O Estado de São Paulo, n. 46123, 28/01/2020. Metrópole, p. A15

 

Falha do Enem faz governo suspender inscrição no ProUni

Isabela Palhares

28/01/2020

 

 

Exame é critério de acesso a programa que dá bolsa em faculdade privada; lista de aprovados em federais segue barrada pela Justiça

O Ministério da Educação (MEC) informou ontem que vai suspender, por tempo indeterminado, a abertura de inscrições para o Programa Universidade para Todos (ProUni), que dá bolsas de estudo em instituições privadas. Como a divulgação do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que reúne vagas no ensino superior público, continua suspensa pela Justiça, o MEC disse que não é possível dar continuidade ao cronograma de outros programas federais do ensino superior.

As inscrições para o ProUni, que usa a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como um dos critérios de acesso, teriam início hoje. A pontuação mínima para tentar a bolsa é de 450 pontos, na média das provas objetivas (Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências Humanas).

Apesar de não abrir as inscrições, o governo afirma que os estudantes poderão consultar as 251 mil bolsas, parciais ou integrais, que serão ofertadas. A nota no Enem também é condição de acesso para o Fies, programa de financiamento estudantil, cuja abertura de inscrições é prevista para o dia 5 de fevereiro no calendário oficial.

Anteontem, o Tribunal Regional Federal da 3.ª Região também manteve a decisão que barra a divulgação de resultados do Sisu. A suspensão foi pedida pela Defensoria Pública da União. A Justiça liberou a conclusão da etapa de inscrições – terminou ontem, com quase 1,8 milhão de participantes –, mas travou a liberação da lista de aprovados, prevista para hoje, até o MEC comprovar que a falha não afetou todos os candidatos.

Segundo o MEC, houve problemas em 5.974 provas e os erros já foram resolvidos. O Enem teve cerca de 3,9 milhões de candidatos. Em nota, MEC e Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep), órgão do ministério responsável pelo exame, disseram “reforçar a lisura do Enem” e ausência de “prejuízo aos inscritos”.

Ontem a Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Estado apurou que Inep e MEC aceleraram ontem a produção de estudos técnicos comprovando medidas adotadas para lidar com a falha. Na cúpula da pasta, há quem avalie que a crise poderia ter sido evitada se, desde o início, tivesse havido maior transparência.

Em nota, a associação de reitores das federais, Andifes, disse que, apesar do prejuízo ao calendário, acredita ser necessária suspensão para que se tenha garantia de que os resultados estão corretos e respeitem “padrões mais elevados de justiça”.

O defensor público federal João Paulo Dorini acredita que as explicações e medidas do MEC são insuficientes para garantir a confiabilidade na prova. Ele é autor da ação que levou à suspensão do Sisu.

“Não temos segurança de como é feita a calibragem das questões (que têm pesos diferentes na composição da nota final, pois são divididas em níveis de complexidade), se houve mudança no peso delas com a recorreção de algumas provas, se todas as provas teriam de ser corrigidas. São muitas perguntas sem resposta”, afirma Dorini.

Na berlinda. A forma com a qual o ministro da Educação Abraham Weintraub lidou com o problema no Enem reforçou os pedidos para que o presidente Jair Bolsonaro o substitua. Desde dezembro, nomes de confiança do Planalto pedem que o presidente considere a demissão de Weintraub – malvisto pelas polêmicas, consideradas desnecessárias e prejudiciais ao governo, e pela falta de projetos e dificuldade de implementação de políticas públicas.

Assim como quando demitiu o ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez, em abril de 2019, Bolsonaro já tem recebido “listinhas” de seus principais grupos de apoiadores com sugestões de nomes. Há listas com indicações do grupo evangélico, dos militares e dos entusiastas do escritor Olavo de Carvalho.