Valor econômico, v.20, n.4754, 21/05/2019. Política, p. A8

 

Bolsonaro critica classe política, mas elogia Congresso

Gabriel Vasconcelos

André Ramalho

Fábio Pupo

Marcelo Ribeiro

Carla Araújo

21/05/2019

 

 

De maneira contraditória, o presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem, em evento no Rio de Janeiro, que o Brasil é um país que "tem tudo para crescer", mas cujo "grande problema" é a classe política, ao mesmo tempo em que elogiava o Congresso.

"O Brasil é um país maravilhoso, que tem tudo para dar certo. Mas o grande problema é a nossa classe política", disse ele, ao pedir apoio do governador e do prefeito do Rio, Wilson Witzel (PSC) e Marcelo Crivella (PRB), respectivamente. "É o Parlamento, em grande parte, é a Câmara Municipal, é a Assembleia Legislativa. Nós temos que mudar isso", disse o presidente.

No mesmo discurso, entretanto, mostrou-se conciliador em relação à reforma da Previdência, em uma frase que agradou o mercado, produzindo algum alívio na Bolsa e no câmbio no meio do dia. "Se a Câmara e o Senado têm propostas melhores que a nossa [reforma da Previdência], que coloquem em votação. Não há briga entre os Poderes. O que há é uma grande fofoca e, lamentavelmente, parte considerável da nossa mídia se preocupa muito mais com isso do que com a realidade", disse. "O que eu mais quero é conversar", completou Bolsonaro, para uma plateia de empresários na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), onde foi homenageado.

O aceno ocorre dias após o presidente replicar em suas redes sociais um texto que dizia que o país é "ingovernável" fora dos "conchavos". Ainda ontem, durante lançamento da campanha publicitária pela reforma da Previdência, em Brasilia, o presidente reforçou o tom amigável ao falar sobre o Congresso, onde a proposta de emenda constitucional (PEC) é apreciada. "Eu agradeço ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que, em conversas, são unânimes em dizer sobre a necessidade da reforma da Previdência", disse Bolsonaro.

Ele acrescentou que gostaria de receber mais parlamentares para conversar e que não o faz por falta de espaço na agenda. Na avaliação do presidente, os encontros seriam determinantes para corrigir "possíveis equívocos" que atrapalham a comunicação entre os Poderes. O presidente afirmou ainda estar confiante de que a reforma da Previdência será aprovada no Congresso "com o menor número possível de emendas".

"Nas minhas viagens ao exterior, a gente ouve que se o Brasil aprovar a reforma da Previdência, sairá da estagnação em que se encontra rumo à sonhada prosperidade. Isso passa por todos vocês, parlamentares. Até porque em Estados onde o governo é oposição, conversando reservadamente, eles dizem que precisam da reforma. E sei que no fundo eles vão se empenhar para que esse objetivo seja alcançado", disse Bolsonaro.

Antes do presidente, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou estar convicto de que a reforma será aprovada até o início de julho. "Os parlamentares sabem que ela é fundamental para o presente e o futuro do país", disse. "Temos diferenças ideológicas, de concepção de país, de concepção de governabilidade, mas há uma responsabilidade que está acima de nós", complementou o ministro.

Em seu discurso, na Firjan, o presidente chamou os empresários de "verdadeiros heróis pelo que têm de enfrentar" a burocracia do Estado, no Brasil, e defendeu a redução e simplificação de impostos. Ele citou, como exemplo, o caso do Texas (EUA), Estado americano onde esteve recentemente, conhecido por baixas tributações.

"É um sinal de que quanto menos a gente tributa, quanto menos a gente interferir, maior é o movimento [econômico] disse, conclamando o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, a baixar as alíquotas em momento no qual a Fazenda estadual trabalha para incrementar receitas devido à crise fiscal.

Em boa parte de sua fala Bolsonaro também atacou o processo de licenciamento ambiental de obras públicas ou privadas. "A questão ambiental virou um óbice para o Brasil. Em tudo o MP [Ministério Público Federal] se mete, às vezes com razão, às vezes não, e inviabiliza a obra", criticou.

Nesse sentido, Bolsonaro citou a proibição de atividade humana na Estação Ecológica de Tamoios na Baía de Ilha Grande (RJ), a demora média de dez anos para aprovação de pequenas centrais hidrelétricas e o atraso nas obras do linhão de transmissão de energia entre Manaus (AM) e Boa Vista (RR).

Por mais de uma vez, Bolsonaro rebateu críticas a seu governo e as atribuiu ao combate de interesses corporativos. "Cada vez que a gente toca o dedo em uma ferida, um exército de pessoas influentes se volta contra mim", disse.