Correio braziliense, n. 20529, 07/08/2019. Mundo, p. 16

 

Toda a pressão sobre Maduro

Rodrigo Craveiro

07/08/2019

 

 

Venezuela » Eua avisam que usarão ferramentas disponíveis para acabar com regime socialista, depois de congelarem os ativos. Grupo de Lima reforça apoio a Juan Guaidó

A pressão para acelerar  o fim do regime do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, se intensificou nas últimas horas. Pouco depois de os Estados Unidos congelarem todos os ativos do governo da Venezuela no país e proibir transações com autoridades de Caracas, o Grupo de Lima sediou ontem a Conferência Internacional pela Democracia na Venezuela, uma reunião de chanceleres e representantes de quase 60 países — entre eles, Brasil, Estados Unidos, Canadá, Argentina, Uruguai, Chile, Colômbia, África do Sul, Austrália, Nova Zelândia, Japão, Coreia do Sul e nações da União Europeia. Em nome do bloco, o chanceler peruano, Nestor Popolizio, defendeu uma solução de caráter pacífico e eleitoral para a crise e anunciou que Brasília sediará nova reunião do Grupo de Lima, no próximo mês. “Os países presentes neste diálogo acordaram que a realização de eleições é o ponto inicial para a solução da crise”, comentou. O ministro reforçou o aval a Juan Guaidó, líder da oposição que se autodeclarou presidente da Venezuela. “Convido-os a renovar nosso total apoio ao presidente Juan Guaidó. Apoiamos todos os seus esforços com relação à recuperação da democracia no país”, acrescentou. Enquanto o regime  de Maduro qualifica as sanções de Washington de “terrorismo econômico”, o Brasil prepara medidas contra o Palácio de Miraflores.

Em nota oficial, a Casa Branca reiterou que “todas as opções estão sobre a mesa” para a abordagem da situação na Venezuela. “Os Estados Unidos usarão todas as ferramentas apropriadas para acabar com o controle de Maduro na Venezuela, apoiar o acesso do povo venezuelano à assistência humanitária e assegurar uma transição democrática na Venezuela”, diz a nota. “Os Estados Unidos têm tomado muito cuidado para salvaguardar o acesso do povo venezuelano aos bens humanitários e continuarão a trabalhar de perto, com seus parceiros, para salvaguardar a paz e a segurança no Hemisfério Ocidental.”

Presente na conferência em Lima, o conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, John Bolton, admitiu que, com a ordem executiva assinada pelo presidente Donald Trump na noite de segunda-feira, todos os indivíduos que continuarem a respaldar Maduro deverão fazer uma escolha: “Fiquem com uma ditadura que está naufragando ou se movam para o lado certo da história!”. Bolton disse que o governo do magnata republicano deseja uma transferência de poder pacífica na Venezuela, mas frisou que todas as opções estão sobre a mesa. Ele avisou que os EUA vão impor sanções contra qualquer pessoa que apoiar Maduro. “Uma forma de resumir isso é: ‘Quer fazer negócios na Venezuela, ou quer fazê-los com os Estados Unidos?’”, questionou.

Ex-prefeito de Caracas, hoje preso político foragido e exilado em Madri, Antonio Ledezma afirmou ao Correio que a postura de Washington, ao não excluir opções para enfrentar a crise venezuelana, é coerente com a proposta invocada desde dois anos atrás. “Recomendei a alternativa do conceito de responsabilidade de proteção e exortei a União Europeia a aplicar sanções personalizadas da catástrofe venezuelana. O novo diálogo é uma tábua de salvação para Maduro, uma manobra para ganhar tempo. Eu sigo sustentando que, na Venezuela, há um regime falido. Não existe um governo, mas uma narcotirania. Para vencê-la, deve-se considerar absolutamente todas as opções.”

Premissas

Para Ledezma, as novas medidas impostas pelo governo Trump seguem a ideia de facilitar uma autêntica saída pacífica de Maduro do poder, com duas premissas: o fim da usurpação e a realização de eleições realmente soberanas e autenticamente democratas e livres de restrições. “As sanções fazem parte de uma escalada que corresponde à intransigência do regime de Maduro de cumprir os compromissos abordados durante o diálogo. A Casa Branca demonstra que leva muito a sério a ameaça representada para a paz de nosso continente: a narcoditadura na Venezuela”, declarou.

O governo de Maduro se pronunciou oficialmente sobre as retaliações dos EUA. Em nota, informou que, “ante a arremetida imperialista (…), ratifica seu chamado à unidade de todos os venezuelanos e venezuelanas de bem, para enfrentar o terrorismo econômico e político nesta nova fase”. Ledezma assegura que “quem faz terrorismo econômico” é Maduro, “que converteu a Venezuela em base de operações do narcotráfico internacional”. “Tenho denunciado que membros do gabinete de Maduro estão comprovadamente relacionados ao narcotráfico. Além disso, Maduro mantém operações de terrorismo de ordem política, ao facilitar a documentação de ativistas de grupos ligados à milícia xiita libanesa Hezbollah. Ele também utiliza o ouro que explora ilegalmente no Amazonas ou na Guiana venezuelana para financiar seu enclave”, disse o ex-prefeito.

Presidente-editor do jornal El Nacional (de Caracas) e também exilado em Madri, Miguel Henrique Otero comentou à reportagem que o endurecimento de Washington é consequência do fracasso das negociações em Barbados e em Oslo. Segundo ele, o diálogo estava subordinado à imposição de mais sanções por parte dos EUA. “É provável que a União Europeia aplique sanções mais pesadas ao regime de Maduro, não à Venezuela. O regime terá muitos inconvenientes para financiar a quantidade de operações que deseja fazer para se manter no poder.”

Frase

"Decidi que é necessário bloquear as propriedades do governo da Venezuela devido à continuação da usurpação do poder pelo regime ilegítimo de Nicolás Maduro”

Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, em carta enviada à presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi

Eu acho...

“Qualquer decisão do Grupo de Lima deve  acompanhar as posições de EUA, Brasil, Colômbia e Argentina, nações muito cientes do desenlance que todos os venezuelanos esperam para essa narcoditadura. Maduro e seus asseclas creem que podem tirar sarro da comunidade internacional, da ONU, da OEA e do Parlamento Europeu. Pois bem, aqui eles têm uma resposta muito clara por parte do governo Trump.”

Antonio Ledezma, ex-prefeito de Caracas e preso político foragido e exilado em Madri

“A reunião de Lima teve uma conotação distinta ante a possibilidade de ruptura das negociações travadas em Barbados e na Noruega. Estamos entrando em uma nova fase, em que a força antagônica a Nicolás Maduro está se unificando em uma posição muito mais firme de confrontação. As medidas afetam aos venezuelanos, mas estão dirigidas a pôr fim ao regime e a encerrar essa situação tão terrível na Venezuela.”

Miguel Henrique Otero, presidente-editor do jornal El Nacional (de Caracas)