O globo, n.31414, 10/08/2019. Economia, p. 21

 

Pacote de ações 

Manoel Ventura 

Cássia Almeida 

10/08/2019

 

 

Após a aprovação da reforma da Previdência na Câmara dos Deputados, o governo prepara um pacote de ações voltadas para outros setores da economia que tem como objetivos garantir o equilíbrio econômico e fiscal, a competitividade e a melhoria dos serviços públicos ao cidadão. O ministro da Economia, Paulo Guedes, finaliza os detalhes de uma apresentação que fará na próxima semana na qual mostrará o plano do governo para o segundo semestre e a agenda econômica no longo prazo. Guedes pretende anunciar uma série de medidas, na tentativa de emplacar uma agenda positiva.

Para especialistas, o pano de fundo da agenda pós-reforma é o quadro fiscal. A mudança nas regras de aposentadoria é condição necessária para ajustar as contas públicas, mas não resolve o problema. O país tem déficit desde 2014 e só deve voltar ao azul em 2022 ou 2023, segundo previsões.

O ministério, que quer evitar apalavra“pacote ”, comum em gestões anteriores, prefere denominar as ações como uma agenda econômica dinâmica de longo prazo. Entre os três eixos básicos das medidas, serão anunciadas as linhas gerais do programa de privatizações, a reforma tributária e medidas administrativas.

A avaliação no Ministério da Economia é que a equipe não conseguiu ainda se comunicar coma sociedade sobre as metas e ações nas quais está trabalhando. No campo das contas públicas, a principal medida do governo é a reformada Previdência, insuficiente para resolver o déficit fiscal no curto prazo. Por isso, estão sendo planejadas privatizações, concessões e outras medidas para reduzir o rombo e diminuir a dívida pública—que deve chegara 80% do Produto Interno Bruto (PIB) no fim do ano. Guedes deve citar, mas não detalhar, uma possível redução do número de ministérios.

Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, afirma que o Orçamento de 2020 vai refletir um país que ainda tem um problema fiscal sério, mesmo coma aprovação da reforma da Previdência. Ele pondera que outras iniciativas precisam ser tomadas, como suspensão de concurso público e congelamento de salário de servidor.

SEM ESPAÇO PARA GASTAR

A economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, traça diagnóstico similar e vê um quadro dramático nas contas, sem espaço para gastar:

— Nos próximos anos, não vai dar par ater concurso público ou reajuste do funcionalismo, e temos de torcer para o bom comportamento do PIB e da arrecadação. A reforma impediu o colapso, mas, infelizmente, as contas ainda ficarão deficitárias neste mandato.

A economista Margarida Gutierrez, da Coppead, diz que, se o Brasil quiser estabilizara dívida pública, terá de fazer esforço fiscal de R $300 bilhões, algo impossível numa tacada só por impor corte de gastos excessivos e aumento de impostos. Ela ressalta que 60% do gasto obrigatório têm reajuste automático pelo salário mínimo ou pelo INPC (índice de inflação medido pelo IBGE). A indexação poderia ser atacada com a proposta de emenda constitucional (PEC) do pacto federativo (desvinculação do Orçamento).

O governo prepara justamente a revisão do pacto federativo, uma das grandes bandeiras do ministro da Economia desde a campanha do presidente Jair Bolsonaro. Guedes quer descentralizar recursos para estados e municípios. Ele pretende fazer com que algumas despesas hoje de execução obrigatória percam a vinculação. O discurso é que é preciso dar mais poder à classe política, com parlamentares comandando o Orçamento.

Para Raul Velloso, especialista em contas públicas, atarefa, no entanto, não é fácil, principalmente quando se fala na desvinculação para o setor de saúde. Fabio Klein, da consultoria Tendências, identifica melhora do cenário após a aprovação da reforma da Previdência na Câmara, mas ressalta que o investimento público está no menor patamar histórico, e os gastos discricionários( que não são obrigatórios) estão no menor nível desde 2009. Ele pondera que a inclusão de estados e municípios no Senado é passo crucial para equacionar as contas públicas.

ABERTURA ECONÔMICA

Outro foco do conjunto de ações do governo abrange medidas para racionalizar o andamento da máquina pública, com impacto de âmbito microeconômico, de busca de maior eficiência na gestão de recursos. Na área de produtividade e competitividade, Guedes afirma ser preciso “tirar o Estado do cangote brasileiro”, com medidas de desburocratização. Nessa seara está incluída a abertura econômica, com ações como zerar impostos para importação de máquinas e equipamentos sem produção nacional. Só neste ano, o benefício foi concedido a 1.189 produtos. Para ampliaras possibilidades de importação, o governo quer critérios mais rígidos para classificar um bem sem similar nacional.

Outra área que será contemplada é a de governo digital. Guedes vai falar sobre medidas para melhorar o atendimento aos cidadãos, a partir da otimização e racionalização de serviços. Entre as ações está a unificação das unidades do INSS com as agências de atendimento ao trabalhador que antes estavam sob o guarda chuva do Ministério do Trabalho. A unificação não será total, mas vai abranger a maior parte das agências. O objetivo é reduzir custos administrativos e facilitara vida de quem precisa dos dois serviços. Isso será possível porque o governo está digitalizando quase todo o atendimento e por causa da unificação das pastas no Ministério da Economia.

Algumas ações já foram anunciadas, como a primeira parte do Pró-Infra, voltado para infraestrutura, a regulação do setor de gás natural, a liberação de recursos do FGTS e do PIS/Pasep e a medida provisória da Liberdade Econômica, que facilita a abertura de negócios, mas que requer aval do Congresso.

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Meta é arrecadar R$ 490 bi com venda de estatais 

10/08/2019

 

 

Bolsonaro pede a secretário especial de Desestatização a privatização de ao menos uma empresa pequenininha por semana

O governo avalia que há um potencial de arrecadar R$ 490 bilhões coma privatização de estatais federais até o fim de 2022. O número fará parte da apresentação do ministro da Economia, Paulo Guedes, com um conjunto de medidas para garantir o equilíbrio econômico e fiscal. O dinheiro pode ser usado para reduzir a dívida pública. Para este ano, a meta é vender R$ 76 bilhões em ativos.

Ontem, o presidente Jair Bolsonaro disse que pediu ao secretário especial de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia, Salim Mattar, que privatize ao menos uma empresa estatal pequenininha por semana:

— Está com o Salim Mattar essa proposta. Não é fácil privatizar também. O que eu falei com o Salim Mattar: “Salim, pelo menos um azinha por semana você tem que resolver, tá certo? Umazinha. Uma estatal pequenininha. Começa por aí. As maiores, você vai ter problema. Grande parte passa pelo Parlamento”.

O presidente criticou a gestão das estatais em governos passados, dizendo que eram “focos de corrupção”. Ele citou especificamente a Petrobras, fazendo referência ao trabalho do ministro Sergio Moro (Justiça), que estava ao seu lado, como juiz da Operação LavaJato e lembrou que um de seus antigos partidos, o PP, tinha indicados na diretoria da empresa. Bolso na roa inda citou os Correios e o seu fundo de pensão, o Postalis.

O cardápio de estatais a serem efetivamente privatizadas, porém, não deve fazer parte da apresentação de Guedes. Há um entendimento de não ser possível, por lei, divulgar uma lista de privatizações. O governo já tem certo, no entanto, que vai privatizara Eletrobras e também deve tocara desestatização dos Correios.

A estimativa é que será possível arrecadar, ainda, R$ 115 bilhões com concessões e mais R$ 30 bilhões com venda de imóveis durante o governo Bolsonaro.

O governo também já tem como certo o que não vai privatizar nem extinguir. São pelo menos 12 empresas, incluindo Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES. Nessa lista estão ainda Embrapa, Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) e Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), companhias de serviços hospitalares e estatais militares. A Valec e a Empresa de Planejamento e Logística( EPL) também devem ser poupadas. (Manoel Ventura, Daniel Gullino e Gustavo Maia)