O Estado de São Paulo, n. 46125, 30/01/2020. Economia, p. B8

 

Coronavírus testa dependência mundial da China

Alexandra Stevenson

30/01/2020

 

 

País representa aproximadamente um sexto da produção econômica global e é a maior fabricante e comerciante do mundo

O mundo rapidamente vem percebendo como depende da China. As fabricantes de automóveis Ford e Toyota paralisaram os trabalhos nas suas fábricas chinesas por uma semana. A Apple está redirecionando sua cadeia logística. A Starbucks fechou milhares de cafeterias e alertou para um abalo financeiro.

 

A British Airways suspendeu ontem todos os voos para a China, e United Airlines e Air Canada reduziram o serviço. Líderes do Japão se preparam para um possível choque. Hotéis e agências de turismo por toda a Ásia estão em observação, temerosos, à medida que a China, a maior fonte de dólares de turismo do mundo, fecha suas fronteiras.

O misterioso coronavírus, que já matou mais de uma centena de pessoas e com milhares de enfermos, virtualmente desligou um dos mais importantes motores de crescimento do mundo. Desesperadas para conter o vírus que se propaga rapidamente, as autoridades chinesas estenderam o feriado nacional no país até dia 3 de fevereiro, e paralisaram os transportes rodoviário, ferroviário e aéreo. Cidades inteiras foram isoladas.

Uma nação empobrecida há apenas quatro décadas, a China se tornou uma parte essencial da máquina industrial moderna do mundo. Sozinha, ela representa aproximadamente um sexto da produção econômica global. É a maior fabricante e comerciante do mundo.

A China se tornou tão crucial para as operações das companhias dos Estados Unidos que alguns membros do governo americano citaram essa dependência como justificativa para a guerra comercial iniciada pelo presidente Trump há dois anos contra Pequim – um conflito econômico que vem forçando as empresas a pensarem em mudar suas fábricas na China para países com melhores relações com Washington. Agora, o coronavírus testa essa dependência.

General Motors e Nissan pretendem fechar suas fábricas até a semana de feriado que foi estendida, já Toyota e Ford informaram que fecharão algumas fábricas por uma semana a mais. GM, Honeywell, Facebook e Bloomberg restringiram as viagens dos funcionários na China. Na terça-feira, a rede Starbucks anunciou o fechamento de mais da metade das suas 4.292 cafeterias no seu segundo maior mercado, e disse que haverá um impacto financeiro no seu balanço.

Alcance. A extensão total dos danos para o mundo empresarial ainda não está clara. Grande parte da China já estava fechada desde sexta-feira para o feriado do ano-novo Chinês. Mas, com a epidemia não dando sinais de diminuir, muitas empresas se preparam para uma paralisação mais longa.

“Nossos membros estão enfrentando os mais variados níveis de transtorno nas atividades, incluindo problemas na cadeia logística, fechamento temporário de lojas e fábricas”, explicou Jake Parker, vice-presidente do Conselho de Negócios EUA–China, que representa as grandes empresas. “Se as restrições de viagens e quarentenas forem ampliadas ou o feriado se estender para além da semana que termina em 8 de fevereiro, os problemas vão piorar.”

A importância da China vai além daquilo que o país produz. Seus consumidores compram mais carros e smartphones do que qualquer outro país no mundo. Quando viajam para o exterior, os turistas chineses gastam US$ 258 bilhões ao ano, segundo a Organização Mundial do Turismo, quase duas vezes mais do que os americanos.

As companhias globais vinham reavaliando suas estratégias chinesas mesmo antes da guerra comercial. O crescimento do país vem desacelerando, os custos trabalhistas aumentaram, as empresas locais são cada vez mais competitivas e o governo está menos transigente. Mas sua mão de obra especializada, os enormes sistemas rodoviário e ferroviário e o vasto mercado de consumo tornam difícil deixar o país.

Muitas empresas pensam agora em soluções paliativas temporárias. Tim Cook, diretor executivo da Apple, afirmou que a companhia vem buscando fornecedores alternativos para “compensar uma esperada queda da produção”. A Foxconn, empresa de Taiwan com uma ampla rede de fábricas na China e que produz dispositivos para a Apple e outras companhias, anunciou que suas fábricas seguirão o novo calendário do feriado.