O globo, n.31412, 08/08/2019. Mundo, p. 23

 

Eduardo diz que não interferiu em ata sobre Itaipu

Janaína Figueiredo

Eliane Oliveira 

Sergio Roxo 

08/08/2019

 

 

O deputado e presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa da Câmara, Eduardo Bolsonaro (PSLSP), negou ontem ao GLOBO ter participado em março de uma suposta reunião na Embaixada do Paraguai em Brasília com representantes do governo de Assunção e do grupo Léros. O grupo, segundo denúncias divulgadas pela imprensa do país vizinho, teria tentado negociar benefícios numa operação de compra da energia paraguaia produzida pela hidrelétrica binacional de Itaipu.

Na véspera, o PT fizera um requerimento à Câmara e à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para que sejam investigadas a suposta relação entre o grupo e o governo Bolsonaro e a suposta tentativa do Planalto de favorecê-lo em suas negociações com a estatal Ande (a Eletrobras paraguaia).

EMBAIXADOR TAMBÉM NEGA

O encontro na sede diplomática também foi desmentido pelo ex-embaixador do país no Brasil, Hugo Saguier, afastado do posto após o escândalo desencadeado no Paraguai pela revelação de uma ata secreta selada pelos dois países, em maio, sobre a energia produzida por Itaipu. Pelo acordo, o Paraguai aceitava pagar mais pela energia que consome da hidrelétrica. A ata foi anulada em 1º de agosto, após sua existência ter sido revelada.

O filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou que nunca pisou na representação paraguaia no Brasil. A questão foi apresentada pelo deputado Paulo Pimenta (PT-RS) no âmbito da comissão presidida por Eduardo Bolsonaro.

— Rechaço frontalmente essa informação — afirmou o deputado.

Procurado, Pimenta esclareceu que não acusou de nada o colega do PSL, apenas protocolou algumas perguntas na comissão.

— Não estamos acusando Eduardo Bolsonaro. Queremos que ele responda as questões —disse Pimenta.

Desde a semana passada, circulam denúncias no Paraguai que vinculam o governo e a família Bolsonaro a uma suposta manobra para

favorecer o grupo Léros numa licitação no Paraguai. Essas denúncias surgiram em meio a uma grave crise política na qual mergulhou o governo do presidente Mario Abdo Benítez, em consequência da divulgação do acordo secreto com o Brasil. Segundo cálculos feitos no país, o Paraguai teria um prejuízo anual de US$ 200 milhões ao aceitar comprar mais da “energia garantida”, a mais cara produzida em Itaipu.

De acordo com o advogado José Rodríguez González, que disse ter representado o vicepresidente do Paraguai, Hugo Velázquez, nas negociações entre seu país e o Brasil, durante as conversas foi discutido um negócio entre o grupo Léros e a Ande. Nesses encontros, sempre segundo Rodríguez, participaram representantes da Léros e o empresário brasileiro Alexandre Giordano, suplente do senador Major Olímpio (PSL-SP).

AÇÃO ANTI-IMPEACHMENT

Em chats de WhatsApp aos quais O GLOBO teve acesso, o advogado diz ao então presidente da Ande, Pedro Ferreira, que era necessário excluir alguns pontos do acordo bilateral para não prejudicar uma negociação (em referência ao grupo Léros). Em algumas das mensagens do advogado, o grupo é identificado entre parênteses como “governo do Brasil”. Rodríguez disse, ainda, que nas reuniões Giordano se apresentou como representante do governo e da família Bolsonaro.

Pimenta perguntou ao deputado Bolsonaro se conhecia Giordano. Ao GLOBO, Eduardo Bolsonaro respondeu ter conhecido o empresário em São Paulo, quando este trabalhou na campanha de Olímpio. Perguntado se Giordano teria usado o nome da família Bolsonaro para se projetar, o deputado afirmou:

— Se usou, foi sem nossa autorização.

Giordano e Kleber Ferreira, diretor do grupo Léros, confirmaram as reuniões no Paraguai. O suplente do Major Olímpio, porém, nega ter usado o nome da família ou do governo Bolsonaro. Já o diretor do grupo Léros desmentiu qualquer relação com o PSL, o governo ou a família presidencial. O empresário disse que seu grupo respondeu a um chamamento para comprar energia da Ande eque em sua proposta foi pedida exclusividade, mas negou uma negociação paralela.

Hoje, o Par agua ié obrigado a vendera chamada“energia adicional” (bem mais barata do que a garantida) diretamente à Eletrobras, mas reivindica poder negociá-la com terceiros países e no mercado livre brasileiro. Diante da crise política, os dois países recuaram para evitar um pedido de impeachment de Abdo Benítez, acusado pela oposição de traição à Pátria.

Ontem, a maioria do governista Partido Colorado se ausentou da sessão ordinária da Câmara para evitar que fosse dada entrada ao pedido de abertura de impeachment.