômico que essas medidas estão tendo na população chinesa. Estaríamos vendo muito mais casos fora da China – e provavelmente mortes – se não fossem os esforços do governo chinês e o progresso que fizeram para proteger a população chinesa e mundial”, disse Ghebreyesus.

A China já colocou mais de 50 milhões de habitantes em quarentena, a maioria deles em Wuhan, cidade considerada o epicentro do surto. Tradicionais pontos turísticos do país asiático, como trechos da Grande Muralha e a Cidade Proibida, um palácio imperial em Pequim, já foram fechados para visitação. O feriado do ano-novo lunar foi estendido até domingo.

Em diferentes momentos, Ghebreyesus destacou a rapidez com que a China adotou medidas de combate ao surto e afirmou que a declaração de emergência não está relacionada a uma resposta insuficiente de Pequim. Parte dos especialistas acusou o governo de reter informações – o que foi rebatido com garantias de transparência por parte do presidente, Xi Jinping. “Essa declaração não é um voto de não confiança na China. Ao contrário, a OMS continua a ter confiança na capacidade da China de controlar o surto”, afirmou Ghebreyesus. Histórico. A primeira vez que a OMS declarou emergência foi durante o surto de gripe H1N1, em 2009. Motivaram ainda a declaração as epidemias de poliomielite (2014), zika (2016, com epicentro do surto no Brasil) e Ebola (duas vezes, em 2014 e 2019). / COM AGÊNCIAS

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