Correio braziliense, n. 20529, 07/08/2019. Cidades, p. 21

 

GDF muda cúpula da Polícia Militar

Isa Stacciarini

Ana Viriato

07/08/2019

 

 

Executivo » Resistência da comandante em estender o atendimento do hospital da PM para as demais forças é apontada como a gota d'água para a troca nos principais cargos da corporação. Próximo chefe da PM deve ter perfil mais alinhado com o secretário de Segurança

A exoneração da primeira comandante mulher da Polícia Militar e do chefe da Casa Militar gerou instabilidade na segurança pública do Distrito Federal. Entre as razões para demitir a coronel Sheyla Sampaio, o governador Ibaneis Rocha (MDB) citou a perda de autoridade dela e as dificuldades para comandar a tropa. Além disso, um dos principais motivos para a saída da oficial tem relação com o projeto de transformar o Centro Médico da PM em Hospital da Segurança Pública. Próximo da então número 1 da PM, o chefe da Casa Militar, tenente-coronel Marcus Paulo Koboldt, também perdeu o cargo.

À frente da PM, Sheyla se mostrou contrária à decisão de fazer da policlínica da corporação um hospital para atendimento médico de todas as forças de segurança do DF: militares, civis e bombeiros. Em junho, Ibaneis decidiu delegar à Secretaria de Segurança Pública as providências para a implementação da unidade de saúde, o que gerou questionamentos da coronel, que seguiu o que pensa a maioria dos integrantes da força.

Enquanto integrante do governo, a postura da coronel gerou insatisfação do secretário de Segurança Pública, Anderson Torres. “Houve uma questão de desalinho. Não acho a Sheyla má pessoa ou vejo faltas graves por parte dela. O governador entendeu que era hora de mudar e fez a mudança”, justificou o chefe da pasta.

Além de transformar a unidade de saúde da PM em um hospital que atenda a todas as forças de segurança, as principais propostas do governador para a área de segurança pública envolvem a ampliação da gestão compartilhada das escolas com a Polícia Militar, a reformulação do atendimento à população pelo 190 e a transferência do Centro de Operações da Polícia Militar do DF (Copom) para o Centro Integrado de Operações de Brasília (Ciob), como é feito em grandes operações e protestos.

Ao Correio, o governador detalhou que algumas atitudes da coronel afetaram a gestão de Anderson Torres. “Não tenho nenhum problema direto com ela, mas os coronéis estavam se rebelando, não respeitavam o secretário. Sempre disse que não queria uma rainha da Inglaterra na Secretaria de Segurança. O novo comando será escolhido pelo Anderson, sem a minha interferência, porque, da próxima vez, vou cobrá-lo diretamente”, explicou.

Ibaneis defendeu o secretário de Segurança Pública e destacou que ele tem “muita competência e precisa comandar”. Também explicou que, desde que assumiu o governo, tenta colocar em funcionamento o Hospital da Segurança Pública. “Mas tem resistência de alguns coronéis”, justificou.

Orgulho

A exoneração da comandante da Polícia Militar começou a repercutir pela manhã, quando Sheyla participou de uma solenidade no Colégio Tiradentes. Fontes da segurança pública notaram comportamento diferente da então responsável pela PM. Ela teria chegado atrasada e não manteve o comportamento adotado em eventos passados. Por causa disso, houve a desconfiança de que Sheyla previa a exoneração.

Logo após o encontro, o secretário de Segurança Pública a convocou, além do tenente-coronel Marcus Paulo Koboldt, para uma reunião e comunicou as exonerações de ambos, publicadas ontem em edição extra do Diário Oficial do DF. A saída de Koboldt teria sido motivada pela proximidade com a ex-comandante da corporação. Os dois compuseram a mesma turma de formação, e ele assumiu o lugar do coronel Júlio César de Oliveira, então chefe da Casa Militar, exonerado em abril. A indicação dele teria partido da própria comandante-geral à época, coronel Sheyla, pelo vínculo de amizade.

A intenção, agora, é de que a indicação do novo chefe da Casa Militar fique restrita a uma escolha do Palácio do Buriti, enquanto a indicação para o comando da PM tenha a participação da Secretaria de Segurança Pública. Os nomes serão definidos nos próximos dias, mas ontem o secretário de Segurança Pública esteve reunido com Ibaneis no Palácio do Buriti. “Fui consultá-lo e pedir permissão para começar a conversar com alguns cotados e saber se eles estão alinhados com a proposta do governo”, adiantou Anderson.

Em nota, a coronel Sheyla Sampaio informou que o comando exige “postura firme e inabalável” e destacou a “grandeza de um militar em manter-se fiel às leis e às suas obrigações”. Ela também enfatizou o orgulho de ter prezado pela defesa da corporação e de ter sido a primeira mulher à frente da instituição militar.

Para saber mais

Pioneira na PM

Antes de se tornar a primeira mulher a comandar a Polícia Militar do DF, a coronel Sheyla Sampaio chefiava o Policiamento Regional Sul II, responsável por Núcleo Bandeirante, Recanto das Emas e Riacho Fundo 1 e 2. Ela está na corporação há 27 anos, e, desde 1994, faz parte do grupo de oficiais. A coronel decidiu entrar para a PM aos 18 anos. Então matriculada no curso de educação física da Universidade de Brasília (UnB), iniciou os estudos para o concurso. Àquela época, a rotina incluía faculdade e aulas particulares que ministrava para alunos do ensino fundamental. Mesmo assim, foi aprovada em primeiro lugar nas três fases da prova. Passou a ser conhecida como Zero Um, apelido ainda hoje utilizado pelos colegas de turma e pela mãe, a aposentada Dalzira Soares de Souza, 74 anos. A PM foi o primeiro e único emprego da coronel Sheyla. Entre as operações que comandou estão as do carnaval de 2014, 2015 e 2016; a do Réveillon de 2013 para 2014; a Copa do Mundo de 2014; as Olimpíadas de 2016; e o primeiro turno das eleições deste ano.

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Cinco perguntas para...

 

 

 

 

 

Anderson Torres, secretário de Segurança Pública

07/08/2019

 

 

 

Quais serão os critérios para a escolha do próximo comandante-geral da PMDF?

O profissional precisa ser aliado às políticas do governo Ibaneis (Rocha), como as escolas de gestão compartilhada, o remodelamento do atendimento do 190, o pleno funcionamento do Centro Integrado de Operações de Brasília (Ciob), com a vinda das instituições para cá, e, principalmente, a integração das forças de segurança. O nosso mote principal é esse. Não há razões para não existir essa integração. Cada um tem a sua função. É preciso respeitar as funções do outro. Precisamos procurar diminuir as arestas das instituições.

Que nomes serão consultados para a escolha do comandante-geral da PM e do chefe da Casa Militar?

Será uma escolha muito alinhada com o governador Ibaneis. Não quero colocar alguém que destoe; por isso, vamos perguntar sobre todas essas questões que falei. É lógico que vamos ouvir as pessoas que estão no contexto político e têm algum vínculo com a Polícia Militar. Posso citar o distrital Hermeto, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Jorge Antonio de Oliveira Francisco. São pessoas que podem nos ajudar e dar dicas e a pensar em opções pela vivência na força.

E a partir da indicação, como funcionará o processo?

Quando tivermos dois ou três nomes, vamos levá-los ao governador.

Mas está entre a 2ª e a 3ª turmas da PM, certo? Por quê?

Porque pretendemos valorizar a questão da atividade. São os coronéis que estão aí hoje. Precisamos respeitar os princípios da instituição. Quebrar isso seria muito ruim.

Por que a coronel Sheyla Sampaio saiu?

Uma questão de desalinho. Não acho a Sheyla má pessoa ou vejo faltas graves por parte dela. O governador entendeu que era hora de mudar e fez a mudança.