Valor econômico, v.20, n.4758, 27/05/2019. Política, p. A10

 

Fim de penduricalhos empaca no STF

Luísa Martins 

Mariana Muniz

27/05/2019

 

 

Cinco ações que discutem a constitucionalidade de "penduricalhos" pagos à magistratura - e que garantiam a alguns juízes federais e estaduais um salário maior do que o teto constitucional - estão empacadas no Supremo Tribunal Federal (STF).

Na sessão administrativa em que a Corte decidiu incluir na proposta orçamentária de 2019 um reajuste de 16,38% nos vencimentos de seus ministros, gerando um efeito cascata em todo o funcionalismo público, costurou-se nos bastidores o compromisso de que esses bônus deveriam revistos. Passados nove meses da reunião, isso ainda não ocorreu.

Os benefícios referem-se ao pagamento de diversos auxílios, como custeios extras para despesas médicas e educacionais, gratificações por permanência na função e até mesmo bônus para a compra de livros e materiais de informática. Historicamente, como não são incluídos no cálculo do salário, esses complementos podem elevar a remuneração de juízes federais e estaduais para além do teto, hoje fixado em R$ 39,2 mil (subsídio de um ministro do Supremo).

A pendência mais antiga é uma ação que questiona verba paga a magistrados do Mato Grosso para custear despesas médico-hospitalares não cobertas pelos planos de saúde, de relatoria da ministra Rosa Weber. Apesar de estar pronto para ser julgado, o processo está parado há um ano e nove meses.

Duas ações semelhantes chegaram a entrar na pauta do plenário, conforme decisão do presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, mas foram retiradas logo em seguida. A primeira é relacionada à chamada "Lei dos Fatos Funcionais" para juízes do Rio de Janeiro, norma que prevê uma série de benefícios, incluindo gratificação por trabalhar "em comarca de difícil acesso".

A segunda, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2015, questiona o bônus de "aperfeiçoamento-profissional" e o auxílio-saúde pagos a juízes estaduais de Minas Gerais. Esses magistrados recebem, por ano, valor equivalente a metade de seus salários para comprar materiais jurídicos, digitais e de informática, além de um extra de 10% ao mês para gastos médicos.

Ambas seriam julgadas em 27 de março deste ano, mas, dois dias depois de agendar a data, Toffoli voltou atrás e retirou os casos da pauta do plenário. Questionado pelo Valor, o STF não explicou a razão do recuo.

Também aguarda desfecho uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada 12 anos atrás contra o "abono de permanência" (5% ao ano) a magistrados estaduais do Rio que já estejam exercendo o serviço há mais de três décadas. O processo passou por sete presidentes do Supremo - incluindo o próprio relator, ministro Gilmar Mendes - sem ser priorizado. A votação só foi começar no último dia 9, com voto de Gilmar pela ilegalidade do benefício. Mas ele foi o único a se manifestar: em seguida, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos, isto é, mais tempo para analisar o caso. Não há prazo para que ele devolva seu voto.

O auxílio destinado a juízes do Tribunal de Justiça do Rio para arcar com despesas educacionais de seus filhos é alvo de outra ação que tramita no Supremo. Os autos estão desde novembro com a PGR, que foi intimada a se manifestar sobre o caso, mas ainda não o fez.

Apesar da demora, a tendência que se observa no STF é de que os "penduricalhos" sejam derrubados. Em casos análogos já julgados pela Corte, prevaleceu entre os ministros o entendimento de que tais gratificações não têm natureza indenizatória e, portanto, não podem ser adicionadas à remuneração.

O Supremo suspendeu recentemente um adicional inusitado: no Acre, juízes e desembargadores tinham direito a um extra de 40% somente pelo fato de terem curso superior. Também foi anulado, por unanimidade, o pagamento de uma gratificação a desembargadores do Maranhão que, a depender do cargo que ocupavam (presidente, vice-presidente ou corregedor-geral), poderiam receber até 40% a mais por mês.

Foco de diversos protestos por parte da sociedade civil, o auxílio-moradia, que estava válido desde 2014, foi revogado em novembro pelo ministro Luiz Fux, que cassou as liminares que ele próprio havia concedido para liberar o pagamento.

Com o recuo, costurado com o então presidente Michel Temer em troca da sanção do reajuste, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recriou o benefício, impondo regras mais rígidas. Agora, os integrantes do Judiciário vão ter que atender a uma série de requisitos - por exemplo, não estar lotado em sua comarca original e não possuir casa própria - para ter direito ao bônus. O magistrado também terá que apresentar recibo do pagamento de aluguel e o ressarcimento será de, no máximo, R$ 4,3 mil.