Correio braziliense, n. 20530, 08/08/2019. Política, p. 4

 

STF mantém Lula preso em Curitiba

Renato Souza

08/08/2019

 

 

Legislativo » Por 10 votos contra um, ministros da Corte derrubam decisão de juíza da 12ª Vara Federal da capital paranaense de transferir o petista para o presídio de Tremembé, em São Paulo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai continuar preso na Superintendência da Polícia Federal de Curitiba pelo menos até que o processo dele seja analisado pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF). Por 10 votos a um, os ministros da Corte suspenderam uma decisão da juíza Carolina Lebbos, da 12ª Vara Federal de Curitiba, que determinava a transferência do petista para um presídio de São Paulo.

O habeas corpus de Lula foi analisado pelo STF poucas horas após ser apresentado. O presidente do tribunal, Dias Toffoli, encaixou o tema na votação que estava ocorrendo no plenário. Apenas o ministro Marco Aurélio Mello votou contra os pedidos dos advogados de Lula, por entender que havia “queima de etapas” no julgamento do recurso.

Na manhã de ontem, a juíza Carolina Lebbos atendeu a um pedido da Polícia Federal e autorizou a transferência de Lula para São Paulo. Atualmente, o petista está detido em uma sala de Estado-Maior, adaptada especialmente para ele na capital paranaense. Na decisão, a magistrada afirmou que a prisão em local especial é garantida apenas durante a fase processual, ou seja, enquanto durar o julgamento. “Reitere-se que a legislação nacional não contempla previsão garantidora de cumprimento de pena em sala de Estado-Maior. Referido regime diferenciado de encarceramento limita-se às prisões processuais”, diz.

A PF alegou questões de segurança, gasto público desnecessário e perturbação da ordem com a manutenção da prisão do ex-presidente na Superintendência da corporação em Curitiba. Após a decisão da magistrada do Paraná, o juiz Paulo Eduardo de Almeida Sorci, da Justiça estadual de São Paulo, definiu que Lula deveria ser alocado na Penitenciária 2 de Tremembé. No local, existem celas individuais, onde os detentos ficam isolados por 15 dias e tomam banho de Sol separado dos demais.

Fachin entendeu que Lula deve permanecer onde está até que o caso seja levado à Segunda Turma do STF. O entendimento dele foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Toffoli. Apenas Marco Aurélio Mello se manifestou pela rejeição dos pedidos. Na visão dele, o habeas corpus deveria ser analisado primeiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). “Não posso conceber que este tribunal endosse a queima de etapas, por pior que seja o objetivo. Nós aprendemos, desde sempre, que, no direito, o meio justifica o fim, não o fim justifica o meio”, argumentou.

Segurança

O professor João Paulo Martinelli, professor de direito da Escola Aberta do Brasil, afirmou que o ex-presidente não poderia ser levado para o presídio de Tremembé em razão das peculiaridades do cargo que exerceu. “A lei determina que a segurança dos ex-presidentes deve ser garantida pelo Estado. Se ele vai para um presídio comum, a chance de ocorrer algum problema é muito grande. O ex-presidente Lula sancionou leis penais, que desagradam a muitos dos infratores”, explicou.

O jurista criticou, no entanto, a celeridade que o processo teve no julgamento do habeas corpus no Supremo e no recurso apresentado anteriormente no TRF-4. “Esse tipo de celeridade não é comum. Tem muitos outros presos aguardando análise de habeas corpus, mas esse processo apresenta diferenças temporais desde o começo”, destacou. “O julgamento do recurso no TRF-4 foi em tempo recorde. José Dirceu (ex-ministro da Casa Civil), por exemplo, que foi condenado em primeira instância, teve seu recurso analisado no TRF-4 bem depois do de Lula.”

Para o advogado criminalista João Paulo Boaventura, sócio do escritório Boaventura Turbay Advogados, a decisão da juíza do Paraná ocorreu em desacordo com o que foi determinado pelo então juiz Sérgio Moro na hora da sentença em primeira instância. “A decisão dele destaca que o cumprimento antecipado da pena pelo ex-presidente deveria se dar em uma espécie de sala de Estado-Maior, separado dos demais detentos e sem qualquer risco para a sua integridade. Desde então, não houve alteração da situação fático-processual a justificar a revogação da anterior decisão”, ressaltou. “Acertada, portanto, a manifestação da Procuradoria-Geral da República e a decisão do Supremo Tribunal Federal, que suspendeu a transferência e determinou a manutenção do ex-presidente em sala de Estado-Maior.”

Nardoni e Richthofen

O presídio de Tremembé abriga presos de casos famosos, como Alexandre Nardoni, que matou a própria filha, Isabela Nardoni. Além dele, cumpre pena na unidade Mizael Bispo de Souza, assassino da advogada Mércia Nakashima. Na unidade também está preso Lindemberg Alves, condenado pela morte da jovem Eloá, e Cristian Cravinhos, que com o irmão, Daniel, mataram o casal Richthofen, a mando da filha deles, Suzane von Richthofen.

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"Corrida" de parlamentares

08/08/2019

 

 

 

 

Assim que ficou conhecida a decisão da juíza Carolina Lebbos de transferir o ex-presidente Lula de Curitiba para São Paulo, parlamentares iniciaram uma corrida ao Supremo Tribunal Federal. Deputados de PT, PSD, PSol, PP, Solidariedade, entre outros, pediram ao presidente da Corte, Dias Toffoli, que agisse no caso. A saída de dezenas de parlamentares chegou a paralisar, informalmente, o andamento da reforma da Previdência no plenário da Casa.

Senadores também foram ao Supremo e se reuniram com Toffoli, que encontrou todos os parlamentares no Salão Nobre do tribunal. Durante cerca de 30 minutos, ele recebeu as reclamações dos congressistas. Ouviu os discursos sem fazer comentários, e evitou, durante o diálogo, fazer movimentos com a cabeça que pudessem indicar sua opinião sobre o assunto. Ao fim do encontro, o ministro destacou que o caso seria analisado com a celeridade que exigia, e que a decisão seria tomada nas horas seguintes.

Entre os deputados que foram ao Supremo estava Marcelo Freixo (PSol-RJ), que condenou a decisão da juíza do Paraná. “É uma medida ilegal, arbitrária. Fragiliza o Poder Judiciário e, por isso, provocou essa reação forte”, disse.

Após a decisão do STF, o advogado Cristiano Zanin, que atua na defesa de Lula, enalteceu o tribunal por ter evitado “mais uma violência jurídica” contra o petista. “A decisão que o mandou para São Paulo deixou de observar todas as cautelas de sua defesa. Entre chegar um ofício de Curitiba e ter sido tomada uma decisão que havia transferido o ex-presidente Lula para São Paulo foram 41 minutos. Isso significa que havia claramente uma intenção de colocar o ex-presidente numa situação de vulnerabilidade jurídica e pessoal”, destacou.

Ao ser perguntado se enxergava na decisão da Justiça de Curitiba uma retaliação da Operação Lava-Jato, após as divulgações de supostos diálogos entre o então juiz Sérgio Moro e procuradores da força-tarefa, Zanin disse que “não poderia colocar dessa forma”. “Existem alguns fatos, que são: as revelações do The Intercept reforçam uma posição que sempre foi defendida pela defesa do ex-presidente Lula nos processos. Desde 2016, nós pedimos a soltura com base os fatos de que Moro não tinha a imparcialidade necessária para julgar o ex-presidente. Essas mensagens estão comprovando isso e mostrando que o ex-presidente não teve um julgamento imparcial”, afirmou. (RS e Thaís Moura, estagiária sob supervisão de Cida Barbosa)