O globo, n.31412, 08/08/2019. Sociedade, p. 26

 

No MEC, livros didáticos sofrem bloqueio de R$ 348,4 milhões

08/08/2019

 

 

O Ministério da Educação (MEC) bloqueou R$ 348,4 milhões que seriam aplicados na produção, aquisição, distribuição de livros e de materiais didáticos e pedagógicos da Educação Básica, área considerada prioritária pelo ministro Abraham Weintraub. O bloqueio ocorre para atender ao novo contingenciamento de R$ 1,44 bilhão, anunciado pelo governo federal em julho. Na época, o governo divulgou que o MEC deveria bloquear justamente R$ 348,47 milhões (24,1% do total) de seu orçamento.

Os dados são do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira). Os números foram divulgados pelo G1 e pela ONG Contas Abertas que, desde o anúncio do novo contingenciamento, monitora o sistema para saber quais áreas serão afetadas. Após reunião com integrantes da União Nacional dos Estudantes (UNE), o secretário-executivo do MEC, Antonio Paulo Vogel, explicou o motivo do bloqueio:

—Esse contingenciamento a gente acredita que vai ser descontingenciado ali na frente, e esse montante não afeta em nada a distribuição do livro didático, e se a gente não fizesse aqui, iria ter que fazer em um outro local que teria um impacto maior —disse.

O secretário afirmou, também, que a pasta apenas segue o que é determinado pelo Ministério da Economia, responsável por definir os valores que devem ser bloqueados.

— Se eu não fizer o contingenciamento, sou punido por improbidade administrativa. Ninguém faz isso( contingenciar) porque quer ou porque gosta. Eu vou contingenciar o quê? Mais das universidades? Mais ainda nas bolsas da Capes? Onde enxergo que posso postergar um pouco mais, coloco ali naquela rubrica —defendeu.

MERCADO ‘DESORIENTADO’

O bloqueio pegou os envolvidos na produção de livros didáticos de surpresa. Entre eles há o consenso de que a decisão vai trazer problemas para toda a cadeia produtiva. Sobretudo para o mercado editorial, que há anos atravessa uma forte crise. As vendas para o governo representam uma parcela muito relevante do faturamento das editoras, sobretudo por causa do Programa Nacional do Livro Didático (PLND), que responde por quase a totalidade dos pedidos. Segundo a pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro, no ano passado, o governo foi responsável por comprar R$ 1,4 bilhão em livros.

João Scortecci, diretor setorial editorial da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf ), diz que o setor está “perplexo, desorientado e sem saber no que acreditar”.

— Essa medida vai gerar um efeito dominó. Além das editoras, o bloqueio vai prejudicar muito as gráficas, que são a última engrenagem do negócio do livro.

Scortecci afirma que a crise do mercado editorial já tinha gerado por volta de 20 mil demissões entre os gráficos. E estima que a produção de livro didáticos movimente cerca de R$ 120 milhões e represente aproximadamente 40% de todo o faturamento da área. Scortecci critica a falta de diálogo por parte do MEC. Ele diz também que os empresários do ramo estão abertos a conversar com representantes da pasta para chegar a uma solução para o impasse.

A reportagem perguntou ao MEC qual é a abrangência da medida, se deverá afetar estudantes que estão em aula ou se vai atingir as turmas do próximo ano, e também qual o cronograma para a produção de material didático. O ministério respondeu com uma nota, que não estipula prazo para o desbloqueio da verba:

“O Ministério da Educação informa que a produção, aquisição e distribuição de livros e materiais didáticos e pedagógicos para a educação básica estão garantidos para 2020. O Programa Nacional do Livro Didático possui um cronograma específico de pagamento que não será afetado. À medida de uma evolução positiva do cenário fiscal do país, observadas as diretrizes da gestão fiscal responsável e a eficiência do gasto público, esses valores podem ser objeto de descontingenciamento”.

Os recursos contingenciados deveriam ir para obras didáticas e literárias, de uso individual ou coletivo, acervos para bibliotecas, obras pedagógicas, softwares e jogos educacionais, materiais de reforço e correção de fluxo, materiais de formação e materiais destinados à gestão escolar, entre outros materiais de apoio à prática educativa, inclusive em formatos acessíveis. O objetivo é auxiliar o desenvolvimento da prática pedagógica e estimular a leitura e a escrita na educação básica.

A educação básica inclui os ensinos fundamental e médio e a educação de jovens e adultos. O contingenciamento no MEC para o mês de agosto, com dados até o dia 5, também inclui bloqueio de R$ 50 milhões para assessoramento e assistência técnica de organismos internacionais; R$ 35 milhões para a avaliação da educação básica; e R$ 9 milhões para bolsas e auxílios do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).